quinta-feira, 6 de maio de 2010

Monografia: CONTRIBUIÇÕES DA SUPERVISÃO EDUCACIONAL AO PROCESSO DE FORTALECIMENTO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS PROPOSITIVAS NA AMBIÊNCIA EDUCATIVA Porto

1
FACULDADES INTEGRADAS PORTAL/ASSERS
ANDRÉIA CÁSSIA DA SILVA SKIERESZ
CONTRIBUIÇÕES DA SUPERVISÃO EDUCACIONAL AO PROCESSO DE
FORTALECIMENTO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS PROPOSITIVAS NA
AMBIÊNCIA EDUCATIVA
Porto Alegre
2009
2
ANDRÉIA CÁSSIA DA SILVA SKIERESZ
CONTRIBUIÇÕES DA SUPERVISÃO EDUCACIONAL AO PROCESSO DE
FORTALECIMENTO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS PROPOSITIVAS NA
AMBIÊNCIA EDUCATIVA
Monografia apresentada como requisito final
para obtenção de grau de Especialista, pelo curso
de Pós-Graduação Especialização Lato Sensu em
Supervisão Educacional pelas Faculdades Portal –
Porto Alegre.
Orientadora: MSc. Rosane Oliveira Duarte Zimmer
Porto Alegre
2009
3
FICHA CATALOGRÁFICA
Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária responsável: Denise Mari de Andrade Souza CRB 10/960
S628c Skieresz, Andréia Cássia da Silva
Contribuições da Supervisão Educacional ao processo de
fortalecimento das relações interpessoais propositivas na ambiência
educativa / Andréia Cássia da Silva Skieresz. -- Porto Alegre:
Faculdades Integradas Portal/ASSERS, 2009.
51 p.
Orientadora: Rosane Oliveira Duarte Zimmer
Monografia (Especialização) - Faculdades Portal/ASSERS,
Pós-Graduação: Supervisão Educacional
1. Supervisão Educacional. 2. Relações Interpessoais. 3. Pedagogia.
I. Zimmer, Rosane Oliveira Duarte. II. Faculdades Portal/ASSERS.
III. Título.
CDU:37.01
37.014.66
371.214
4
TERMO DE APROVAÇÃO
Na qualidade de Professora Msc ROSANE OLIVEIRA DUARTE ZIMMER
Orientadora da Monografia de Pós-graduação, da aluna Andréia Cássia da Silva
Skieresz tendo por considerar que foi desenvolvida nas Faculdades Integradas da
Rede de Ensino PORTAL, Pró–Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão,
no Curso: Pós-Graduação “Lato Sensu” Especialização Supervisão Educacional, em
Porto Alegre e reúne as condições necessárias para ser lograda a aprovação.
......................................................................................................................
MSc.ROSANE OLIVEIRA DUARTE ZIMMER
PROFª ORIENTADORA
5
DEDICATÓRIA
Dedico ao esforço atribuído para
a realização de mais uma
conquista pessoal.
6
AGRADECIMENTOS
A Deus que está sempre ao meu lado.
Ao meu amigo e companheiro João Batista Skieresz.
A uma pessoa que me fez acordar e a observar melhor as
pessoas, o professor João Batista Ramos.
E sem deixar de manifestar minha profunda admiração e
respeito a minha orientadora Rosane Zimmer, a qual
considero única e especial.
7
“Nada se colhe por acaso. Plante, mesmo na
época de colheita generosa”.
SIMÃO DE MIRANDA
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RESUMO
O presente trabalho invade o ser humano em sua totalidade, a fim de
conhecê-lo, desvendá-lo e por fim, respeitá-lo. Pressupõe, que para decifrar o outro
eu preciso primeiro me conhecer e, só assim perceber que as relações acontecem
num ato de dar e receber. Destaca o ambiente como fator preponderante no
comportamento das pessoas e, por conseqüência, este influencia nas relações
interpessoais e, supostamente nos resultados das aprendizagens em todos os
sentidos. E por fim, destaca a ação da Supervisão Educacional como determinante
na construção de vínculos nas ambiências escolares beneficiando sobremaneira o
equilíbrio desses relacionamentos.
Palavras-chave: Ser Humano. Relações Interpessoais. Supervisão Educacional.

INTRODUÇÃO
Vocação, opção ou destino são palavras que fazem parte da minha escolha
profissional. Desde menina manifesto o desejo em ser educadora, o que foi com o
tempo, aguçando-se cada vez mais.
A adolescência aflorou e os sentimentos acabaram misturando-se com a
“rebeldia” da idade e a vontade de exercer a profissão acabava se perdendo. Porém,
a escolha não era só minha e a decisão maior foi a dos meus pais.
Formação iniciada com o magistério, aos poucos meu destino estava sendo
traçado. Confesso que comecei a torcer por ele, apenas quando percebi que estava
trilhando os caminhos certos, pois aí se iniciava uma paixão pela educação.
Interessei-me tanto que durante o período do estágio, fui convidada a lecionar
na mesma instituição que me acolheu. Este foi o meu primeiro emprego em uma
instituição privada, como professora de educação infantil nível B.
Era muito querida por todos da escola e pelos responsáveis dos alunos.
Ouvia sempre dizer que estava no caminho certo, ou seja, estava no meu “sangue”,
essa realmente era a minha vocação. Recordo aqui, quando Rubem Alves (apud
BRANDÃO) assinalava que “educador, ao contrário, não é profissão; é vocação. E
toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança” (1982, p. 16).
Aos poucos, a cada ano, estava cada vez mais apaixonada pela minha
profissão. Procurei, então, prestar vestibular e dar início ao meu desejo de continuar
estudando e melhorar minha profissionalização, logo, formação.
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Minha opção na faculdade foi a Pedagogia com habilitação na educação
infantil, o que comecei a cursar na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul1, em Porto Alegre.
Neste mesmo ano, necessitei trocar de emprego, uma instituição tradicional e
reconhecida com excelência dentro desta cidade. Porém, foi através da mesma, que
o meu desejo e a minha vocação estavam se perdendo, pois para esta escola o que
realmente importava eram as quantidades de conteúdos que estavam sendo
ensinados para os educandos, ao contrário da filosofia que eu acreditava. Contudo,
precisava do emprego para continuar estudando, mesmo sem sentir o prazer inicial
ao exercer a profissão docente. Neste sentido Freire analisa esta questão, expondo
que pensar certo – e saber que ensinar não é transmitir conhecimento é
fundamentalmente pensar certo – e uma postura exigente, difícil, às vezes penosa,
que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos
fatos, ante nós mesmos. É difícil, não porque pensar certo seja forma própria de
pensar santos e de anjos e a que nós, arrogantemente aspirássemos. E difícil, entre
outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer sobre nós próprios
para evitar os simplismos, as facilidades, as incoerências grosseiras (2004, p.49).
Diante deste desafio bem como outros enfrentados no plano pessoal, decidi
parar de estudar, ao mesmo tempo parar de trabalhar. Entretanto, logo iniciei em
uma creche sendo recreacionista da educação infantil. Foi lá que meu desejo
começou a aparecer novamente. Passados alguns meses, estava administrando e
gerenciando a mesma.
Voltei a estudar e retomei os estudos na Universidade Luterana do Brasil2, no
mesmo curso Pedagogia e com a mesma habilitação Educação Infantil. Durante o
dia trabalhava na creche, porém, era professora e ao mesmo tempo uma das
proprietárias da mesma. A rotina era cansativa e como prestadora de serviços devia
estar sempre acompanhando e inovando a qualidade do meu estabelecimento.
Foi a partir deste momento, que resolvi mudar a habilitação do curso e optar
por supervisão educacional3. Fiz mais escolhas e comecei a fazer cursos que
trouxessem mais conhecimentos para esta decisão.
1 PUC/RS – Pontifícia Universidade Católica localizada na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
2 ULBRA/RS – Universidade Luterana do Brasil, localizada na cidade de Canoas, Rio Grande do Sul.
3 Supervisão Educacional- Curso oferecido pela Universidade Luterana do Brasil, ULBRA/RS.
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Anos mais tarde, vendi minha parte na creche e comecei a lecionar em uma
escola. Esta, também, uma instituição privada. Fui professora nas séries iniciais do
ensino fundamental 1ª e 4ª séries, e por estar muito envolvida com minha formação
acadêmica fui convidada a ser supervisora escolar das séries iniciais. Experiência
que trouxe grandes aprendizados e frustrações, pois para a instituição a supervisora
era uma fiscalizadora das ações dos professores. No início vesti a fantasia e a
máscara e tornei-me bruxa daquela história.
Comecei a perceber que estava fazendo tudo errado e as disciplinas
específicas da minha habilitação começaram a ter sentido para a minha prática.
Senti que ainda precisava de muito aprendizado e que aquela não era a hora certa
para estar exercendo a minha escolha, esse não era ainda o meu destino.
Mais uma vez arrisquei, deixei de lecionar e supervisionar nesta instituição e
procurei qualificar meus estudos na área da alfabetização. Novamente, me envolvi e
senti que estava voltando a percorrer os caminhos certos. A universidade e alguns
profissionais da mesma ajudaram-me a pensar e refletir sobre minhas ações práticas
e pedagógicas. Nesta época, estava trabalhando em uma escola luterana como
alfabetizadora. Fui convidada pela instituição para fazer meu estágio curricular, pois
a escola estava passando por mudanças e o grupo (funcionários, professores e
setor administrativo) estava desarticulado. Senti-me mais uma vez desafiada e
procurei um tema que trouxesse uma mudança significativa nas relações daquelas
pessoas. A vontade de fazer a diferença foi tanta que construí um projeto com o
qual ajudou a promover o processo educativo da escola. Porém tanto desempenho e
uma profunda entrega trouxeram frutos negativos. Isso se deu por que de um lado,
foi possível conquistar professores e funcionários, de outro recebi contestação por
parte da supervisora, que achava que todo aquele trabalho não estava ajudando
ninguém, mas a sustentação pedagógica do mesmo não deixava que ele fosse
terminado. Concluído o estágio e a graduação, comecei a perceber que minha atual
qualificação ainda incomodava muito essa profissional e aos poucos, fui observando
que aquele ambiente profissional não estava me trazendo nenhum aprendizado,
apenas um enorme grau de insatisfação. Logo, veio o meu desligamento e com ele
novos sofrimentos e mais aprendizagens. Sofrimento por achar que eu havia errado
e aprendizado a qual me fez ver que eu precisava de novos desafios. Foi neste
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momento que decidi buscar a minha formação e comecei a participar da ASSERS4.
Grande aprendizado e rumo ao caminho certo, pois foi nesta empresa que percebi
que eu poderia continuar sendo um diferencial e ainda, trabalhar na área que eu
sempre acreditei.
Ditado sábio “nada acontece por acaso”, foi assim que se deu a necessidade
da continuidade à formação permanente e a Pós-graduação em Supervisão
Educacional ajudou muito na busca incessante de mudanças.
Parece que tudo isso que aconteceu em minha busca profissional era algo
que o destino havia reservado para mim. Acreditava que educar ia além da
transmissão e reprodução de saberes, estava interligada com a troca de esses
saberes que professores e alunos estabelecem em um ambiente educativo.
Não foi só a minha concepção de educar que se transformou, pois hoje vejo a
supervisão associada com todos esses fatores, sendo um trabalho coletivo que
acontece horizontalmente, pois lida com pessoas dotadas de sentimentos, idéias e
concepções. Alarcão (apud RANGEL) destaca a supervisão pedagógica dirigi-se ao
ensino e à aprendizagem. O seu objeto é a qualidade do ensino, porém os critérios e
a apreciação da qualidade não são impostos de cima para baixo numa perspectiva
de receituário acriticamente aceito pelos professores, mas na interação entre o
supervisor e os professores (2001, p.12).
Em virtude de tudo isto, comecei a participar como supervisora na formação
continuada de professores envolvendo a temática das Relações Interpessoais a fim
de mostrar que para transformar precisamos acreditar na mudança. Hoje estou
realizando um grande desejo e tenho muito a aprender e dividir com os profissionais
envolvidos nesta nova perspectiva de educação.
4 ASSERS- Associação dos Supervisores de Educação do Estado do Rio Grande do Sul, instituição
com 36 anos de história na busca pela regulamentação da profissão e reconhecimento destes
profissionais.
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1 HISTÓRICO DA SUPERVISÃO EDUCACIONAL
Busco contextualizar o histórico a Supervisão Educacional até a atualidade,
percebendo que a função supervisora era a “ação de velar por alguma coisa ou
alguém, a fim de assegurar a regularidade de seu funcionamento ou de seu
comportamento difuso e diferenciado nas sociedades primitivas” (SAVIANI, 2000).
Com a evolução do homem e sua história, o pedagogo na Grécia Antiga era o
escravo que tomava a criança e a conduzia até o mestre do qual recebia a lição,
depois passou a ser o próprio educador. No período feudal, onde se predominava a
economia de subsistência no campo e na agricultura, a educação ocorria no âmbito
mais fechado, pois as comunidades se estabeleciam por laços de parentesco.
Na era moderna as relações mudam substancialmente, pois é um período de
grandes transformações com o aparecimento da indústria, do código escrito e da
imprensa. Essas modificações não acontecem somente no campo social, existe um
deslocamento do eixo do processo cultural do saber espontâneo para a viabilização
de um saber metódico, sistemático, científico que começa a se institucionalizar na
escola.
No Brasil, o Radio Studiorum adotado após a morte de Nóbrega, em 1570,
previa a figura do prefeito geral dos estudos como assistente do reitor para auxiliá-lo
na boa ordenação dos estudos, a quem todos os professores deveriam obedecer.
Segundo Saviani apud Ferreira, existiam outras atribuições para os mesmos:
[...] assistir pelo menos uma vez por mês as aulas, ler os
apontamentos dos alunos e ao observar ou ouvir de outrem alguma coisa
que mereça advertência, que uma vez averiguada, chame a atenção do
professor com delicadeza e afabilidade e, se for mister, levar ao
conhecimento do reitor (2000, p. 21 ).
Em, 1854, no Império é estabelecida a função do inspetor geral, que “deveria
supervisionar, seja pessoalmente, seja por seus delegados ou pelos membros do
Conselho Diretor, todas as escolas, colégios, casas de educação, estabelecimentos
de instrução primária e secundária, públicos e particulares”.
Então na República, nasce a idéia da formação de um Sistema Nacional de
Educação e é neste contexto que a supervisão vai ganhando contornos mais nítidos.
Segundo Lima:
17
[...] a idéia de supervisão surgiu com a industrialização, tendo em
vista a melhoria quantitativa e qualitativa da produção, antes de ser
assumida pelo sistema educacional, em busca de um melhor desempenho
da escola em sua tarefa educativa (2001, p. 69).
Formam-se os grupos escolares, com classes numerosas, com um corpo de
professores amplo, emergindo assim, a necessidade da coordenação destas
atividades, ou seja, um serviço de supervisão pedagógica no âmbito das unidades
escolares.
Na década de 30, com o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, divulgado
em 1932, já se previa a necessidade do desenvolvimento tecnológico do ensino, por
meios de especialistas em educação. Em 1931, com a criação da Faculdade de
Filosofia, Ciências e em seu interior o Curso de Pedagogia com a incumbência de
formar professores das disciplinas específicas do Curso Normal, bem como os
técnicos em educação, os pedagogos generalistas, permanecendo assim até os
anos 60.
Porém, no final da década de 60 é que se estabelecer o Parecer 252/69 que
cria o Técnico em Educação com funções definidas, por meio das habilitações de
administração, inspeção, supervisão, orientação, magistério das disciplinas
profissionalizantes dos Cursos de Magistério e a habilitação planejamento
educacional passou para os Cursos de Pós - Graduação (Mestrado).
Em 1970, com a Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de 1 e 2 Graus (Lei
5.692), a supervisão passa a agregar atividades de assistência técnico-pedagógica e
de inspeção administrativa, atuando em todo o sistema de ensino.
Na década de 80, a divisão de tarefas foi questionada e alguns Cursos de
Pedagogia passaram a formar professores para as séries iniciais e para a educação
infantil. Nos anos 90, sobre a Supervisão escolar, Alonso nos afirma que:
[...] a década de 90 assiste à redescoberta da supervisão,
apontada como instrumento necessário para a mudança nas escolas (...)
durante esses anos todos, procurou-se apresentar a supervisão sem o
cunho autoritário de que sempre se revestiu, acrescentando-lhe outras
dimensões que a tornariam mais consoante com o trabalho pedagógico
(2000, p. 168-169).
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A trajetória da supervisão educacional está vinculada à figura de quem
mantém o controle do sistema educativo (poder das relações). Uma distinção clara
entre os sujeitos pensantes e seus executores. Segundo Nérici é possível apontar as
fases históricas repassadas pela Supervisão Educacional:
[...] fase fiscalizadora, supervisão como sinônimo de inspeção,
segue padrões rígidos e inflexíveis, seu papel era fazer cumprir as leis de
ensino, cuidar da condição estrutural dos prédios, controlar a situação legal
dos professores, cumprir datas e prazos escolares, fase construtiva, a
supervisão vista como orientação, reconhece a necessidade de melhorar a
atuação do professor, favorece a promoção de cursos de aproveitamento e
atualização do professor, com os mesmos, são analisadas as falhas do
professor visando à remoção das mesmas e a fase criativa, supervisão
encarada sob o enfoque de aperfeiçoamento, trabalho criativo e
democrático (1986, p. 10 ).5
Acredito que estamos vivenciando esta terceira fase, a criativa, pois
percebemos o supervisor voltado para um melhor desenvolvimento do currículo da
escola, da pesquisa constante, promovedor da interdisciplinariedade e da
multidimensionalidade, preocupado com a formação de um professor reflexivo e
crítico e de uma escola multiculturalista, com a superação dos preconceitos étnicos,
culturais, sexuais criados pela nossa sociedade.
1.1 A Supervisão Escolar na Perspectiva de Construção de uma Educação
Reflexiva e Emancipatória através da mudança da qualidade das relações
interpessoais
Construir uma escola organizada, adequada e que venha ao encontro das
expectativas de todos os envolvidos neste processo, não é tarefa fácil, pois a
educação moderna está em plena transformação.
O papel das escolas vem passando por ressignificações, deixando de
transmitir apenas conhecimentos, formar sujeitos reprodutores e indivíduos sem
opiniões próprias. Com as mudanças ocorridas, a visão de educação passa a ter
outro significado, mudando a proposta pedagógica tradicional para emancipatória,
um processo que desafia o homem a construir uma outra sociedade.
5 Grifos do autor Nérici.
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Vive-se outros momentos, nossa sociedade está preocupada com o
desenvolvimento tecnológico ocorrido nas áreas de informática e comunicação
gerando dessa forma, a uma “nova sociedade do conhecimento” 6.
As constantes modificações trouxeram uma grande preocupação, se fez
necessário que os órgãos competentes e as instituições repensassem suas práticas,
vendo a necessidade de reformulações na educação.
Com a reformulação na L.D.B. E.N7, 9.394/96, as escolas modificaram suas
propostas pedagógicas, pois obtiveram liberdade e responsabilidade de organizar
suas ações. Conforme em seu artigo 12 aponta que, os estabelecimentos de ensino
possuem a incumbência de:
[...] I - elaborar e executar sua proposta pedagógica; II- administrar
seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros; III- assegurar o
cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas; IV -velar pelo
cumprimento do plano de trabalho de cada docente; V- prover meios para a
recuperação dos alunos de menor rendimento; VI- articular-se com as
famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade
com a escola; VII- informar aos pais e responsáveis sobre a freqüência e o
rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta
pedagógica (1996,s/n.).
É importante destacar que educar não é tarefa fácil neste mundo de intensas
mudanças. Tudo é novo e ao mesmo tempo velho, pois fatos e fenômenos mudam
de significados rapidamente, exigindo assim que nós educadores devemos estar
sempre comprometidos tecnicamente, politicamente e humanamente em nossas
práticas educativas.
Somos agentes na formação de cidadãos críticos e responsáveis e, em
função disto, devemos estar constantemente nos aprimorando na busca de novos
conhecimentos.
6 O termo sociedade do conhecimento é utilizado com freqüência em textos que se voltam para o
exame e análise das mudanças que têm se verificado no campo do trabalho, em particular aquele
ligado ao setor industrial, em função da adoção de novas tecnologias de base física e organizacional,
com especial atenção para as primeiras. É comum encontrá-lo também em textos oriundos da área
educacional, tendo em vista o argumento de que, sendo as sociedades atuais do conhecimento, cabe
à educação, de forma geral, e à escolar, de forma particular, atentar para essa característica,
adequando-se às demandas que, nesse sentido, lhe são feitas. Nem sempre, todavia, a expressão
sociedade do conhecimento é interpretada da mesma forma. Na verdade, dado seu caráter vago e
polissêmico, assume vários significados, conforme a conveniência dos que a utilizam (FERRETTI,
2008, p. 113).
7 L.D.B. – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
20
Participando de tantas modificações no âmbito escolar notou-se uma
preocupação maior dos educadores em relação as suas identidades profissionais.
Percebe-se um número maior de profissionais da educação buscando
aperfeiçoamento e qualificação em suas atividades, para que haja conscientização
da necessidade de novas atitudes e possibilidade de transformação de uma
realidade social e cultural.
De acordo com os fundamentos do pedagogia tradicional, professores e
supervisores eram vistos como detentores de saberes e atitudes o que os
impulsionavam a uma prática autoritária e vertical.
Com o passar do tempo e o avanço industrial, a Supervisão tomou outro
rumo, deixando de fiscalizar e controlar os indivíduos envolvidos neste processo.
Foi a partir dos anos 90, que o supervisor começou a ser redescoberto e
apontado como um profissional necessário para que haja mudanças nas escolas.
No atual contexto, supervisores e educadores exercem suas práticas
educativas interligadas, pois se preocupam com uma educação de qualidade, onde
se desenvolvam as capacidades e competências dos educandos, para que estes se
assumam como seres sociais e históricos, pensantes, críticos, criadores e por fim,
agentes de transformação de uma nova sociedade. Segundo Alarcão a supervisão
escolar deve:
[...] ser uma concepção pedagógica concebida como uma
construção, com os professores, do trabalho diário de todos na escola. O
supervisor para assim, ser a parte integrante do coletivo dos professores, e
a supervisão realiza-se em trabalho de grupo (2001, p.12).
O supervisor educacional é capaz de sonhar com nitidez a escola como ela
deve ser e compartilha com todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem
esta visão. Através de uma escuta e de um olhar diferenciado proporciona um
ambiente adequado à ação em parceria, promovendo a formação continuada,
acompanhamento sistemático e utilizando meios para as soluções das necessidades
e dificuldades apresentadas pelos educadores. Do ponto de vista de Rangel:
21
[...] confirmam-se, então, a idéia e o princípio de que o supervisor
não é um “técnico” encarregado da eficiência do trabalho e, muito menos,
um “controlador” de “produção”, sua função e seu papel assumem uma
posição social e politicamente maior, de líder, de coordenador, que estimula
o grupo à compreensão-contextualizada e crítica - de suas ações e, também
de seus direitos (1997, p. 150- 151).
A supervisão pedagógica prima à qualidade do ensino, porém os
coordenadores não devem impor verticalmente suas opiniões, mas sim desenvolver
com a equipe de professores, alternativas que possibilitem o processo ensinoaprendizagem.
Pensar em mudanças é refletir sobre as práticas pedagógicas que
acontecem no cotidiano educativo. Sendo um agente de transformação, cabe aos
supervisores provocarem esse processo. Segundo Day em comunhão com as idéias
dos autores Mac Cornick & James:
(...) a mudança eficaz depende do empenhamento genuíno dos
que a devem implementar e esse empenho só poderá ser conseguido se as
pessoas sentirem que controlam o processo. Os professores procurarão
melhorar a sua prática, se a considerarem como parte integrante da sua
responsabilidade profissional, ao mesmo tempo em que poderá resistir a
uma mudança que lhes seja imposta. (2003, p. 55).
É hora de desacomodar, pensar em reformulações pedagógicas e as
instituições necessitam estar informadas dos mecanismos que possam vir a
aparecer, pois estes facilitam a construção de um processo ensino-aprendizagem
mais adequado às necessidades dos envolvidos. Portanto, o supervisor educacional
deve estar sempre buscando com o seu grupo, momentos de discussões, dúvidas,
reflexões e promovendo estudos para que as mudanças se tornem possíveis e que
exista a qualidade no ensino.
Segundo Rangel “o supervisor, o que procura a “visão sobre”, no interesse da
função coordenadora e articuladora de ações é também quem estimula
oportunidades de discussão coletiva, crítica e contextualizada do trabalho” (1997,
p.147). Como supervisores, somos agentes e estaremos promovendo espaço de
transformações da sociedade, pois nada se realiza sozinho no processo da
educação e sim, em parceria coletiva.
Percebe-se assim, a necessidade de novas práticas pedagógicas que
proporcionem aos envolvidos melhorais em suas formações pessoais e
profissionais.
22
Com a globalização e a competitividade no mercado de trabalho temos como
supervisores a responsabilidade na formação de cidadãos críticos, conscientes,
preparados para exercerem autonomia e habilidades necessárias para se inserirem
no mercado de trabalho.
É importante lembrar que as mudanças não podem ocorrer apenas no âmbito
pedagógico, pois os personagens envolvidos neste processo são indivíduos que
possuem diferentes habilidades emocionais, sociais e cognitivas.
Historicamente percebo uma sociedade mais complexa, com pessoas se
modificando através das relações sociais e culturais. Percebe-se uma mudança de
valores nos diferentes grupos estabelecidos e uma dificuldade no relacionamento
entre as pessoas. Em função disto, se faz necessário que as instituições de ensino
repensem suas práticas pedagógicas, a fim de garantir aos educandos uma melhoria
na qualidade de suas relações. E a mudança deve iniciar-se com o Supervisor
Educacional, a fim de provocar nos seus educadores a necessidade das
transformações sociais.
Nesta nova perspectiva, não podemos deixar de citar as relações
interpessoais como uma linha de ação que visa às bases emocionais e
psicopedagógicas dos seres humanos. Segundo Celso Antunes:
[...] cada pessoa é, e sempre será, um verdadeiro universo de
individualidade; suas ações, seus motivos, seus sentimentos constituem
paradigma único. (...) esta originalidade de cada um dificulta a comunicação
interpessoal e com ela todo esquema de relações humanas que envolve o
segredo do conviver (2004, p.09-10).
O objetivo que o supervisor deve ter é mostrar aos profissionais da educação
de que as mudanças são necessárias e possíveis, se nos engajarmos nesta
proposta com coração e mentes abertas, a fim de proporcionar as salas de aulas um
espaço de crescimento integral. Freire exemplifica bem esta frase com a seguinte
citação:
[...] mudar é difícil, mas é possível, - que me empurra esperançoso
à ação, não é suficiente para a eficácia necessária a que me referi.
Movendo-me enquanto nele fundado, preciso ter e renovar saberes
específicos em cujo campo minha curiosidade se inquieta e minha prática
se embaseia (2004, p.80).
23
Todas as propostas que forem apresentadas ao educador a fim de que ele
pense, reflita e sugira possíveis mudanças em suas práticas pessoais e pedagógicas
para garantir com seus colegas e educandos laços sólidos em suas relações
humanas.
A globalização trouxe grande preocupação, pois nossos interesses estavam
relacionados com a qualificação profissional e com o mercado de trabalho. Diante de
tudo isso, começamos a deixar de lado as relações humanas e nos preocuparmos
somente com a profissionalização. Segundo o sociólogo Torres “hoje é preciso
disputar a atenção dos estudantes com a mídia, que muitas vezes veicula
informações que se chocam com o que diz a escola” (2008, p. 20). Ainda enfatiza
que “agora a escola tem de ser lugar de produção de conhecimento” (2008, p. 22).
Foi se percebendo, nas instituições, uma crise nas relações, pois os
educadores acabavam assumindo um compromisso com sua profissionalização,
envolvendo-se somente no domínio de teorias pedagógicas, acumulando saberes,
competências e habilidades para ministrar uma excelente aula.
E por fim, os educandos acabavam sofrendo tais conseqüências, pois,
recebiam de seus mestres acúmulos de saberes que os ajudariam somente na sua
vida estudantil. Foi através destes fatores, que a educação começou a perder seu
propósito.
Esta proposta busca proporcionar com os professores um resgate no ato de
educar, interligando as relações interpessoais na busca de um ambiente propício
para a qualidade educacional. Gadotti propõe que:
[...] a qualidade do relacionamento como facilitador da
aprendizagem é embasada na confiança dada, pela abertura na
comunicação, podendo a mesma trilhar dois caminhos: a do
desenvolvimento de valores e de percepções entre alunos e alunos. Uma
comunicação nesta direção tende a se desenvolver numa sala de aula
aberta, com um diálogo colaborativo, verbalizado ou não, entre os
participantes, sob a forma de idéias, entendimentos e conceitos (1994,
p.58).
É importante salientar que se o supervisor se engajar nesta proposta das
relações interpessoais terá como propósito a conscientização de que existem
diferentes estratégias pedagógicas que despertem a construção de valores e que a
integração entre professores e alunos se torna um recurso indispensável para se
atingir um elo de respeito, carinho e fraternidade.
24
2 AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS PERPASSANDO PELA HISTÓRIA DA
HUMANIDADE
Para mapear como as relações interpessoais se estabeleceram ao longo dos
tempos foi importante um resgate na história da humanidade, através das pesquisas
realizadas por historiadores (MORAES, 1998), a fim de compreender melhor como
as transformações ocorreram entre homem e sociedade.
Para Moraes (1998), o período da Pré-história está situado entre o surgimento
dos primeiros hominídeos, entre 3 milhões e 2,5 milhões de anos atrás. Conforme os
estudos realizados neste período, as transformações ocorreram lentamente. As
mudanças maiores são de ordem física e biológica do homem (dos primeiros
hominídeos ao homo sapiens-sapiens) e, também, das grandes conquistas culturais
e sociais desde o surgimento do fogo, da metalurgia, da cerâmica e da agricultura.
Percebe-se nos registros da história, que o homem tornou-se capaz de
entender e ter controle sobre a natureza e, por meio de seu trabalho, soube resgatar
da mesma, os subsídios para a sua sobrevivência.
Nesta época o homem caçava e pescava animais, coletava frutas, vegetais e
raízes, o que o caracterizava como nômade, uma vez que, precisava percorrer
longas distâncias em busca de sua alimentação.
O surgimento de algumas ferramentas se deu em função da sua necessidade,
mas eram extremamente rudimentares, pois eram utilizadas lascas de pedras e
pedaços de madeiras pontiagudas para a construção das mesmas.
Pode-se ainda, observar uma divisão no trabalho entre homens e mulheres,
pois os homens caçavam e as mulheres faziam a coleta de alimentos e cuidavam do
bando, segundo o Período Paleolítico, assim, denominado pela divisão da Préhistória.
Já, no Período Paleolítico Médio, que teve seu início, há aproximadamente
100 mil anos, os homens viviam em cavernas e continuavam a garantir sua
sobrevivência através da caça e da pesca. Devido à evolução cronológica, seus
instrumentos (ferramentas) eram construídos com mais superioridade, ou seja,
surgiam o arco, a flecha, os anzóis e as pontas de lanças com mais requintes e, foi
neste período que passou a ter domínio do fogo.
25
Mais mudanças acabavam surgindo e um progresso cultural mostrava-se se
aprimorando, o que caracterizou o Período Paleolítico Superior, entre 40 mil e 18 mil
anos atrás.
Nesta época, começam a surgir as primeiras construções de suas moradias, a
substituição do arco e da flecha por arpões e lâminas de sílex (pedra mais dura),
agulhas de ossos e outros objetos. Fala-se que neste momento histórico, ocorreram
manifestações da religiosidade e, também, a arte rupestre (as pinturas realizadas
nas pedras) e por fim, algumas alterações climáticas com a fauna e a flora terrestre.
A nomenclatura utilizada para definir a Pré-história foi o Período Neolítico, que
se situava há mais ou menos, 12 mil anos, após o fim da era glacial. Nesse período,
a Terra começa a sofrer alterações e assumir características que são atuais, como o
surgimento de rios, desertos, as florestas e o desaparecimento dos animais de
grande porte, como os mamutes e outros grandes felinos.
Supõe-se que houve um controle gradativo da natureza, começando a se
libertar da caça e da pesca. Aprende a produzir sua alimentação extraindo dos
animais a carne, o leite, o couro e outros, começam a produzir e reproduzir plantas e
a sentir necessidade de pastagens para a sua produção.
Nesta releitura histórica, as transformações das relações humanas começam
a aparecer com mais clareza, pois a agricultura e a domesticação de animais
permitiram ao homem à sedentarização e um aumento na população. Começam a
viver em comunidades cooperativas, baseada na coletividade dos meios de
produção. As atividades produtivas baseavam-se na divisão do trabalho sexual, ou
seja, as mulheres se ocupavam de atividades domésticas, teciam e cuidavam da
agricultura. Enquanto, os homens dedicavam-se à caça, a construção de casas e ao
pastoreio.
À época do rebanho, sucede ao regime dos clãs. Fala-se em um regime
matriarcado, pela existência da igualdade entre homens e mulheres.
No final deste período, o homem começa a desenvolver a metalurgia (Idade
dos Metais) e a produção da cerâmica, marcada pela confecção de panelas, potes e
moradias feitos de barros. A escrita, a roda e o calendário, também, são
provenientes do Período Neolítico. Segundo Morgan:
26
[...] existe duas épocas da história primitiva: a selvajaria e a
barbárie. A primeira termina com a invenção do arco e da flecha; a segunda
começa com a invenção da cerâmica e compreende o nascimento e o
desenvolvimento da agricultura e da pastorícia (1880, p. 25).
A comunicação maior entre estes povos dá-se através das pinturas rupestres,
realizadas nas pedras, com sinais que representassem o que queriam dizer ao outro
e a fim de ajudá-los entre si nas caçadas. Nesta fase percebe-se uma preocupação
com o outro e com as relações de grupo, devido a existência de alguns povos
primitivos.
Segundo Moraes (1998), o que se costuma denominar a Idade Antiga
abrange um longo processo de formação, no Ocidente, de sociedades mais
complexas do que aqueles que existiram na Pré-história. Foi constatado que
populações de algumas regiões já se encontravam organizadas em centros urbanos
e houve uma ampliação das relações sociais, saindo do tribalismo e do parentesco.
Neste período o poder do Estado estabeleceu-se como um dos
organizadores das sociedades, criando-se os exércitos, as leis e as normas;
começou a existir uma desigualdade na divisão do trabalho e da sociedade e o
avanço técnico foi extraordinário com a invenção da escrita.
Na Mesopotâmia surgiram alguns povos. A organização destas sociedades
dava-se a partir de uma divisão básica entre os chefes religiosos e sacerdotes no
comando, os ricos comerciantes e proprietários, os homens livres sem posses e os
escravos.
As atividades administrativas das cidades como a arrecadação de impostos
e obras públicas, o trabalho coletivo (organizado e unificado) e o comércio foram
importantes para o gradativo desenvolvimento da escrita, da matemática, do
calendário, das leis, dos padrões monetários, de peso e de medidas. Essas normas
eram registradas por meio da escrita cuneiforme, ou seja, os símbolos eram
gravados em pedaços de barros úmidos e mole, que depois secavam e endureciam
ao sol.
No Egito, as populações que deram origem instalaram-se mais ou menos em
10000 a.C. Esta civilização nasceu às margens do rio Nilo, que atravessava boa
parte da África, de sul a norte. Devido à abundância de água e com suas cheias, as
terras às suas margens eram férteis e boas para as atividades agrícolas. A principal
atividade econômica era a agricultura. As terras eram divididas e doadas pelo Faraó
27
aos templos, sacerdotes, escribas e chefes militares, formando uma pequena elite
proprietária. O Estado egípcio controlava o comércio, recolhia impostos e taxas,
organizava as obras públicas e o trabalho coletivo.
Os camponeses trabalhavam com o plantio e também eram obrigados a
prestar serviços nas obras públicas (canais, templos, pirâmides e outros) a fim de
pagarem seus impostos. Os escravos também, trabalhavam nas obras públicas e
existiam duas formas de escravidão: por conquistas, ou seja, os povos derrotados
na guerra e, por dívidas àqueles que não tinham condições de pagar seus impostos
e compromissos.
A sociedade construída pelo povo hebreu não foi tão grandiosa quanto a dos
egípcios e mesopotâmicos e ergueu-se num momento posterior. Teve grandes
influências e uma evolução política, onde se vigoravam cidades independentes e
autônomas.
Ainda segundo o autor, é preciso ressaltar que tal processo, denominado
genericamente civilizatório, não segue uma linearidade rigorosa e modelar, isto é,
não ocorreu ao mesmo tempo e da mesma maneira nos três continentes: na Europa,
a instituição das sociedades mais complexas aconteceu em um momento anterior,
em relação à América, e posterior, em relação ao Ocidente. Essa situação histórica
não se concretizou por todo o continente europeu, esteve restrita às duas
penínsulas, a Grécia e a Roma. O modo de vida do restante da Europa permaneceu
próximo ao período Neolítico.
O sistema escravista se desenvolveu, amadureceu e entrou em crise nas
duas regiões. As contribuições influenciaram muito o homem ocidental em sua forma
de pensar o conhecimento, nas instituições políticas, nas leis e nas normas civis que
organizam essas sociedades.
A sociedade medieval situa-se entre os séculos V e XV. Esse período
histórico teria sido então um “intervalo” no qual os homens viveram submersos na
ruína, na decadência e ignorância, ou seja, na “Idade das Trevas”. Foi uma época de
ignorância supersticiosa e letargia geral, animada por instantes de violência e
crueldades bárbaras. A Igreja Católica exerceu um papel preponderante nas
sociedades.
Segundo os estudos realizados neste período histórico percebe-se que as
relações interpessoais sofreram alterações, pois não havia mais uma preocupação
com a coletividade. Com o surgimento da escrita e o aparecimento de sociedades
28
maiores se deu a necessidade da criação das leis para reger as relações entre as
pessoas. A divisão das classes sociais nas diversas regiões com a predominância
de um “líder” (reis, faraós, nobres, juízes e religiosos,...) retrata uma relação de
poder entre os povos. Percebe-se assim, a desvalorização da atividade de grupo, da
igualdade entre homens e mulheres e certo desequilíbrio no relacionamento entre as
pessoas.
Por fim, a Idade Moderna se compreende no longo período de transição em
direção ao capitalismo. Segundo, algumas correntes historiográficas existem uma
dificuldade de delimitação cronológica deste período, pois uma divergência de
interpretação quanto à origem e evolução do sistema capitalista. Contudo, o período
histórico que vai do século XV ao XVIII é, genericamente percebido com um "período
de transição".
Sua compreensão para o termo Idade Moderna corresponde a uma evolução
do modo de produção feudal para o modo de produção capitalista. O comércio
ganha força através do aumento populacional, do crescimento das cidades e o
desenvolvimento das manufaturas. Todo este avanço provoca também, o
surgimento de guerras, fomes e pestes.
O Capitalismo foi o sistema econômico, político e social que predominou
durante todo o período da Idade Moderna, substituindo o predomínio do uso da terra
para o comércio. O surgimento da pólvora, da imprensa e a multiplicação dos livros
aconteceram neste período. Surge à burguesia, uma nova classe social, formada
pelos banqueiros, artesãos, camponeses e mercadores. O dinheiro adquiriu valor.
O capitalismo foi subdividido em fases: pré-capitalismo (relações de
produção ainda não eram totalmente assalariadas), capitalismo comercial (existência
da relação de trabalho e produção assalariada), capitalismo industrial (o capital
passa a dominar o processo de distribuição e consumo de mercadorias), capitalismo
financeiro (surgimento dos bancos e da concentração financeira) e por último, a
globalização (integração econômica, social, cultural e política).
A globalização concentra-se na fase atual da nossa sociedade, atual século
XXI. Com toda esta evolução social começa a surgir um enfraquecimento das
relações interpessoais. À medida que o mundo foi se alargando, com as Grandes
Navegações, a distância física entre as pessoas de uma mesma comunidade
começa a existir. As formas de comunicação começaram a mudar, surgindo o
29
aparecimento das tecnologias de comunicação, desde o telégrafo, telefone e por fim,
a internet.
Todo este retrocesso à história da humanidade marca um momento de
repensarmos as relações interpessoais, pois vivenciamos um momento de
decadência social, onde prevalecem às relações de poder e uma forte tendência do
isolamento entre as pessoas. Ao mesmo tempo, que as inovações facilitam a vida do
homem, as mesmas vêm prejudicando as pessoas que não sabem usufruir destas
tecnologias. Por este motivo, se faz necessário conscientizar as pessoas sobre as
questões de valores referentes à amizade, respeito, amor, igualdade, a fim de não
assistirmos a um fim trágico das relações através do individualismo e da violência.
2.1 Relacionar-se: Aprendizado diário para a continuidade da existência da
espécie humana
Quem somos, onde estamos, de onde viemos, para onde vamos? Perguntas
como estas, que fazem parte do nosso cotidiano, ajudam a situarmo-nos enquanto
sujeitos humanos. Segundo Rousseau apud Morin “conhecer o humano não é
separá-lo do Universo, mas situá-lo nele” (2000, p. 37).
Estudos inerentes ao desenvolvimento da espécie humana nos revelam que
somos seres complexos, totalmente biológicos e ao mesmo tempo culturais. O que
acaba nos diferindo de outros seres vivos, pois evoluímos através de um cérebro
que nos faz pensar, falar, comer, andar e logo existir. Cérebro este que apenas nos
oferece os meios, porém nossas ações estão interligadas ao movimento cultural que
estamos vivenciando neste complexo mundo.
Somos seres culturais porque obedecemos a regras, valores, símbolos e, ao
mesmo tempo, precisamos de outras espécies para garantir a nossa sobrevivência.
Sobrevivência esta que está interligada com uma diversidade de culturas, originando
assim, uma sociedade multirracial. É nesta complexidade que nos tornamos
diferentes uns dos outros, seres únicos, rodeados de individualidades e
particularidades.
Como viver, conviver e sobreviver diante de tanta complexidade?
Aprendizagem diária, única e que se renova a cada vez que nos relacionamos com
as pessoas. Pessoas desconhecidas, munidas de ideais, sonhos, vontades e
desejos que muitas vezes são impossíveis de serem imaginados. Pessoas
30
agregadas a diferentes valores, crenças, opiniões, que se escondem através de
máscaras diferentes para cada ato, ação ou emoção. Segundo Mosquera e Stobäus:
[...] nos acostumamos a viver com máscaras que colocamos em
nós mesmos e nas outras pessoas. Pois, desejamos ou não, cada um de
nós coloca uma máscara para se desempenhar na vida social. Às vezes
esta mácara é tão imponente que passamos a senti-la tão grudada à nossa
pele que parece que temos outra pele (2001, p. 97).
Mas, como viver, mas como se socializar, mas como aprender? Respostas
difíceis de serem dadas, mas que ao mesmo tempo são desvendadas a cada dia, a
cada novo relacionamento e a cada momento.
Procurar compreender o outro é na verdade respeitá-lo dentro de uma
perspectiva mais humanista, valorizando o ser humano como um todo, dotado de
sentimentos e ações, buscando em suas relações a integração para que se
proporcionem aos envolvidos momentos de colaboração, de confiança e melhorias
nas relações entre as pessoas.
Busco mais conhecimento para este assunto quando retrato os autores Grün
e Robben (2007) que através de acompanhamentos, observações e estudos que
realizaram com sacerdotes, pessoas pertencentes à determinada ordem na casa de
recolhimento e ainda, hóspedes isolados na abadia de Múnsterschwarzsach, na
Alemanha mostraram que o mundo atual sofre de uma falta total de limite e de
medida, o que se revela não apenas na vida pessoal, mas também cada vez mais
no contexto profissional, no contexto das relações. Segundo os autores, sem a
capacidade de delimitar o próprio espaço, se torna difícil que o ser humano percebase
enquanto pessoa e nem se desenvolva nesse sentido.
Capra no livro Ponto de Mutação (2001) descreve três personagens o político,
poeta e outro que busca o caminho de transformação no isolamento, o perdão pelos
seus resultados e suas criações. Os personagens se vêem em um dilema, cada qual
preso em seu mundo, procurando nele o sucesso sua direção, tal qual uma solitária
ilha. Ao se prenderem ao seu mundo próximo e com limites claros e estruturados,
dentro das muralhas do conhecido, eles tendem a aplicar de certa maneira o cinismo
que apregoam como básico: a convivência com pessoas menos inteligentes ou que
podem ser conduzidas, seja na política, na ciência ou na vida, como turistas sem
conhecimento ao encontrarem o novo.
31
A necessidade de satisfazer nossos desejos está sob influência das
constantes modificações que acontecem em uma época de crescente aceleração e
exigência de desenvolvimento, aspectos estes que às vezes dão mais significados a
nossa vida. A procura incessante pela felicidade ou por aquilo que julgamos
felicidade (bens materiais, poder, status co) demonstra que a era em que vivemos
sofre de uma total falta de medida e de limite que se revela na nossa vida pessoal,
mas cada vez mais no contexto profissional e social.
Internalizando todo o conhecimento adquirido nos estudos realizados por
estes autores posso defender que nós seres humanos precisamos conhecer o outro
e respeitar os limites do mesmo e não se esquecer de estabelecer os nossos
próprios limites, garantindo uma relação equilibrada independente do contexto
familiar, particular e ou profissional.
O cotidiano social e do trabalho nos revela cada vez mais personalidades
diferenciadas e com necessidades diferentes que precisam conviver para assim
garantirem a continuidade da nossa espécie humana. Em nossas relações
interpessoais observamos que muitas vezes sentimos o quanto é difícil delimitar
nosso espaço de modo adequado, sem nos tornarmos pessoas rudes ou frias com
as outras pessoas.
Volto a salientar que as boas relações acontecem quando respeitamos o
outro e temos clareza dos limites que nos fazem nos movimentar e que nos movem
em relação ao outro.
Estabelecer limites não significa tornar-se insensível em relação ao sofrimento
do mundo. Significa determinar o que eu quero e o que eu posso, a fim de se manter
uma relação saudável com as outras pessoas.
Para finalizar precisamos das relações interpessoais como um suporte
saudável para a busca da harmonia e do equilíbrio, pois só assim, se dará a
continuidade da nossa espécie humana.
32
3 PESQUISA DE CAMPO E ANÁLISE TEXTUAL DISCURSIVA: INSTRUMENTOS
UTILIZADOS PARA A COLETA DE DADOS
Percebendo a necessidade do reconhecimento das ações da supervisão
educacional que potencializam as relações interpessoais, sob a perspectiva
propositiva no ambiente educativo, se fez procedente, a escolha do método estudo
de caso, a fim de averiguar se o trabalho realizado por estes profissionais tem
proporcionado aos professores uma convivência mais harmoniosa, de respeito
mútuo, com qualidade nas relações e na formação de um grupo. Segundo Gil:
[...] esse método é indicado para estudos em que se trabalha com
um caso específico que se considera típico ou ideal para explicar uma certa
situação, permite tratar um problema com maior profundidade e possibilita
maior integração de dados, é útil em fase inicial de investigação, buscando
ampliar o conhecimento a respeito de um certo tema. O estudo de caso se
fundamenta na idéia de que a análise de uma unidade de determinado
universo possibilita a compreensão da generalidade do mesmo ou, pelo
menos, o estabelecimento de bases para uma investigação posterior, mais
sistemática e precisa (1994, p. 79).
A escolha deste método visa uma maior proximidade entre o pesquisador e os
dados coletados e uma investigação do tema dentro do seu contexto real. Para
desenvolver este estudo de caso foi utilizada uma pesquisa informal, a fim de
averiguar com os sujeitos o que ele conhece e desconhece sobre o tema dentro da
sua ambiência educativa. Para Lüdke:
[...] a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa
de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações
obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou
problema (1986, p.38).
Ainda, o autor (1986) esclarece que este tipo de pesquisa pode ser
desenvolvido na área da educação onde se envolvem professores, diretores,
orientadores, alunos e pais, por serem entrevistas mais livres e menos estruturadas.
33
O estudo foi baseado em entrevistas com supervisores e educadores de
diferentes redes de ensino: estaduais, municipais e privadas. Segundo a
entrevistadora se fez necessário essa abordagem para conhecer os reais resultados,
pois estas são pessoas pertencentes à arena tópica do estudo, em concordância
com os estudos de Rudin e Rudin (apud PASTRO, 1998), que é formado por
aqueles afetados por um problema ou por quem interage intensamente em um
assunto restrito.
3.1 Coração, corpo e mente: buscando novos significados para decifrar os
segredos da espécie humana
Antes de rascunhar milhares de pensamentos, indagações e teorias faço um
convite para um mergulho num universo rico de diversidades, de limitações, de
interatividade, de dúvidas, de sentimentos, de preconceitos e de mistérios, que faz
desta uma espécie rara entre outros seres vivos, uma espécie em constante
transformação: o ser humano.
Quem sou, quem está ao meu lado, qual a melhor maneira de conhecer os
outros, como interajo com o mundo, com a vida e com as pessoas?
Para as diferentes respostas dadas às perguntas uma única certeza: a
necessidade de nos conhecermos como seres humanos introduzidos numa
sociedade influenciada por uma ideologia capitalista, que desenvolve uma cultura
voltada para o acúmulo de posses, dinheiro, o egocentrismo e o egoísmo. Aos
poucos somos sugados pela carência de sentimentos, a falta de zelo com o próximo,
O respeito, o afeto, que muitas vezes nos fazem pensar como o único habitante
deste imenso lugar.
Diante de tanta complexidade conseguimos perceber no cotidiano que temos
necessidade do próximo, a fim de darmos continuidade a nossa evolução. Mas, para
essa vivência ser harmoniosa precisamos revelar o tesouro escondido em cada um
de nós para enfim, descobrirmos e entendermos o outro.
Foi a partir destas curiosidades e no entrelaçar da vida profissional que
procurei dar significado a tudo o que eu mais acredito; a essência do ser humano. A
opção pela Análise Textual Discursiva permitiu qualificar melhor este trabalho,
conforme os estudos de Moraes (2002), levando-me a categorização depois da
desmontagem das entrevistas.
34
Para entender e compreender estes pensamentos reorganizei as respostas
dadas para as questões das entrevistas em quatro diferentes categorias:
3.1.1 Arte humana de humanização;
3.1.2 Significado de relações interpessoais;
3.1.3 A importância do ambiente a fim de proporcionar o relacionamento
interpessoal;
3.1.4 O Supervisor Educacional – uma provoc-ação do processo em relação
propositiva na ambiência educativa.
Os sujeitos desta entrevista serão denominados como agentes: A1, A2, A3 e
A4.
3.1.1 Arte humana de humanização
Segundo o dicionário Luft (2000), humanizar significa tornar-se humano,
benigno, afável, compassivo; reduzir-se ao estado e condição de humano; avaliar-se
e humanar-se.
Sendo assim é preciso relacionar-se para então se tornar humano. Segundo o
A1 para decifrar o outro, preciso primeiro me conhecer. Primeiramente amando-se e
valorizando-se a si mesmo, se aceitando como é, tendo uma visão saudável se si,
de suas melhores atitudes, piores defeitos e possíveis mudanças.
Em contrapartida o A2 associa que exista uma nova relação humana que
deva buscar a comunicação entre as pessoas, buscar a verdade e a legitimidade em
conjunto e que esteja baseada em critérios de verdade na argumentação e na
discussão.
Essa relação se estabelece quando as pessoas convivem e trabalham com
outras pessoas e portam-se como pessoas, isto é, reagem às outras pessoas com
as quais entram em contato: comunicam-se, simpatizam e sentem atrações,
antipatizam e sentem aversões, aproximam-se, afastam-se, entram em conflito,
competem, colaboram, desenvolvem afeto. Essas interferências, voluntárias e
involuntárias, intencionais ou inintencionais, constituem o processo de interação
humana, em que cada pessoa na presença da outra pessoa não fica indiferente a
essa situação de presença estimuladora.
35
E para que esta relação tenha significado o A3 indaga sobre a arte do diálogo
que é primordial para que se estabeleça uma comunicação propícia na busca de
motivação e da harmonia do grupo. Através do diálogo podemos construir relações
de empatia que favoreçam o desenvolvimento da auto-estima, essencial para o
sucesso das relações interpessoais. Segundo Freire:
[...] viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em vez, de
acordo com o momento, tomar a própria prática de abertura ao outro como
objeto da reflexão crítica deveria fazer parte da aventura docente. A razão
ética da abertura, seu fundamento político, sua referência pedagógica; a
boniteza que há nela como viabilidade do diálogo. A experiência da abertura
como experiência fundante do ser inacabado. Seria impossível saber-se
inacabado que terminou por se saber inacabado. Seria impossível saber-se
inacabado e não se abrir ao mundo e aos outros à procura de explicação,
de respostas a múltiplas perguntas (1996, p. 136).
Dialogar nada mais é que ouvir, respeitar. Para o A3 estes contatos é que nos
evoluem como sujeitos, que evoluem as circunstâncias e a cultura e, que possibilita
a construção de vínculos favoráveis ou desfavoráveis entre as pessoas.
Em consonância com esta idéia o A1 registra que toda discussão deva estar a
serviço da consciência moral, que não deve ser usada para enganar ou derrubar
pessoas, ou seja, o mesmo acredita na capacidade humana de auto-reflexão e auto
questionamento e, em conseqüência, no aprimoramento individual e na evolução
social.
Para assim desenvolvermos estas capacidades devemos estar sempre
dispostos a nos conhecer dia a dia, através de nossos erros, gestos e atitudes, como
seres dotados de qualidades e defeitos.
Para finalizar o A1 redige que tudo é aprendizado em se tratando de
relacionamentos, o melhor mesmo é fazer uma ponte, logo, conforme o A2 é
compreender o que é dito.
3.1.2 Significado de relações interpessoais
Segundo o A4 relações interpessoais são todos os contatos entre as pessoas,
em que muitos podem ser as variáveis: sujeitos, circunstâncias locais, cultura,
educação e época.
É o processo de como dar significado e entendimento aos fatores que
interferem no processo de interação humana. Segundo Moscovici:
36
[...] para quem o processo de interação humana é complexo e
ocorre, permanentemente, entre pessoas, sob a forma de comportamentos
manifestos e não-manifestos, verbais e não-verbais, pensamentos,
sentimentos, reações mentais e / ou físico-corporais. Assim, diz ela, “um
olhar, um sorriso, um gesto, uma postura corporal, um deslocamento físico,
de aproximação ou afastamento, constituem formas não-verbais de
interação entre pessoas” E mesmo quando alguém vira as costas e fica em
silêncio, isto, também, é interação – e tem um significado, pois comunica
algo aos outros. O fato de sentir a presença do outro já é interação (1998, p.
33).
Para o A3 relações interpessoais são todos os contatos entre as pessoas, em
todos os meios, seja familiar, educacional, social e profissional. Segundo Mosquera
e Stobäus (2001) a relação interpessoal depende essencialmente destas vivências e
convivências sociais.
Para completar esta afirmação o A1 afirma que as relações interpessoais
estão presentes sempre que houver minha interação em qualquer ambiente, onde
participo de alguma atividade com pessoas. Relacionar-se é dar e receber ao
mesmo tempo. Nesta interação com o outro é importante que haja muita
sensibilidade de reconhecer aquilo que quero dar e aquilo que quero receber,
estabelecendo limites, para não apenas satisfazer os desejos alheios e esquecendo
daquilo que realmente desejo. Segundo os autores Grün e Robben “muitos sofrem
com o fato de simplesmente não saberem impor limites” (2007, p. 07).
Para contemplar essa compreensão o A3 escreve que se deva possibilitar a
construção de vínculos favoráveis onde a aceitação do outro transpareça no modo
de falar, olhar, na postura e forma de agir adequadamente,
Por outro lado, o processo de interação humana tem origem no que
chamamos de “primeira impressão”, considerada como o impacto que cada um
causa no outro pelo simples fato de estarem em presença mútua. No entanto, essa
primeira impressão sofre condicionamentos, em sua formação, razão pela qual se
torna importante a compreensão de sua dinâmica. Segundo Bock:
[...] a percepção social é o ponto de partida para as relações
interpessoais – percebemo-nos um ao outro e percebemos não só a
presença do outro, mas o conjunto de características que apresenta, o que
nos possibilita ter uma impressão dele (1995 p. 135).
37
O A4 acredita também que atualmente a construção destas relações vem se
complicando em função da turbulência em que estamos inseridos. Mosquera e
Stobäus afirmam:
[...] que se deve aprender a entender um mundo em constante
mutação. Ver que mudança e o desequilíbrio são os que mais nos rodeiam.
Necessitamos entender a arte da tolerância e aprender que é nas
diferenças que se encontram as afetividades (2001, p. 102).
Para finalizar o A1, registra, redescobrindo que muitas vezes se deva reciclar
seus valores pessoais para que eu possa me relacionar melhor com os meus
colegas. Porém isto não é fácil, pois geralmente o ambiente não é propício para as
relações interpessoais.
3.1.3 A importância do ambiente a fim de proporcionar o relacionamento
interpessoal
Valorizar cada um em particular através de reconhecimento, comemoração de
seu aniversário, consolo nos momentos difíceis, como perda de parente e amigo
para o A1 é um meio indispensável para o estabelecimento de um ambiente que
valorize as relações interpessoais.
Quando estamos inseridos em um ambiente seja ele familiar, profissional e
social conseguimos estabelecer relações com o mesmo, ou seja, se ele desfrutar de
pessoas equilibradas emocionalmente proporcionará aconchego, calor humano,
transmitindo assim, tranqüilidade e serenidade.
Um ambiente propício para o desenvolvimento interpessoal, conforme relata
o A2 é o ambiente com profissionais competentes enriquecem estas relações,
contribuindo de forma significativa para o crescimento emocional do grupo e dos
indivíduos.
Em consonância com estas idéias o A1, crê que cada vez mais, sentimos o
quanto é importante favorecer um ambiente propício para as relações interpessoais
frutificarem saudavelmente em nossas escolas.
O A3 reforça este pensamento ao acreditar que o ambiente influencia no
comportamento das pessoas e, por conseqüência influencia nas relações
interpessoais e supostamente nos resultados das aprendizagens em todos os
sentidos.
38
Segundo Mosquera e Stobäus “grande parte dos problemas que um docente
enfrenta podem ser provenientes de um ambiente hostil, podendo este se tornar
ainda mais hostil quando se trabalha com pessoas diversas” (2001, p. 93).
As relações se estabelecem junto ao ambiente que estamos inseridos e para
desfrutarmos de um ambiente saudável temos que desenvolver a capacidade de
aceitar o outro como ele é, escutando-o e colocando-se no lugar dele conforme o
pensamento do A1.
3.1.4 Supervisão Educacional: uma provoc-ação do processo de interelação
propositiva na ambiência educativa
Quem são os supervisores educacionais? Quais os papéis que eles
desempenham nos ambientes educativos? Um ambiente educativo é propício a
aprendizagem quando reconhecemos na ação pedagógica do Supervisor
Educacional um parceiro de trabalho?
Trata-se de Super herói? Super Visão? Super Ação? Ou Super Humano?
Um ser humano em constante transformação que acerta, erra, que tenta
compreender a si e aos outros.
Segundo o A1 a supervisão tem um papel preponderante na construção de
um coletivo com objetivos e trabalhos comuns, bem como olhares voltados ao fazer
pedagógico e para o A3 é necessário acreditar na ação da supervisão educacional
como determinante na construção de vínculos nas ambiências escolares,
beneficiando sobremaneira o equilíbrio destes relacionamentos. Para Mosquera e
Stobäus:
[...] nossa pessoa, independente de sua idade, está sempre sendo
colocada à prova, passando por crises, transformações, modificações que
envolvem muitos aspectos que, às vezes, não nos damos conta e que têm
uma relevância fundamental. São justamente as mudanças de papel, já que
na vida adulta desempenhamos vários papéis e exigimos, para fazê-lo,
grande nível de maturidade e consciência (2001, p. 94-95).
Cada vez mais acredito na ação supervisora que valoriza os seus
colaboradores, que desempenha os diferentes papéis de ouvinte, falante, de
39
compreensivo, prestativo e por fim, de saber conviver com respeito e sensibilidade
com seu grupo de trabalho. Para Roza o Supervisor Educacional precisa:
[...] saber conviver: apresenta-se como um dos desafios
fundamentais para a educação desse milênio, conforme afirma Delors
(1999). Esse pilar pode expressar-se no ambiente educativo de várias
maneiras, como por exemplo a busca de comprometimento e engajamento
da equipe de trabalho em torno de um projeto comum, a construção de
parcerias em trabalhos interdisciplinares, a sistemática de reuniões e
encontros de formação continuada, em que é possível o estudo de temas de
interesse comum. Sem esquecer dos sentimentos que se manifestam no
convívio diário entre as pessoas que, sem dúvida, corroboram na
construção de um espaço educativo de crescimento e de fortalecimento da
equipe de trabalho (2004, p. 243).
Tudo isso se fortifica quando o A2 enfatiza que a supervisão educacional
deva proporcionar ao corpo docente momentos que possibilitem a esta nova relação
humana a busca de comunicação entre os professores, proporcionando ainda,
momentos de auto-reflexão e auto questionamento, estes momentos importantes
para o corpo docente.
Entendo que um supervisor é sem dúvida um parceiro que se preocupa com a
qualidade do processo ensino-aprendizagem, que possui diferentes papéis, o de
orientar, supervisionar e agregar todos os envolvidos. Segundo Barbosa:
[...] a sua função e o seu papel não são, como vimos, o de
controlar, espionar, entregar: como membro de comunidade educativa, o
supervisor não está acima nem abaixo de ninguém. Está ao lado, olhando
as pessoas no mesmo nível, sem autoritarismo, sem prepotência (2004, p.
217-218).
Ao concluirmos este pequeno ensaio o A1 reforça que a ação supervisora
deva ser sempre refletida, num ato de me colocar-me no lugar do outro, antes de
julgá-lo.
A partir do exposto acima, nos é possível perceber proposições efetivas do
estabelecimento de relações interpessoais originárias de uma ação supervisora
enquanto objeto de humanização do processo educativo. Logo, elencamos algumas
sugestões originárias dos pesquisados:
Reuniões pedagógicas temáticas, por exemplo, “Auto - estima do
Professor”, sendo um voltar-se para a problemática atual e resgatar o que de melhor
os professores têm e valorizá-los por isso.
Encontros eventuais para resolver algum conflito interno;
40
Momentos de reflexão em grupos e em individual com material propício e
atividades partilhadas;
Confraternizações em datas expressivas (dia das mães, dos pais, do
professor, do aniversário da escola, etc);
Resolução de conflitos através do diálogo e até de perdão;
Mediar às relações mais difíceis, dialogando, conhecendo melhor os
colegas, ouvindo muito e acompanhando o trabalho do grupo;
Reuniões com professores de classes populares, com professores da
mesma disciplina;
Dinâmicas de Grupo;
Momentos de integração entre todas as disciplinas, com troca de
experiências e materiais, bem como a participação dos educadores em eventos fora
da escola, para que possam se instrumentalizar mais e enriquecer o grupo;
Construção de momentos especiais para conversas informais, discussões
em torno de interesses gerais, permitirem que o professor fale de si mesmo;
Seminários, feiras, cursos e congressos.
Para concluir o A4 enfatiza que a supervisão educacional poderá contribuir
para a melhoria das relações interpessoais no ambiente educativo com ações
propositivas que favoreçam a harmonia do convívio social.
41
4 ATRIBUINDO UM REAL SIGNIFICADO A PRÁXIS PEDAGÓGICA DA
SUPERVISÃO EDUCACIONAL
Pensar em uma educação de qualidade é qualificar o processo ensinoaprendizagem
a fim de favorecer a todos os envolvidos momentos de harmonia,
tranqüilidade, respeito e conhecimento necessários para a continuidade do seu
processo de evolução enquanto sujeitos humanos.
Todos os indivíduos já passaram por momentos difíceis tanto no cotidiano
familiar, profissional e social. Foi através de experiências positivas e negativas que
percebi que era hora de desacomodar, de refletir e de fazer mudanças.
Era hora de colocar em ação um pouco da bagagem que vinha adquirindo no
meu processo de formação enquanto pessoa humana e profissional da educação.
Minha grande paixão em conhecer o outro, respeitá-lo e amá-lo foi a via
impulsionadora deste Projeto, que pretende ajudar as pessoas a se descobrirem, a
alçar vôos possíveis e acima de tudo perceber que precisamos uns dos outros para
evoluir.
Paixão mobilizadora, ofício ou vocação, respostas ainda em construções, mas
conforme Freire acredito que “ensinar exige querer bem aos educandos” (1996,
p.141). E ainda se apropriando de seus belos conhecimentos afirmo que:
[...] e o que dizer, mas sobretudo que esperar de mim, se, como
professor, não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar
aberto ao gosto de querer bem, à coragem de querer bem aos educadores
e à própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem
não significa, na verdade, que porque professor, me obrigo a querer bem a
maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os
educandos, numa prática específica do ser humano (1996, p.141).
Foi essa capacidade de amar que me fez buscar objetivos e metas, que me
fez rir e chorar e que me proporcionou imensos momentos de prazer social e
cognitivo.
42
4.1 Conhecendo o Projeto
4.2 Titulo do Projeto
Educar numa perspectiva humanista: relações interpessoais.
4.3 Objetivo Geral
Conscientizar os envolvidos no processo ensino-aprendizagem da importância
das relações interpessoais, enfatizando a integração como um caminho a ser
seguido, a fim de se proporcionar um clima favorável à empresa-escola, por meio de
colaboração confiante e pertinente.
4.3.1 Objetivos Específicos
Verificar como se configuram os relacionamentos entre professores, alunos e
setores que convivem no espaço escolar, bem como o clima desse ambiente.
Conhecer os grupos, suas ansiedades e interesses no trabalho pedagógico.
Conscientizar da necessidade da coletividade para modificação de atitudes e
práticas pedagógicas.
Melhorar a qualidade da comunicação e das linguagens existentes no grupo.
Respeitar os posicionamentos, os valores, as crenças e individualidades dos
envolvidos no processo escolar.
Debater estratégias com o grupo docente de possíveis ações que contribuam na
relação interpessoal entre professores e alunos.
Proporcionar momentos de relatos e reflexões sobre a importância da disciplina
pedagógica de filosofia na construção das relações interpessoais.
4.4 Justificativa
Ao falar em Educação não podemos esquecer de que os atores envolvidos
neste processo são humanos, que possuem sentimentos, crenças e
individualidades.
Este aspecto nos faz lembrar que a educação não está meramente interligada
às práticas pedagógicas. Existem muitas formas de transmissão de conhecimento,
mas o ato de educar só ocorre quando existe afeto e se completa com muito amor.
43
Em função disto, a equipe diretiva do Colégio Luterano da Paz, sugeriu como
tema as relações interpessoais, para ser desenvolvido com os profissionais da
educação desta Instituição.
Como pedagoga, em constante aperfeiçoamento elaborei este projeto,
trazendo a educação numa perspectiva mais humanista, valorizando o ser humano
como um todo, dotado de sentimentos e ações, buscando em suas relações a
integração para que se proporcione aos professores e alunos um excelente clima de
colaboração confiante e pertinente, a fim de atingir os objetivos primordiais da
educação: a formação do ser humano.
4.5 Fundamentação Teórica
Ciente de tantas modificações ocorridas na sociedade e na educação se faz
necessário pensar em mudanças que possibilitem a qualidade do processo ensinoaprendizagem.
Percebe-se a necessidade de novas práticas pedagógicas que proporcionem
aos envolvidos melhorais em suas formações pessoais e profissionais.
Com a globalização e a competitividade no mercado de trabalho temos como
educadores a responsabilidade na formação de cidadãos críticos, conscientes,
preparados para exercerem autonomia e habilidades necessárias para se inserirem
no mercado de trabalho.
É importante lembrar que as mudanças não podem ocorrer apenas no âmbito
pedagógico, pois os personagens envolvidos neste processo são indivíduos que
possuem deferentes habilidades emocionais, sociais e cognitivas.
Historicamente os papéis de educadores e educandos vêem passando por
ressignificações, deixando de serem detentores e reprodutores de saberes, porém,
nos dias de hoje, educadores e alunos ressurgem na cumplicidade entre querer
ensinar e se permitir aprender.
Nesta nova perspectiva não podemos deixar de citar as relações
interpessoais como uma linha de ação que visa às bases emocionais e
psicopedagógicas dos seres humanos. Segundo Celso Antunes:
[...] cada pessoa é, e sempre será, um verdadeiro universo de
individualidade; suas ações, seus motivos, seus sentimentos constituem
paradigma único. (...) esta originalidade de cada um dificulta a comunicação
interpessoal e com ela todo esquema de relações humanas que envolve o
segredo do conviver (2003, p.09-10).
44
O objetivo deste Projeto é atingir os profissionais da educação de que as
mudanças são necessárias e possíveis, se nos engajarmos nesta proposta com
coração e mentes abertas, a fim de proporcionar as salas de aulas um espaço de
crescimento integral. Freire exemplifica bem esta frase com a seguinte citação:
[...] mudar é difícil, mas é possível, - que me empurra esperançoso
à ação, não é suficiente para a eficácia necessária a que me referi.
Movendo-me enquanto nele fundado, preciso ter e renovar saberes
específicos em cujo campo minha curiosidade se inquieta e minha prática
se embaseia (2004, p.80).
Todas as propostas a serem apresentadas no Projeto permitem que o
educador pense, reflita e sugira possíveis mudanças em suas práticas pessoais e
pedagógicas, a fim de garantir com seus colegas e educandos laços sólidos em
suas relações humanas.
A globalização trouxe grande preocupação, pois nossos interesses estavam
relacionados com a qualificação profissional e com o mercado de trabalho. Diante de
tudo isso, começamos a deixar de lado as relações humanas e nos preocuparmos
somente com a profissionalização.
Foi se percebendo nas instituições uma crise nas relações, pois os
educadores acabavam assumindo um compromisso com sua profissionalização,
envolvendo-se somente no domínio de teorias pedagógicas, acumulando saberes,
competências e habilidades para ministrar uma excelente aula.
E por fim, os educandos acabavam sofrendo tais conseqüências, pois,
recebiam de seus mestres acúmulos de saberes que os ajudariam somente na sua
vida estudantil. Foi através destes fatores, que a educação começou a perder seu
propósito.
Esta proposta busca proporcionar com os educadores um resgate no ato de
educar, interligando as relações interpessoais na busca de um ambiente propício
para a qualidade educacional. Gadotti propõe que:
45
[...] a qualidade do relacionamento como facilitador da
aprendizagem é embasada na confiança dada, pela abertura na
comunicação, podendo a mesma trilhar dois caminhos: a do
desenvolvimento de valores e de percepções entre alunos e alunos. Uma
comunicação nesta direção tende a se desenvolver numa sala de aula
aberta, com um diálogo colaborativo, verbalizado ou não, entre os
participantes, sob a forma de idéias, entendimentos e conceitos (1994,
p.58).
É importante salientar que esse Projeto percorreu o propósito de conscientizar
de que existem diferentes estratégias pedagógicas que despertem a construção de
valores e que a integração entre professores e alunos se torna um recurso
indispensável para se atingir esse objetivo.
4.6 Metodologia e Cronograma
O projeto tem como metodologia o trabalho no cotidiano das instituições com
a capacitação de profissionais através de palestras que proporcionem momentos de
autoconhecimento, reflexões, dinâmicas e ações que facilitem a troca de idéias e
sugestões.
Estas capacitações têm por objetivo a iniciativa de um processo de mudança,
que só acontecerá se houver a continuidade destas ações-reflexões no cotidiano
profissional. A semente é lançada, porém necessita da dedicação em sua
semeadura.
46
5 ESTÁGIO
O estágio realizado ao longo do presente curso de especialização, aqui
denominado de capacitações desenvolveu-se em diferentes instâncias curriculares:
escolas particulares, estaduais e municipais através do trabalho em parceria com a
Associação dos Supervisores de Educação do Estado do Rio Grande do Sul –
ASSERS, com o objetivo de qualificar o grupo pedagógico das instituições.
Durante todo o ano de 2008, este trabalho foi ocorrendo à medida que ele
vinha sendo descoberto e reconhecido pelos profissionais que participaram desta
formação. O crescimento ocorreu gradativamente e foi sobrevoando áreas fora do
município de Porto Alegre, pousando na cidade de Camaquã.
O propósito inicial era despertar em cada profissional da instituição que
estava sendo desenvolvido o desejo de mudanças e o de não acostumar com as
situações por eles vivenciadas nestes contextos.
Flores? Nem tudo foram flores. Pedras? Muitas pedras! Que não me fizeram
perder o rumo, mas que provocaram mais força, mais garra, mais vontade de ver
que mudanças pudessem acontecer. Acreditar nestes aspectos foram mais uma
certeza, a de acreditar na potencialidade de cada ser humano!
Cada instituição possui características diferentes, o que reflete a colheita
deste trabalho.
Em muitas escolas, me deparei com o negativismo, com a falta de paixão e
desejo que nos mobiliza a mudar e a evoluir. E que algumas vezes te adoece, te
“resfria” e te incomoda. Porém, os objetivos eram claros e a continuidade de semear
iria gerar frutos e flores.
Em outras instituições se percebia um grupo adormecido, num sono tranqüilo,
fácil de ser mobilizado, pronto para ser sonhado em coletividade. Momentos de
energização e de se reabastecer com o calor humano que era resgatado aos poucos
e que nos faz sentir vivos e amados. Segundo Mosquera e Stobäus:
[...] o termo amar tem sido muito desgastado e mal usado e a
concepção que temos de amor é falsamente romântica ou muito ao gosto
do mundo individual burguês, no qual amar é amar os meus e não os
outros, é ter um uso exclusivo, evitando conhecer o ser humano como ser.
Aqui passamos pela primeira idéia de Freud, se amar pressupõe laços ou
pontes, é evidente que amar é uma forma de comunicação (2001, p. 97 –
98).
47
Assumir tal perspectiva é acreditar no ser humano, é desvendá-lo, é descobrilo
e acima de tudo é revelar o que existe de melhor em todos nós, momentos
gratificantes e proporcionados durante este ano de estágio.
48
CONCLUSÃO
Chegar a um veredicto final seria impossível, pois todas as palavras
alinhavadas nesta monografia descrevem o ser humano como um universo
particular.
Assunto inacabado, em constante transformação, que será redescoberto em
cada cotidiano, num simples ato desempenhado, nas ações e nos movimentos deste
mundo complexo.
Algumas perguntas ainda sem respostas, pois viver e ser um ser humano são
um desafio a todo instante. As respostas, respondidas com rigorosidade,
entretanto tenho a compreensão de que desvendar os seres humanos é
assemelha-se a tentar descobrir mistérios nunca revelados, é viajar sem
previsão de chegada e acima de tudo, é viver a vida sem compreensão do que
pode estar por vir8.
Diante das respostas que estão em construção referentes ao tema “Relações
Interpessoais”, tive a oportunidade de perceber que as pessoas cada vez mais
procuram mecanismos para se reconhecerem como pessoas e, assim tentando
entender o outro.
Mesmo com as dificuldades de convívio social que todos enfrentamos,
percebo que queremos mudanças e que elas só são possíveis quando existe o
equilíbrio nas relações interpessoais.
Precisamos ter controle de nossas ações, como um antigo provérbio “falar
pouco, ouvir mais”. Devemos ser amados e amar cada vez mais. Precisamos
respeitar e, em conseqüência sermos respeitados. Devemos valorizar e após,
seremos valorizados.
8 Grifos da autora.
49
Enfim... precisamos nos aceitar e nos conhecer, e só assim conheceremos os
outros, seus sentimentos e suas máscaras.
Relacionar-se é importante em qualquer contexto social, pois equilibra as
relações interpessoais nos levando ao equilíbrio e a harmonia, pois só assim, se
daremos a continuidade da nossa espécie humana.
Essa apreciação teve por finalidade reconhecer na Supervisão Educacional
as ações que potencializam as relações interpessoais sob a perspectiva propositiva
no ambiente educativo.
E foi além! E se pudesse não se concluiria com essas argumentações, pois o
resultado de um relacionamento interpessoal ultrapassa qualquer ordem cronológica
de fatos, pois somos seres em constantes transformações. Talvez seja por isso que
o término desta monografia tenha se prolongado, pois este assunto nunca será
inacabado.
50
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Mary. Supervisão Pedagógica: princípios e práticas. 2. ed. São Paulo: Papirus,
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Escola de Qualidade. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
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FERRETTI, Celso João. A sociedade do conhecimento. In: Encontro Nacional de
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GADOTTI, M. Pensamento pedagógico brasileiro. 5. ed. São Paulo: Ática, 1994.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas,
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51
GRUN, Anselm; ROBBEN, Ramona. Estabelecer Limites, Respeitar Limites:
segredos para relações interpessoais bem – sucedidas. Campinas, SP: Verus, 2007.
LIMA, Elma Corrêa de. Um Olhar Histórico sobre a Supervisão. In: RANGEL, Mary.
Supervisão Pedagógica: princípios e práticas. 2. ed. São Paulo: Papirus, 2001.
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Tamara; SILVA, Lauraci Donde da; ZORZO, Cacilda Maria (orgs.). Pedagogia em
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SAVIANI, Dermeval. A Supervisão Educacional em Perspectiva Histórica: da função
à profissão pela mediação da idéia. In: FERREIRA, Naura Syria Carapeto (org.).
Supervisão Educacional para uma Escola de Qualidade. 2. ed. São Paulo:
Cortez, 2000.
TORRES, Carlos Alberto. A escola precisa debater as influências da globalização.
In: Revista Nova Escola. O Brasil da pré-história. Ano XXVIII. N.212. mai. São
Paulo: Abril, 2008.
52
ANEXO
53
ASSOCIAÇÃO DOS SUPERVISORES DE EDUCAÇÃO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Decreto de Utilidade Pública Estadual N.° 6726
CNPJ N.° 88.939.020/0001-73
AV. Borges de Medeiros, 308 - Sala 106 –
Porto Alegre /RS -CEP: 90.020-020
Telefones: (51)32283498 (51) 32867634
Atestamos, para os devidos fins, que a aluna Andréia Cássia da Silva Skieresz realizou
estágio nesta Instituição, para a conclusão do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Supervisão
Educacional, parceria da Faculdades Portal e ASSERS- , totalizando 45 horas.
Porto Alegre 18 de dezembro de 2008.
ATESTADO

MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO

CENTRO ESTADUAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES GENERAL FLORES DA CUNHA
ENSINO DA LINGUAGEM III
Professora: Andréia Skieresz / EMAIL: decasmarco@ig.com.br

MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO

O método sintético
Consiste, fundamentalmente, na correspondência entre o oral e o escrito, entre o som e a grafia. Estabelece a correspondência a partir dos elementos mínimos (que são as letras), em um processo que consiste em ir das partes ao todo. Durante muito tempo se ensinou a pronunciar as letras, estabelecendo-se as regras de sonorização de escrita no seu idioma correspondente. Os métodos alfabéticos mais tradicionais aceitam essa postura.
Posteriormente, sob a influência da lingüística, desenvolve-se o método fonético, propondo que se comece do oral. A unidade mínima do som da fala é o fonema. Assim, neste processo iniciar-se-ia pelo fonema, associando-o à sua representação gráfica. É preciso que o sujeito seja capaz de isolar e reconhecer os diferentes fonemas de seu idioma, para poder, a seguir, relacioná-los aos sinais gráficos.
A ênfase está na análise auditiva para que os sons sejam separados e estabelecidas as correspondências grafema-fonema (letra-som).
Alguns princípios do método
→Pronúncia correta para evitar confusões entre os fonemas;
→Grafias de formas semelhantes devem ser apresentadas separadamente para evitar confusões visuais entre as elas;
→Ensinar um par de grafema-fonema de cada vez, sem passar para outro enquanto a associação não estiver bem memorizada.
→Iniciar com os casos de ortografia regular, isto é, palavras nas quais a grafia coincida com a pronúncia.
Na aprendizagem em primeiro lugar, está a mecânica da leitura (decifração do texto), sendo que posteriormente se teria a leitura com compreensão, culminando com uma leitura expressiva com entonação.
Sejam quais forem as divergências entre os defensores do método sintético, todas as correntes concordam com o seguinte: inicialmente a aprendizagem da leitura e escrita é uma questão mecânica; trata-se de adquirir uma técnica para decifrar o texto, porque se concebe a escrita como a transcrição gráfica da linguagem oral e ler equivale a decodificar o escrito em som.

As cartilhas
São a tentativa de coordenar todos esses princípios e pressupostos : evitar confusões auditivas e/ou visuais; apresentar um fonema e seu grafema correspondente por vez; trabalhar com os casos de ortografia regular. Por isso, a utilização das sílabas sem sentido, o que acaba acarretando a dissociação do som em relação ao significado, e portanto, a leitura da fala.
Encontramos na aplicação desse método a proposição da aprendizagem em dois momentos descontínuos : quando não se sabe, é necessário passar por uma etapa mecânica; quando já se sabe, chega-se à compreensão( leitura mecânica, compreensiva).

O método analítico
Para os defensores do método analítico, ao contrário, a leitura é um ato global e ideovisual. Decroly contesta os postulados do método sintético, acusando-o de mecanicista, e postula que "no espírito infantil as visões de conjunto precedem a análise". O prévio, segundo o método analítico, é o reconhecimento global de palavras ou orações; a análise dos componentes é uma tarefa posterior. Não importa a dificuldade auditiva daquilo que se aprende, já que a leitura é uma tarefa predominantemente visual. A alfabetização parte do todo para o

REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA O ENSINO FUNDAMENTAL - PORTUGUÊS

REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA O ENSINO FUNDAMENTAL - PORTUGUÊS

Brasil. Secretaria de Educação Fundamental.
B823p Parâmetros curriculares nacionais: língua portuguesa /
Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: 144p.
1.Parâmetros curriculares nacionais. 2. Língua
portuguesa : Ensino de primeira à quarta série. I. Título.

CDU: 371.214

OBJETIVOS GERAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Os Parâmetros Curriculares Nacionais indicam como objetivos do ensino fundamental que os alunos sejam capazes de:
• compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;
• posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;
• conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao País;
• conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais;
• perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente;
• desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania;
• conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relação à sua saúde e à saúde coletiva;
• utilizar as diferentes linguagens — verbal, matemática, gráfica, plástica e corporal — como meio para produzir, expressar e comunicar suas idéias, interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação;
• saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos;
• questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.



ESTRUTURA DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL










Os quadrinhos não-sombreados correspondem aos itens que serão trabalhados nos Parâmetros Curriculares Nacionais de quinta a oitava série.







CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE LÍNGUA PORTUGUESA

Desde o início da década de 80, o ensino de Língua Portuguesa na escola tem sido o centro da discussão acerca da necessidade de melhorar a qualidade da educação no País. No ensino fundamental, o eixo da discussão, no que se refere ao fracasso escolar, tem sido a questão da leitura e da escrita. Sabe-se que os índices brasileiros de repetência nas séries iniciais — inaceitáveis mesmo em países muito mais pobres — estão diretamente ligados à dificuldade que a escola tem de ensinar a ler e a escrever. Essa dificuldade se expressa com clareza nos dois gargalos em que se concentra a maior parte da repetência: no fim da primeira série (ou mesmo das duas primeiras) e na quinta série. No primeiro, por dificuldade em alfabetizar; no segundo, por não conseguir garantir o uso eficaz da linguagem, condição para que os alunos possam continuar a progredir até, pelo menos, o fim da oitava série.
Por outro lado, a dificuldade dos alunos universitários em compreender os textos propostos para leitura e organizar idéias por escrito de forma legível levou universidades a trocar os testes de múltipla escolha dos exames vestibulares por questões dissertativas e a não só aumentar o peso da prova de redação na nota final como também a dar-lhe um tratamento praticamente eliminatório.
Essas evidências de fracasso escolar apontam a necessidade da reestruturação do ensino de Língua Portuguesa, com o objetivo de encontrar formas de garantir, de fato, a aprendizagem da leitura e da escrita.
Nos últimos dez anos, a quase-totalidade das redes de educação pública desenvolveu, sob a forma de reorientação curricular ou de projetos de formação de professores em serviço (em geral os dois), um grande esforço de revisão das práticas tradicionais de alfabetização inicial e de ensino da Língua Portuguesa. Seja porque a demanda quantitativa já estava praticamente satisfeita — e isso abria espaço para a questão da qualidade da educação —, seja porque a produção científica na área tornou possível repensar sobre as questões envolvidas no ensino e na aprendizagem da língua, o fato é que a discussão da qualidade do ensino avançou bastante. Daí estes Parâmetros Curriculares Nacionais soarem como uma espécie de síntese do que foi possível aprender e avançar nesta década, em que a democratização das oportunidades educacionais começa a ser levada em consideração, em sua dimensão política, também no que diz respeito aos aspectos intra-escolares.
Sem a pretensão de historiar a área, é possível descrever em linhas gerais o processo de transformação das idéias que, nas últimas três décadas, têm circulado na escola e funcionado como referência para a prática dos professores das séries iniciais.
O conhecimento disponível nos anos 60 levava a buscar no aluno a causa do fracasso escolar — o que tinha sua lógica, visto que para uma parte dos alunos o ensino parecia funcionar. Uma boa ilustração dessa abordagem são os exercícios de — prontidão —. Pensava-se que aos alunos que fracassavam devia faltar algo, sendo, então, necessário compensar esse déficit para que pudessem aprender.
“No início dos anos 80, começaram a circular, entre educadores, livros e artigos que davam conta de uma mudança na forma de compreender o processo de alfabetização; deslocavam a ênfase habitualmente posta em como se ensina” e buscavam descrever — como se aprende —. Tiveram grande impacto os trabalhos que relatavam resultados de investigações, em especial a psicogênese da língua escrita.
Esses trabalhos ajudaram a compreender aspectos importantes do processo de aprendizagem da leitura e da escrita. Permitiram, por exemplo, que se começasse a desvelar as razões pelas quais as crianças que vinham de famílias mais favorecidas pareciam ter muito mais desenvoltura para lidar com as demandas escolares que as de famílias menos favorecidas. Com o deslocamento do eixo da investigação das questões do ensino para as questões da aprendizagem, foi possível compreender que as crianças sabiam muito mais do que se poderia supor até então, que elas não entravam na escola completamente desinformadas, que possuíam um conhecimento prévio. Mas, as de famílias mais favorecidas tinham maiores oportunidades de participação em atividades sociais mediadas pela escrita, possuíam muito mais experiências significativas com a escrita do que as crianças das classes menos favorecidas, e essa diferença, que se expressava no desempenho, marcou a vida escolar dessas crianças desde o seu início.
Os resultados dessas investigações também permitiram compreender que a alfabetização não é um processo baseado em perceber e memorizar3 , e, para aprender a ler e a escrever, o aluno precisa construir um conhecimento de natureza conceitual: ele precisa compreender não só o que a escrita representa, mas também de que forma ela representa graficamente a linguagem.
A divulgação desses resultados de pesquisas por várias secretarias de educação desencadeou em uma parcela pequena (mas ativa e comprometida) de alfabetizadores e técnicos um esforço de revisão das práticas de alfabetização. A primeira prática questionada foi a dos exercícios de prontidão.
Também o silabário da cartilha — confundido muitas vezes com a própria idéia de alfabetização — tem sido substituído por uma grande variedade de textos. A divulgação dessas novas propostas didáticas tem produzido bons resultados, mas também, infelizmente, bastante desinformação: as mudanças em pedagogia são difíceis, pois não passam pela substituição de um discurso por outro, mas por uma real transformação da compreensão e da ação.
As condições atuais permitem repensar sobre o ensino da leitura e da escrita considerando não só o conhecimento didático acumulado, mas também as contribuições de outras áreas, como a psicologia da aprendizagem, a psicologia cultural e as ciências da linguagem. O avanço dessas ciências possibilita receber contribuições tanto da psicolingüística quanto da sociolingüística; tanto da pragmática, da gramática textual, da teoria da comunicação, quanto da semiótica, da análise do discurso.
No que se refere à linguagem oral, algo similar acontece: o avanço no conhecimento das áreas afins torna possível a compreensão do papel da escola no desenvolvimento de uma aprendizagem que tem lugar fora dela. Não se trata de ensinar a falar ou a fala “correta”, mas sim as falas adequadas ao contexto de uso.
Os esforços pioneiros de transformação da alfabetização escolar consolidaram-se, ao longo de uma década, em práticas de ensino que têm como ponto tanto de partida quanto de chegada o uso da linguagem. Práticas que partem do uso possível aos alunos e pretendem provê-los de oportunidades de conquistarem o uso desejável e eficaz4 . Em que a razão de ser das propostas de leitura e escuta é a compreensão ativa e não a decodificação e o silêncio. Em que a razão de ser das propostas de uso da fala e da escrita é a expressão e a comunicação por meio de textos e não a avaliação da correção do produto. Em que as situações didáticas têm como objetivo levar os alunos a pensarem sobre a linguagem para poderem compreendê-la e utilizá-la adequadamente.
A futurologia dos anos 60 gostava de afirmar categoricamente que o mundo da escrita daria lugar ao mundo da imagem; que a mídia eletrônica destruiria o mundo cultural criado pelo livro impresso que propiciou a História, a Ciência e a Literatura. Mas o que se viu nestes trinta anos aponta em outra direção. Ser um usuário competente da escrita é, cada vez mais, condição para a efetiva participação social.
Mas não são os avanços do conhecimento científico por si mesmos que produzem as mudanças no ensino. As transformações educacionais realmente significativas — que acontecem raramente — têm suas fontes, em primeiro lugar, na mudança das finalidades da educação, isto é, acontecem quando a escola precisa responder a novas exigências da sociedade. E, em segundo lugar, na transformação do perfil social e cultural do alunado: a significativa ampliação da presença, na escola, dos filhos do analfabetismo — que hoje têm a garantia de acesso, mas não de sucesso — deflagrou uma forte demanda por um ensino mais eficaz. Estes Parâmetros Curriculares Nacionais pretendem contribuir nesse sentido.

Linguagem e participação social
O domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos necessário para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos.
Essa responsabilidade é tanto maior quanto menor for o grau de letramento das comunidades em que vivem os alunos. Considerando os diferentes níveis de conhecimento prévio, cabe à escola promover a sua ampliação de forma que, progressivamente, durante os oito anos do ensino fundamental, cada aluno se torne capaz de interpretar diferentes textos que circulam socialmente, de assumir a palavra e, como cidadão, de produzir textos eficazes nas mais variadas situações.


Linguagem, atividade discursiva e textualidade
A linguagem é uma forma de ação interindividual orientada por uma finalidade específica; um processo de interlocução que se realiza nas práticas sociais existentes nos diferentes grupos de uma sociedade, nos distintos momentos da sua história. Dessa forma, se produz linguagem tanto numa conversa de bar, entre amigos, quanto ao escrever uma lista de compras, ou ao redigir uma carta — diferentes práticas sociais das quais se pode participar. Por outro lado, a conversa de bar na época atual diferencia-se da que ocorria há um século, por exemplo, tanto em relação ao assunto quanto à forma de dizer, propriamente — características específicas do momento histórico. Além disso, uma conversa de bar entre economistas pode diferenciar-se daquela que ocorre entre professores ou operários de uma construção, tanto em função do registro e do conhecimento lingüístico quanto em relação ao assunto em pauta.
Dessa perspectiva, a língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmas.
A linguagem verbal possibilita ao homem representar a realidade física e social e, desde o momento em que é aprendida, conserva um vínculo muito estreito com o pensamento. Possibilita não só a representação e a regulação do pensamento e da ação, próprios e alheios, mas, também, comunicar idéias, pensamentos e intenções de diversas naturezas e, desse modo, influenciar o outro e estabelecer relações interpessoais anteriormente inexistentes.
Essas diferentes dimensões da linguagem não se excluem: não é possível dizer algo a alguém sem ter o que dizer. E ter o que dizer, por sua vez, só é possível a partir das representações construídas sobre o mundo. Também a comunicação com as pessoas permite a construção de novos modos de compreender o mundo, de novas representações sobre ele. A linguagem, por realizar-se na interação verbal dos interlocutores, não pode ser compreendida sem que se considere o seu vínculo com a situação concreta de produção. É no interior do funcionamento da linguagem que é possível compreender o modo desse funcionamento. Produzindo linguagem, aprende-se linguagem.
Produzir linguagem significa produzir discursos. Significa dizer alguma coisa para alguém, de uma determinada forma, num determinado contexto histórico. Isso significa que as escolhas feitas ao dizer, ao produzir um discurso, não são aleatórias — ainda que possam ser inconscientes —, mas decorrentes das condições em que esse discurso é realizado. Quer dizer: quando se interage verbalmente com alguém, o discurso se organiza a partir dos conhecimentos que se acredita que o interlocutor possua sobre o assunto, do que se supõe serem suas opiniões e convicções, simpatias e antipatias, da relação de afinidade e do grau de familiaridade que se tem, da posição social e hierárquica que se ocupa em relação a ele e vice-versa. Isso tudo pode determinar as escolhas que serão feitas com relação ao gênero no qual o discurso se realizará, à seleção de procedimentos de estruturação e, também, à seleção de recursos lingüísticos. É evidente que, num processo de interlocução, isso nem sempre ocorre de forma deliberada ou de maneira a antecipar-se ao discurso propriamente. Em geral, é durante o processo de produção que essas escolhas são feitas, nem sempre (e nem todas) de maneira consciente.
O discurso, quando produzido, manifesta-se lingüisticamente por meio de textos. Assim, pode-se afirmar que texto é o produto da atividade discursiva oral ou escrita que forma um todo significativo e acabado, qualquer que seja sua extensão. É uma seqüência verbal constituída por um conjunto de relações que se estabelecem a partir da coesão8 e da coerência. Esse conjunto de relações tem sido chamado de textualidade. Dessa forma, um texto só é um texto quando pode ser compreendido como unidade significativa global, quando possui textualidade. Caso contrário, não passa de um amontoado aleatório de enunciados.
O discurso possui um significado amplo: refere-se à atividade comunicativa que é realizada numa determinada situação, abrangendo tanto o conjunto de enunciados que lhe deu origem quanto as condições nas quais foi produzido.
A produção de discursos não acontece no vazio. Ao contrário, todo discurso se relaciona, de alguma forma, com os que já foram produzidos. Nesse sentido, os textos, como resultantes da atividade discursiva, estão em constante e contínua relação uns com os outros. A esta relação entre o texto produzido e os outros textos é que se tem chamado intertextualidade.
Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero. Os vários gêneros existentes, por sua vez, constituem formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura, caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e construção composicional. Pode- se ainda afirmar que a noção de gêneros refere-se a “famílias” de textos que compartilham algumas características comuns, embora heterogêneas, como visão geral da ação à qual o texto se articula, tipo de suporte comunicativo, extensão, grau de literariedade, por exemplo, existindo em número quase ilimitado.
Os gêneros são determinados historicamente. As intenções comunicativas, como parte das condições de produção dos discursos, geram usos sociais que determinam os gêneros que darão forma aos textos. É por isso que, quando um texto começa com “era uma vez”, ninguém duvida de que está diante de um conto, porque todos conhecem tal gênero. Diante da expressão “senhoras e senhores”, a expectativa é ouvir um pronunciamento público ou uma apresentação de espetáculo, pois se sabe que nesses gêneros o texto, inequivocamente, tem essa fórmula inicial. Do mesmo modo, podem-se reconhecer outros gêneros como cartas, reportagens, anúncios, poemas, etc.

APRENDER E ENSINAR LÍNGUA PORTUGUESA NA ESCOLA
Pode-se considerar o ensino e a aprendizagem de Língua Portuguesa na escola como resultantes da articulação de três variáveis: o aluno, a língua e o ensino.
O primeiro elemento dessa tríade, o aluno, é o sujeito da ação de aprender, aquele que age sobre o objeto de conhecimento10. O segundo elemento, o objeto de conhecimento, é a Língua Portuguesa, tal como se fala e se escreve fora da escola, a língua que se fala em instâncias públicas e a que existe nos textos escritos que circulam socialmente. E o terceiro elemento da tríade, o ensino, é, neste enfoque teórico, concebido como a prática educacional que organiza a mediação entre sujeito e objeto do conhecimento. Para que essa mediação aconteça, o professor deverá planejar, implementar e dirigir as atividades didáticas, com o objetivo de desencadear, apoiar e orientar o esforço de ação e reflexão do aluno.
Tem-se observado que a afirmação de que o conhecimento é uma construção do aprendiz vem sendo interpretada de maneira espontaneísta, como se fosse possível que os alunos aprendessem os conteúdos escolares simplesmente por serem expostos a eles. Esse tipo de desinformação — que parece acompanhar a emergência de práticas pedagógicas inovadoras — tem assumido formas que acabam por esvaziar a função do professor.

Diversidade de textos
A importância e o valor dos usos da linguagem são determinados historicamente segundo as demandas sociais de cada momento. Atualmente exigem-se níveis de leitura e de escrita diferentes e muito superiores aos que satisfizeram as demandas sociais até bem pouco tempo atrás — e tudo indica que essa exigência tende a ser crescente. Para a escola, como espaço institucional de acesso ao conhecimento, a necessidade de atender a essa demanda, implica uma revisão substantiva das práticas de ensino que tratam a língua como algo sem vida e os textos como conjunto de regras a serem aprendidas, bem como a constituição de práticas que possibilitem ao aluno aprender linguagem a partir da diversidade de textos que circulam socialmente.
Toda educação verdadeiramente comprometida com o exercício da cidadania precisa criar condições para o desenvolvimento da capacidade de uso eficaz da linguagem que satisfaça necessidades pessoais — que podem estar relacionadas às ações efetivas do cotidiano, à transmissão e busca de informação, ao exercício da reflexão. De modo geral, os textos são produzidos, lidos e ouvidos em razão de finalidades desse tipo. Sem negar a importância dos que respondem a exigências práticas da vida diária, são os textos que favorecem a reflexão crítica e imaginativa, o exercício de formas de pensamento mais elaboradas e abstratas, os mais vitais para a plena participação numa sociedade letrada.
Cabe, portanto, à escola viabilizar o acesso do aluno ao universo dos textos que circulam socialmente, ensinar a produzi-los e a interpretá-los. Isso inclui os textos das diferentes disciplinas, com os quais o aluno se defronta sistematicamente no cotidiano escolar e, mesmo assim, não consegue manejar, pois não há um trabalho planejado com essa finalidade. Um exemplo: nas aulas de Língua Portuguesa, não se ensina a trabalhar com textos expositivos como os das áreas de História, Geografia e Ciências Naturais; e nessas aulas também não, pois considera-se que trabalhar com textos é uma atividade específica da área de Língua Portuguesa. Em conseqüência, o aluno não se torna capaz de utilizar textos cuja finalidade seja compreender um conceito, apresentar uma informação nova, descrever um problema, comparar diferentes pontos de vista, argumentar a favor ou contra uma determinada hipótese ou teoria. E essa capacidade, que permite o acesso à informação escrita com autonomia, é condição para o bom aprendizado, pois dela depende a possibilidade de aprender os diferentes conteúdos. Por isso, todas as disciplinas têm a responsabilidade de ensinar a utilizar os textos de que fazem uso, mas é a de Língua Portuguesa que deve tomar para si o papel de fazê-lo de modo mais sistemático.

Que fala cabe à escola ensinar
A Língua Portuguesa, no Brasil, possui muitas variedades dialetais. Identificam-se geográfica e socialmente as pessoas pela forma como falam. Mas há muitos preconceitos decorrentes do valor social relativo que é atribuído aos diferentes modos de falar: é muito comum se considerarem as variedades lingüísticas de menor prestígio como inferiores ou erradas.
O problema do preconceito disseminado na sociedade em relação às falas dialetais deve ser enfrentado, na escola, como parte do objetivo educacional mais amplo de educação para o respeito à diferença. Para isso, e também para poder ensinar Língua Portuguesa, a escola precisa livrar-se de alguns mitos: o de que existe uma única forma “certa” de falar — a que se parece com a escrita — e o de que a escrita é o espelho da fala — e, sendo assim, seria preciso “consertar” a fala do aluno para evitar que ele escreva errado. Essas duas crenças produziram uma prática de mutilação cultural que, além de desvalorizar a forma de falar do aluno, tratando sua comunidade como se fosse formada por incapazes, denota desconhecimento de que a escrita de uma língua não corresponde inteiramente a nenhum de seus dialetos, por mais prestígio que um deles tenha em um dado momento histórico.
A questão não é falar certo ou errado, mas saber qual forma de fala utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. É saber coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa. É saber, portanto, quais variedades e registros da língua oral são pertinentes em função da intenção comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar adequadamente, é produzir o efeito pretendido. As instituições sociais fazem diferentes usos da linguagem oral: um cientista, um político, um professor, um religioso, um feirante, um repórter, um radialista, enfim, todos aqueles que tomam a palavra para falar em voz alta, utilizam diferentes registros em razão das também diferentes instâncias nas quais essa prática se realiza. A própria condição de aluno exige o domínio de determinados usos da linguagem oral.
Cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral nas diversas situações comunicativas, especialmente nas mais formais: planejamento e realização de entrevistas, debates, seminários, diálogos com autoridades, dramatizações, etc. Trata-se de propor situações didáticas nas quais essas atividades façam sentido de fato, pois seria descabido “treinar” o uso mais formal da fala.
A aprendizagem de procedimentos eficazes tanto de fala como de escuta, em contextos mais formais, dificilmente ocorrerá se a escola não tomar para si a tarefa de promovê-la.

Que escrita cabe à escola ensinar
ALFABETIZAÇÃO E ENSINO DA LÍNGUA
É habitual pensar sobre a área de Língua Portuguesa como se ela fosse um foguete de dois estágios: o primeiro para se soltar da Terra e o segundo para navegar no espaço. O primeiro seria o que já se chamou de “primeiras letras”, hoje alfabetização, e o segundo, aí sim, o estudo da língua propriamente dita.
Durante o primeiro estágio, previsto para durar em geral um ano, o professor deveria ensinar o sistema alfabético de escrita (a correspondência fonográfica) e algumas convenções ortográficas do português — o que garantiria ao aluno a possibilidade de ler e escrever por si mesmo, condição para poder disparar o segundo estágio do metafórico foguete. Esse segundo estágio se desenvolveria em duas linhas básicas: os exercícios de redação e os treinos ortográficos e gramaticais.
O conhecimento atualmente disponível recomenda uma revisão dessa metodologia e aponta para a necessidade de repensar sobre teorias e práticas tão difundidas e estabelecidas, que, para a maioria dos professores, tendem a parecer as únicas possíveis.
Por trás da prática em dois estágios, está a teoria que concebe a capacidade de produzir textos como dependente da capacidade de grafá-los de próprio punho. Na Antiguidade grega, berço de alguns dos mais importantes textos produzidos pela humanidade, o autor era quem compunha e ditava para ser escrito pelo escriba; a colaboração do escriba era transformar os enunciados em marcas gráficas que lhes davam a permanência, uma tarefa menor, e esses artífices pouco contribuíram para a grandeza da filosofia ou do teatro grego.
A compreensão atual da relação entre a aquisição das capacidades de redigir e grafar rompe com a crença arraigada de que o domínio do bê-á-bá seja pré-requisito para o início do ensino de língua e nos mostra que esses dois processos de aprendizagem podem e devem ocorrer de forma simultânea. Um diz respeito à aprendizagem de um conhecimento de natureza notacional: a escrita alfabética; o outro se refere à aprendizagem da linguagem que se usa para escrever.
A conquista da escrita alfabética não garante ao aluno a possibilidade de compreender e produzir textos em linguagem escrita. Essa aprendizagem exige um trabalho pedagógico sistemático.
Quando são lidas histórias ou notícias de jornal para crianças que ainda não sabem ler e escrever convencionalmente, ensina-se a elas como são organizados, na escrita, estes dois gêneros: desde o vocabulário adequado a cada um, até os recursos coesivos que lhes são característicos. Um aluno que produz um texto, ditando-o para que outro escreva, produz um texto escrito, isto é, um texto cuja forma é escrita ainda que a via seja oral. Como o autor grego, o produtor do texto é aquele que cria o discurso, independentemente de grafá-lo ou não. Essa diferenciação é que torna possível uma pedagogia de transmissão oral para ensinar a linguagem que se usa para escrever.
Ensinar a escrever textos torna-se uma tarefa muito difícil fora do convívio com textos verdadeiros, com leitores e escritores verdadeiros e com situações de comunicação que os tornem necessários. Fora da escola escrevem-se textos dirigidos a interlocutores de fato. Todo texto pertence a um determinado gênero, com uma forma própria, que se pode aprender. Quando entram na escola, os textos que circulam socialmente cumprem um papel modelizador, servindo como fonte de referência, repertório textual, suporte da atividade intertextual. A diversidade textual que existe fora da escola pode e deve estar a serviço da expansão do conhecimento letrado do aluno.
Mas a ênfase que se está dando ao conhecimento sobre as características discursivas da linguagem — que hoje sabe-se essencial para a participação no mundo letrado — não significa que a aquisição da escrita alfabética deixe de ser importante. A capacidade de decifrar o escrito é não só condição para a leitura independente como — verdadeiro rito de passagem — um saber de grande valor social.
É preciso ter claro também que as propostas didáticas difundidas a partir de 1985, ao enfatizar o papel da ação e reflexão do aluno no processo de alfabetização, não sugerem (como parece ter sido entendido por alguns) uma abordagem espontaneísta da alfabetização escolar; ao contrário, o conhecimento dos caminhos percorridos pelo aluno favorece a intervenção pedagógica e não a omissão, pois permite ao professor ajustar a informação oferecida às condições de interpretação em cada momento do processo. Permite também considerar os erros cometidos pelo aluno como pistas para guiar sua prática, para torná-la menos genérica e mais eficaz.
A alfabetização, considerada em seu sentido restrito de aquisição da escrita alfabética, ocorre dentro de um processo mais amplo de aprendizagem da Língua Portuguesa. Esse enfoque coloca necessariamente um novo papel para o professor das séries iniciais: o de professor de Língua Portuguesa.

O TEXTO COMO UNIDADE DE ENSINO
O ensino da Língua Portuguesa tem sido marcado por uma sequenciação de conteúdos que se poderia chamar de aditiva: ensina-se a juntar sílabas (ou letras) para formar palavras, a juntar palavras para formar frases e a juntar frases para formar textos.
Essa abordagem aditiva levou a escola a trabalhar com “textos” que só servem para ensinar a ler. “Textos” que não existem fora da escola e, como os escritos das cartilhas, em geral, nem sequer podem ser considerados textos, pois não passam de simples agregados de frases.
Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é possível tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a palavra, nem a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a competência discursiva, que é questão central.
Dentro desse marco, a unidade básica de ensino só pode ser o texto, mas isso não significa que não se enfoquem palavras ou frases nas situações didáticas específicas que o exijam.
Um texto não se define por sua extensão. O nome que assina um desenho, a lista do que deve ser comprado, um conto ou um romance, todos são textos. A palavra “pare”, pintada no asfalto em um cruzamento, é um texto cuja extensão é a de uma palavra. O mesmo “pare”, numa lista de palavras começadas com “p”, proposta pelo professor, não é nem um texto nem parte de um texto, pois não se insere em nenhuma situação comunicativa de fato.
Analisando os textos que costumam ser considerados adequados para os leitores iniciantes, novamente aparece a confusão entre a capacidade de interpretar e produzir discurso e a capacidade de ler sozinho e escrever de próprio punho. Ao aluno são oferecidos textos curtos, de poucas frases, simplificados, às vezes, até o limite da indigência.
Essa visão do que seja um texto adequado ao leitor iniciante transbordou os limites da escola e influiu até na produção editorial: livros com uma ou duas frases por página e a preocupação de evitar as chamadas “sílabas complexas”. A possibilidade de se divertir, de se comover, de fruir esteticamente num texto desse tipo é, no mínimo, remota. Por trás da boa intenção de promover a aproximação entre crianças e textos há um equívoco de origem: tenta-se aproximar os textos das crianças — simplificando-os —, no lugar de aproximar as crianças dos textos de qualidade.
Não se formam bons leitores oferecendo materiais de leitura empobrecidos, justamente no momento em que as crianças são iniciadas no mundo da escrita. As pessoas aprendem a gostar de ler quando, de alguma forma, a qualidade de suas vidas melhora com a leitura.

A ESPECIFICIDADE DO TEXTO LITERÁRIO
É importante que o trabalho com o texto literário esteja incorporado às práticas cotidianas da sala de aula, visto tratar-se de uma forma específica de conhecimento. Essa variável de constituição da experiência humana possui propriedades compositivas que devem ser mostradas, discutidas e consideradas quando se trata de ler as diferentes manifestações colocadas sob a rubrica geral de texto literário.
A literatura não é cópia do real, nem puro exercício de linguagem, tampouco mera fantasia que se asilou dos sentidos do mundo e da história dos homens. Se tomada como uma maneira particular de compor o conhecimento, é necessário reconhecer que sua relação com o real é indireta.
Ou seja, o plano da realidade pode ser apropriado e transgredido pelo plano do imaginário como uma instância concretamente formulada pela mediação dos signos verbais (ou mesmo não-verbais, conforme algumas manifestações da poesia contemporânea). Pensar sobre a literatura a partir dessa autonomia relativa ante o real implica dizer que se está diante de um inusitado tipo de diálogo regido por jogos de aproximações e afastamentos, em que as invenções de linguagem, a expressão das subjetividades, o trânsito das sensações, os mecanismos ficcionais podem estar misturados a procedimentos racionalizantes, referências indiciais, citações do cotidiano do mundo dos homens.
A questão do ensino da literatura ou da leitura literária envolve, portanto, esse exercício de reconhecimento das singularidades e das propriedades compositivas que matizam um tipo particular de escrita. Com isso, é possível afastar uma série de equívocos que costumam estar presentes na escola em relação aos textos literários, ou seja, tratá-los como expedientes para servir ao ensino das boas maneiras, dos hábitos de higiene, dos deveres do cidadão, dos tópicos gramaticais, das receitas desgastadas do “prazer do texto”, etc. Postos de forma descontextualizada, tais procedimentos pouco ou nada contribuem para a formação de leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias.

A prática de reflexão sobre a língua
Quando se pensa e se fala sobre a linguagem mesma, realiza-se uma atividade de natureza reflexiva, uma atividade de análise lingüística. Essa reflexão é fundamental para a expansão da capacidade de produzir e interpretar textos. É uma entre as muitas ações que alguém considerado letrado é capaz de realizar com a língua.
A análise lingüística refere-se a atividades que se pode classificar em epilingüísticas e metalingüísticas. Ambas são atividades de reflexão sobre a língua, mas se diferenciam nos seus fins.
Nas atividades epilingüísticas a reflexão está voltada para o uso, no próprio interior da atividade lingüística em que se realiza. Um exemplo disso é quando, no meio de uma conversa um dos interlocutores pergunta ao outro “O que você quis dizer com isso?”, ou “Acho que essa palavra não é a mais adequada para dizer isso. Que tal...?”, ou ainda “Na falta de uma palavra melhor,então vai essa mesma”. Em se tratando do ensino de língua, à diferença das situações de interlocução naturais, faz-se necessário o planejamento de situações didáticas que possibilitem a reflexão sobre os recursos expressivos utilizados pelo produtor/autor do texto — quer esses recursos se refiram a aspectos gramaticais, quer a aspectos envolvidos na estruturação dos discursos —, sem que a preocupação seja a categorização, a classificação ou o levantamento de regularidades sobre essas questões.
Já as atividades metalingüísticas estão relacionadas a um tipo de análise voltada para a descrição, por meio da categorização e sistematização dos elementos lingüísticos. Essas atividades, portanto, não estão propriamente vinculadas ao processo discursivo; trata-se da utilização (ou da construção) de uma metalinguagem que possibilite falar sobre a língua. Quando parte integrante de uma situação didática, a atividade metalingüística desenvolve-se no sentido de possibilitar ao aluno o levantamento de regularidades de aspectos da língua, a sistematização e a classificação de suas características específicas. Assim, para que se possa discutir a acentuação gráfica, por exemplo, é necessário que alguns aspectos da língua — tais como a tonicidade, a forma pela qual é marcada nas palavras impressas, a classificação das palavras quanto a esse aspecto e ao número de sílabas, a conceituação de ditongo e hiato, entre outros — sejam sistematizados na forma de uma metalinguagem específica que favoreça o levantamento de regularidades e a elaboração de regras de acentuação.
O ensino de Língua Portuguesa, pelo que se pode observar em suas práticas habituais, tende a tratar essa fala da e sobre a linguagem como se fosse um conteúdo em si, não como um meio para melhorar a qualidade da produção lingüística. É o caso, por exemplo, da gramática que, ensinada de forma descontextualizada, tornou-se emblemática de um conteúdo estritamente escolar, do tipo que só serve para ir bem na prova e passar de ano — uma prática pedagógica que vai da metalíngua para a língua por meio de exemplificação, exercícios de reconhecimento e memorização de nomenclatura. Em função disso, tem-se discutido se há ou não necessidade de ensinar gramática.
Mas essa é uma falsa questão: a questão verdadeira é para que e como ensiná-la. Se o objetivo principal do trabalho de análise e reflexão sobre a língua é imprimir maior qualidade ao uso da linguagem, as situações didáticas devem, principalmente nos primeiros ciclos, centrar-se na atividade epilingüística, na reflexão sobre a língua em situações de produção e interpretação, como caminho para tomar consciência e aprimorar o controle sobre a própria produção lingüística. E, a partir daí, introduzir progressivamente os elementos para uma análise de natureza metalingüística. O lugar natural, na sala de aula, para esse tipo de prática parece ser a reflexão compartilhada sobre textos reais.

OBJETIVOS GERAIS DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL

Ao longo dos oito anos do ensino fundamental, espera-se que os alunos adquiram progressivamente uma competência em relação à linguagem que lhes possibilite resolver problemas da vida cotidiana, ter acesso aos bens culturais e alcançar a participação plena no mundo letrado.
Para que essa expectativa se concretize, o ensino de Língua Portuguesa deverá organizar-se de modo que os alunos sejam capazes de:
• expandir o uso da linguagem em instâncias privadas e utilizá-la com eficácia em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos — tanto orais como escritos — coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos objetivos a que se propõem e aos assuntos tratados;
• utilizar diferentes registros, inclusive os mais formais da variedade lingüística valorizada socialmente, sabendo adequá-los às circunstâncias da situação comunicativa de que participam;
• conhecer e respeitar as diferentes variedades lingüísticas do português falado;
• compreender os textos orais e escritos com os quais se defrontam em diferentes situações de participação social, interpretando-os corretamente e inferindo as intenções de quem os produz;
• valorizar a leitura como fonte de informação, via de acesso aos mundos criados pela literatura e possibilidade de fruição estética, sendo capazes de recorrer aos materiais escritos em função de diferentes objetivos;
• utilizar a linguagem como instrumento de aprendizagem, sabendo como proceder para ter acesso, compreender e fazer uso de informações contidas nos textos: identificar aspectos relevantes; organizar notas; elaborar roteiros; compor textos coerentes a partir de trechos oriundos de diferentes fontes; fazer resumos, índices, esquemas, etc.;
• valer-se da linguagem para melhorar a qualidade de suas relações pessoais, sendo capazes de expressar seus sentimentos, experiências, idéias e opiniões, bem como de acolher, interpretar e considerar os dos outros, contrapondo-os quando necessário;
• usar os conhecimentos adquiridos por meio da prática de reflexão sobre a língua para expandirem as possibilidades de uso da linguagem e a capacidade de análise crítica;
• conhecer e analisar criticamente os usos da língua como veículo de valores e preconceitos de classe, credo, gênero ou etnia.

OS CONTEÚDOS DE LÍNGUA PORTUGUESA NO ENSINO FUNDAMENTAL
Caracterização geral e eixos organizadores
O estabelecimento de eixos organizadores dos conteúdos de Língua Portuguesa no ensino fundamental parte do pressuposto que a língua se realiza no uso, nas práticas sociais; que os indivíduos se apropriam dos conteúdos, transformando-os em conhecimento próprio, por meio da ação sobre eles; que é importante que o indivíduo possa expandir sua capacidade de uso da língua e adquirir outras que não possui em situações lingüisticamente significativas, situações de uso de fato.
A linguagem verbal, atividade discursiva que é, tem como resultado textos orais ou escritos. Textos que são produzidos para serem compreendidos. Os processos de produção e compreensão, por sua vez, se desdobram respectivamente em atividades de fala e escrita, leitura e escuta. Quando se afirma, portanto, que a finalidade do ensino de Língua Portuguesa é a expansão das possibilidades do uso da linguagem, assume-se que as capacidades a serem desenvolvidas estão relacionadas às quatro habilidades lingüísticas básicas: falar, escutar, ler e escrever.
Disso decorre que os conteúdos de Língua Portuguesa no ensino fundamental devam ser selecionados em função do desenvolvimento dessas habilidades e organizados em torno de dois eixos básicos: o uso da língua oral e escrita e a análise e reflexão sobre a língua, conforme demonstra o quadro dos blocos de conteúdo:
Língua oral: Língua escrita: usos e formas usos e formas
Análise e reflexão sobre a língua
O bloco de conteúdos “Língua escrita: usos e formas” subdivide-se em “Prática de leitura” e “Prática de produção de texto”, que, por sua vez, se desdobra em “Aspectos discursivos” e “Aspectos notacionais”.
A maioria dos guias curriculares em vigor já não organiza os conteúdos de Língua Portuguesa em alfabetização, ortografia, pontuação, leitura em voz alta, interpretação de texto, redação e gramática, mas, na prática da sala de aula, essa estruturação é a que ainda prevalece. Esses conteúdos também são propostos neste documento, mas estão organizados em função do eixo USO→REFLEXÃO→USO. Aparecem, portanto, como “Prática de leitura”, “Prática de produção de texto” e “Análise e reflexão sobre a língua”.


Seqüência e organização dos conteúdos
A organização dos conteúdos de Língua Portuguesa em função do eixo USO→REFLEXÃO→USO pressupõe um tratamento cíclico, pois, de modo geral, os mesmos conteúdos aparecem ao longo de toda a escolaridade, variando apenas o grau de aprofundamento e sistematização. Para garantir esse tratamento cíclico é preciso seqüenciar os conteúdos segundo critérios que possibilitem a continuidade das aprendizagens. São eles:
• considerar os conhecimentos anteriores dos alunos em relação ao que se pretende ensinar, identificando até que ponto os conteúdos ensinados foram realmente aprendidos;
• considerar o nível de complexidade dos diferentes conteúdos como definidor do grau de autonomia possível aos alunos, na realização das atividades, nos diferentes ciclos;
• considerar o nível de aprofundamento possível de cada conteúdo, em função das possibilidades de compreensão dos alunos nos diferentes momentos do seu processo de aprendizagem.
É fundamental que esses critérios sejam utilizados de maneira articulada, de tal forma que, em cada escola, se possa organizar uma seqüência de conteúdos que favoreça a aprendizagem da melhor maneira possível. Portanto, este documento indica critérios, mas a sequenciação dos conteúdos de ensino dentro de cada ciclo é responsabilidade da escola.

Os conteúdos de Língua Portuguesa e os Temas Transversais
A transversalidade em Língua Portuguesa pode ser abordada a partir de duas questões nucleares: o fato de a língua ser um veículo de representações, concepções e valores socioculturais e o seu caráter de instrumento de intervenção social.
Os temas transversais (Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual), por tratarem de questões sociais, pertencem à dimensão do espaço público e, portanto, necessitam de participação efetiva e responsável dos cidadãos na sua gestão, manutenção e transformação. Todos eles demandam tanto a capacidade de análise crítica e reflexão sobre valores e concepções quanto a capacidade de participação. Não cabe a este documento indicar quais devam ser os projetos de estudo ou os textos a serem trabalhados na sala de aula; o que aqui se faz são sugestões e referências para que as equipes das escolas possam planejar suas propostas. Recomenda-se que não se deixe de incluí-los, sob nenhum pretexto, nos critérios de eleição de princípios metodológicos, de projetos de estudo e de textos a serem oferecidos aos alunos.
Há conteúdos que podem ser trabalhados em situações de reflexão sobre a língua, com o objetivo de conhecer e analisar criticamente os usos da língua como veículo de valores e preconceitos de classe, credo, gênero e etnia, explicitando, por exemplo, a forma tendenciosa com que certos textos tratam questões sociais e étnicas, as discriminações veiculadas por meio de campanhas de saúde, os valores e as concepções difundidos pela publicidade, etc. Nesse sentido, a área de Língua Portuguesa oferece inúmeras possibilidades de trabalho com os temas transversais, uma vez que está presente em todas as situações de ensino e aprendizagem e serve de instrumento de produção de conhecimentos em todas as áreas e temas.
Os objetivos de Língua Portuguesa salientam também a necessidade de os cidadãos desenvolverem sua capacidade de compreender textos orais e escritos, de assumir a palavra e produzir textos, em situações de participação social. Ao propor que se ensine aos alunos o uso das diferentes formas de linguagem verbal (oral e escrita), busca-se o desenvolvimento da capacidade de atuação construtiva e transformadora. O domínio do diálogo na explicitação, discussão, contraposição e argumentação de idéias é fundamental na aprendizagem da cooperação e no desenvolvimento de atitude de autoconfiança, de capacidade para interagir e de respeito ao outro. A aprendizagem precisa então estar inserida em ações reais de intervenção, a começar pelo âmbito da própria escola.
Os conteúdos dos temas transversais, assim como as práticas pedagógicas organizadas em função da sua aprendizagem, podem contextualizar significativamente a aprendizagem da língua, fazendo com que o trabalho dos alunos reverta em produções de interesse do convívio escolar e da comunidade. Há inúmeras situações possíveis: produção e distribuição de livros, jornais ou quadrinhos, veiculando informações sobre os temas estudados; murais, seminários, palestras e panfletos de orientação como parte de companhas para o uso racional dos recursos naturais e para a prevenção de doenças que afetam a comunidade; folhetos instrucionais sobre primeiros socorros; cartazes com os direitos humanos, da criança, do consumidor, etc.

Os blocos de conteúdos e o tratamento didático
CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO TRATAMENTO DIDÁTICO DOS CONTEÚDOS
A seguir são apresentados alguns princípios e orientações para o trabalho didático com os conteúdos, visando o alcance dos objetivos propostos para a área.
Parte-se da concepção de que determinados objetivos só podem ser conquistados se os conteúdos tiverem um tratamento didático específico, ou seja, há uma estreita relação entre o que e como ensinar. Mais do que isso: parte-se do pressuposto de que a própria definição dos conteúdos é uma questão didática que tem direta relação com os objetivos colocados.
Um exemplo: se o objetivo é que os alunos tenham uma atitude crítica em relação à sua própria produção de textos, o conteúdo a ser ensinado deverá ser procedimentos de revisão dos textos que produzem. A seleção desse tipo de conteúdo já traz, em si, um componente didático, pois ensinar a revisar é completamente diferente de ensinar a passar a limpo um texto corrigido pelo professor. No entanto, mesmo assim, ensinar a revisar é algo que depende de se saber articular o necessário (em função do que se pretende) e o possível (em função do que os alunos realmente conseguem aprender num dado momento). Considerar o conhecimento prévio do aluno é um princípio didático para todo professor que pretende ensinar procedimentos de revisão quando o objetivo é — muito mais do que a qualidade da produção — a atitude crítica diante do próprio texto.
Assim, o critério de organização dos conteúdos de Língua Portuguesa em termos de USO→REFLEXÃO→USO, de certa forma, define também o eixo didático, a linha geral de tratamentodos conteúdos. Caracteriza um movimento metodológico de AÇÃO→REFLEXÃO→AÇÃO, em que se pretende que, progressivamente, a reflexão se incorpore às atividades lingüísticas do aluno de tal forma que ele tenha capacidade de monitorá-las com eficácia.
Quando se pretende que o aluno construa conhecimento, a questão não é apenas qual informação deve ser oferecida, mas, principalmente, que tipo de tratamento deve ser dado à informação que se oferece. A questão é então de natureza didática. Nesse sentido, a intervenção pedagógica do professor tem valor decisivo no processo de aprendizagem e, por isso, é preciso avaliar sistematicamente se ela está adequada, se está contribuindo para as aprendizagens que se espera a l c a n ç a r .
Em se tratando da área de Língua Portuguesa, o professor também terá outro papel fundamental: o de modelo. Além de ser aquele que ensina os conteúdos, é alguém que pode ensinar o valor que a língua tem, demonstrando o valor que tem para si. Se é um usuário da escrita de fato, se tem boa e prazerosa relação com a leitura, se gosta verdadeiramente de escrever, funcionará como um excelente modelo para seus alunos. Isso é especialmente importante quando eles provêm de comunidades pouco letradas, onde não participam de atos de leitura e escrita junto com adultos experientes. Nesse caso, muito provavelmente, o professor será a única referência.

LÍNGUA ORAL: USOS E FORMAS
Não é papel da escola ensinar o aluno a falar: isso é algo que a criança aprende muito antes da idade escolar. Talvez por isso, a escola não tenha tomado para si a tarefa de ensinar quaisquer usos e formas da língua oral. Quando o fez, foi de maneira inadequada: tentou corrigir a fala “errada” dos alunos — por não ser coincidente com a variedade lingüística de prestígio social —, com a esperança de evitar que escrevessem errado. Reforçou assim o preconceito contra aqueles que falam diferente da variedade prestigiada.
Expressar-se oralmente é algo que requer confiança em si mesmo. Isso se conquista em ambientes favoráveis à manifestação do que se pensa, do que se sente, do que se é. Assim, o desenvolvimento da capacidade de expressão oral do aluno depende consideravelmente de a escola constituir-se num ambiente que respeite e acolha a vez e a voz, a diferença e a diversidade. Mas, sobretudo, depende de a escola ensinar-lhe os usos da língua adequados a diferentes situações comunicativas. De nada adianta aceitar o aluno como ele é mas não lhe oferecer instrumentos para enfrentar situações em que não será aceito se reproduzir as formas de expressão próprias de sua comunidade. É preciso, portanto, ensinar-lhe a utilizar adequadamente a linguagem em instâncias públicas, a fazer uso da língua oral de forma cada vez mais competente.
As situações de comunicação diferenciam-se conforme o grau de formalidade que exigem. E isso é algo que depende do assunto tratado, da relação entre os interlocutores e da intenção comunicativa. A capacidade de uso da língua oral que as crianças possuem ao ingressar na escola foi adquirida no espaço privado: contextos comunicativos informais, coloquiais, familiares. Ainda que, de certa forma, boa parte dessas situações também tenha lugar no espaço escolar, não se trata de reproduzi-las para ensinar aos alunos o que já sabem. Considerar objeto de ensino escolar a língua que elas já falam requer, portanto, a explicitação do que se deve ensinar e de como fazê-lo.
Eleger a língua oral como conteúdo escolar exige o planejamento da ação pedagógica de forma a garantir, na sala de aula, atividades sistemáticas de fala, escuta e reflexão sobre a língua. São essas situações que podem se converter em boas situações de aprendizagem sobre os usos e as formas da língua oral: atividades de produção e interpretação de uma ampla variedade de textos orais, de observação de diferentes usos, de reflexão sobre os recursos que a língua oferece para alcançar diferentes finalidades comunicativas. Para isso, é necessário diversificar as situações propostas tanto em relação ao tipo de assunto como em relação aos aspectos formais e ao tipo de atividade que demandam — fala, escuta e/ou reflexão sobre a língua. Supõe também um profundo respeito pelas formas de expressão oral trazidas pelos alunos, de suas comunidades, e um grande empenho por ensinar-lhes o exercício da adequação aos contextos comunicativos, diante de diferentes interlocutores, a partir de intenções de natureza diversa. É fundamental que essa tarefa didática se organize de tal maneira que os alunos transitem das situações mais informais e coloquiais que já dominam ao entrar na escola a outras mais estruturadas e formais, para que possam conhecer seus modos de funcionamento e aprender a utilizá-las.
Não basta deixar que as crianças falem; apenas o falar cotidiano e a exposição ao falar alheio não garantem a aprendizagem necessária. É preciso que as atividades de uso e as de reflexão sobre a língua oral estejam contextualizadas em projetos de estudo, quer sejam da área de Língua Portuguesa, quer sejam das demais áreas do conhecimento. A linguagem tem um importante papel no processo de ensino, pois atravessa todas as áreas do conhecimento, mas o contrário também vale: as atividades relacionadas às diferentes áreas são, por sua vez, fundamentais para a realização de aprendizagens de natureza lingüística.
A produção oral pode acontecer nas mais diversas circunstâncias, dentro dos mais diversos projetos:
• atividades em grupo que envolvam o planejamento e realização de pesquisas e requeiram a definição de temas, a tomada de decisões sobre encaminhamentos, a divisão de tarefas, a apresentação de resultados;
• atividades de resolução de problemas que exijam estimativa de resultados possíveis, verbalização, comparação e confronto de procedimentos empregados;
• atividades de produção oral de planejamento de um texto, de elaboração propriamente e de análise de sua qualidade;
• atividades dos mais variados tipos, mas que tenham sempre sentido de comunicação de fato: exposição oral, sobre temas estudados apenas por quem expõe; descrição do funcionamento de aparelhos e equipamentos em situações onde isso se faça necessário; narração de acontecimentos e fatos conhecidos apenas por quem narra, etc. Esse tipo de tarefa requer preparação prévia, considerando o nível de conhecimento do interlocutor e, se feita em grupo, a coordenação da fala própria com a dos colegas — dois procedimentos complexos que raramente se aprendem sem ajuda.
A exposição oral ocorre tradicionalmente a partir da quinta série, por meio das chamadas apresentações de trabalho, cuja finalidade é a exposição de temas estudados. Em geral o procedimento de expor oralmente em público não costuma ser ensinado. Possivelmente por se imaginar que a boa exposição oral decorra de outros procedimentos já dominados (como falar e estudar). No entanto, o texto expositivo — tanto oral como escrito — é um dos que maiores dificuldades apresenta, tanto ao produtor como ao destinatário. Assim, é importante que as situações de exposição oral freqüentem os projetos de estudo e sejam ensinadas desde as séries iniciais, intensificando-se posteriormente.
A preparação e a realização de atividades e projetos que incluam a exposição oral permitem a articulação de conteúdos de língua oral e escrita (escrever o roteiro da fala, falar a partir do roteiro, etc.). Além disso, esse tipo de atividade representa um espaço privilegiado de intersecção entre diferentes áreas do conhecimento, pois são os assuntos estudados nas demais áreas que darão sentido às atividades de exposição oral em seminários.
O trabalho com linguagem oral deve acontecer no interior de atividades significativas: seminários, dramatização de textos teatrais, simulação de programas de rádio e televisão, de discursos políticos e de outros usos públicos da língua oral. Só em atividades desse tipo é possível dar sentido e função ao trabalho com aspectos como entonação, dicção, gesto e postura que, no caso da linguagem oral, têm papel complementar para conferir sentido aos textos.
Além das atividades de produção é preciso organizar situações contextualizadas de escuta, em que ouvir atentamente faça sentido para alguma tarefa que se tenha que realizar ou simplesmente porque o conteúdo valha a pena. Propostas desse tipo requerem a explicação prévia dos seus objetivos, a antecipação de certas dificuldades que podem ocorrer, a apresentação de pistas que possam contribuir para a compreensão, a explicitação das atitudes esperadas pelo professor ao longo da atividade, do tempo aproximado de realização e de outros aspectos que se façam necessários.
Mais do que isso, é preciso, às vezes, criar um ambiente que convide à escuta atenta e mobilize a expectativa: é o caso, por exemplo, dos momentos de contar histórias ou relatos (o professor ou os próprios alunos). A escuta e demais regras do intercâmbio comunicativo devem ser aprendidas em contextos significativos, nos quais ficar quieto, esperar a vez de falar e respeitar a fala do outro tenham função e sentido, e não sejam apenas solicitações ou exigências do professor.

LÍNGUA ESCRITA: USOS E FORMAS
Apesar de apresentadas como dois sub-blocos, é necessário que se compreenda que leitura e escrita são práticas complementares, fortemente relacionadas, que se modificam mutuamente no processo de letramento — a escrita transforma a fala (a constituição da “fala letrada”) e a fala influencia a escrita (o aparecimento de “traços da oralidade” nos textos escritos). São práticas que permitem ao aluno construir seu conhecimento sobre os diferentes gêneros, sobre os procedimentos mais adequados para lê-los e escrevê-los e sobre as circunstâncias de uso da escrita.
A relação que se estabelece entre leitura e escrita, entre o papel de leitor e de escritor, no entanto, não é mecânica: alguém que lê muito não é, automaticamente, alguém que escreve bem.
Pode-se dizer que existe uma grande possibilidade de que assim seja. É nesse contexto — considerando que o ensino deve ter como meta formar leitores que sejam também capazes de produzir textos coerentes, coesos, adequados e ortograficamente escritos — que a relação entre essas duas atividades deve ser compreendida.

Prática de leitura
O trabalho com leitura tem como finalidade a formação de leitores competentes e, consequentemente, a formação de escritores, pois a possibilidade de produzir textos eficazes tem sua origem na prática de leitura, espaço de construção da intertextualidade e fonte de referências modelizadoras. A leitura, por um lado, nos fornece a matéria-prima para a escrita: o que escrever. Por outro, contribui para a constituição de modelos: como escrever.
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema de escrita, etc. Não se trata simplesmente de extrair informação da escrita, decodificando-a letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura propriamente dita. Qualquer leitor experiente que conseguir analisar sua própria leitura constatará que a decodificação é apenas um dos procedimentos que utiliza quando lê: a leitura fluente envolve uma série de outras estratégias como seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível rapidez e proficiência28 . É o uso desses procedimentos que permite controlar o que vai sendo lido, tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, arriscar-se diante do desconhecido, buscar no texto a comprovação das suposições feitas, etc.
Um leitor competente é alguém que, por iniciativa própria, é capaz de selecionar, dentre os trechos que circulam socialmente, aqueles que podem atender a uma necessidade sua. Que consegue utilizar estratégias de leitura adequada para abordá-los de forma a atender a essa necessidade.
Formar um leitor competente supõe formar alguém que compreenda o que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser atribuídos a um texto; que consiga justificar e validar a sua leitura a partir da localização de elementos discursivos.
Um leitor competente só pode constituir-se mediante uma prática constante de leitura de textos de fato, a partir de um trabalho que deve se organizar em torno da diversidade de textos que circulam socialmente. Esse trabalho pode envolver todos os alunos, inclusive aqueles que ainda não sabem ler convencionalmente.

TRATAMENTO DIDÁTICO
A leitura na escola tem sido, fundamentalmente, um objeto de ensino. Para que possa constituir também objeto de aprendizagem, é necessário que faça sentido para o aluno, isto é, a atividade de leitura deve responder, do seu ponto de vista, a objetivos de realização imediata. Como se trata de uma prática social complexa, se a escola pretende converter a leitura em objeto de aprendizagem deve preservar sua natureza e sua complexidade, sem descaracterizá-la. Isso significa trabalhar com a diversidade de textos e de combinações entre eles. Significa trabalhar com a diversidade de objetivos e modalidades que caracterizam a leitura, ou seja, os diferentes “para quês” — resolver um problema prático, informar-se, divertir-se, estudar, escrever ou revisar o próprio texto — e com as diferentes formas de leitura em função de diferentes objetivos e gêneros: ler buscando as informações relevantes, ou o significado implícito nas entrelinhas, ou dados para a solução de um problema.
Se o objetivo é formar cidadãos capazes de compreender os diferentes textos com os quais se defrontam, é preciso organizar o trabalho educativo para que experimentem e aprendam isso na escola. Principalmente quando os alunos não têm contato sistemático com bons materiais de leitura e com adultos leitores, quando não participam de práticas onde ler é indispensável, a escola deve oferecer materiais de qualidade, modelos de leitores proficientes e práticas de leitura eficazes.
Essa pode ser a única oportunidade de esses alunos interagirem significativamente com textos cuja finalidade não seja apenas a resolução de pequenos problemas do cotidiano. É preciso, portanto, oferecer-lhes os textos do mundo: não se formam bons leitores solicitando aos alunos que leiam apenas durante as atividades na sala de aula, apenas no livro didático, apenas porque o professor pede. Eis a primeira e talvez a mais importante estratégia didática para a prática de leitura: o trabalho com a diversidade textual. Sem ela pode-se até ensinar a ler, mas certamente não se formarão leitores competentes.

APRENDIZADO INICIAL DA LEITURA
É preciso superar algumas concepções sobre o aprendizado inicial da leitura. A principal delas é a de que ler é simplesmente decodificar, converter letras em sons, sendo a compreensão conseqüência natural dessa ação. Por conta desta concepção equivocada a escola vem produzindo grande quantidade de “leitores” capazes de decodificar qualquer texto, mas com enormes dificuldades para compreender o que tentam ler.
O conhecimento atualmente disponível a respeito do processo de leitura indica que não se deve ensinar a ler por meio de práticas centradas na decodificação. Ao contrário, é preciso oferecer aos alunos inúmeras oportunidades de aprenderem a ler usando os procedimentos que os bons leitores utilizam. É preciso que antecipem, que façam inferências a partir do contexto ou do conhecimento prévio que possuem, que verifiquem suas suposições — tanto em relação à escrita, propriamente, quanto ao significado. É disso que se está falando quando se diz que é preciso “aprender a ler, lendo”: de adquirir o conhecimento da correspondência fonográfica, de compreender a natureza e o funcionamento do sistema alfabético, dentro de uma prática ampla de leitura. Para aprender a ler, é preciso que o aluno se defronte com os escritos que utilizaria se soubesse mesmo ler — com os textos de verdade, portanto. Os materiais feitos exclusivamente para ensinar a ler não são bons para aprender a ler: têm servido apenas para ensinar a decodificar, contribuindo para que o aluno construa uma visão empobrecida da leitura.
De certa forma, é preciso agir como se o aluno já soubesse aquilo que deve aprender. Entre a condição de destinatário de textos escritos e a falta de habilidade temporária para ler autonomamente é que reside a possibilidade de, com a ajuda dos já leitores, aprender a ler pela prática da leitura. Trata-se de uma situação na qual é necessário que o aluno ponha em jogo tudo que sabe para descobrir o que não sabe, portanto, uma situação de aprendizagem. Essa circunstância requer do aluno uma atividade reflexiva que, por sua vez, favorece a evolução de suas estratégias de resolução das questões apresentadas pelos textos.
Essa atividade só poderá ser realizada com a intervenção do professor, que deverá colocar- se na situação de principal parceiro, agrupar seus alunos de forma a favorecer a circulação de informações entre eles, procurar garantir que a heterogeneidade do grupo seja um instrumento a serviço da troca, da colaboração e, conseqüentemente, da própria aprendizagem, sobretudo em classes numerosas nas quais não é possível atender a todos os alunos da mesma forma e ao mesmo tempo. A heterogeneidade do grupo, se pedagogicamente bem explorada, desempenha a função adicional de permitir que o professor não seja o único informante da turma.
Para aprender a ler, portanto, é preciso interagir com a diversidade de textos escritos, testemunhar a utilização que os já leitores fazem deles e participar de atos de leitura de fato; é preciso negociar o conhecimento que já se tem e o que é apresentado pelo texto, o que está atrás e diante dos olhos, recebendo incentivo e ajuda de leitores experientes.
A leitura, como prática social, é sempre um meio, nunca um fim. Ler é resposta a um objetivo, a uma necessidade pessoal. Fora da escola, não se lê só para aprender a ler, não se lê de uma única forma, não se decodifica palavra por palavra, não se responde a perguntas de verificação do entendimento preenchendo fichas exaustivas, não se faz desenho sobre o que mais gostou e raramente se lê em voz alta. Isso não significa que na escola não se possa eventualmente responder a perguntas sobre a leitura, de vez em quando desenhar o que o texto lido sugere, ou ler em voz alta quando necessário. No entanto, uma prática constante de leitura não significa a repetição infindável dessas atividades escolares.
Uma prática constante de leitura na escola pressupõe o trabalho com a diversidade de objetivos, modalidades e textos que caracterizam as práticas de leitura de fato. Diferentes objetivos exigem diferentes textos e, cada qual, por sua vez, exige uma modalidade de leitura. Há textos que podem ser lidos apenas por partes, buscando-se a informação necessária; outros precisam ser lidos exaustivamente e várias vezes. Há textos que se pode ler rapidamente, outros devem ser lidos devagar. Há leituras em que é necessário controlar atentamente a compreensão, voltando atrás para certificar-se do entendimento; outras em que se segue adiante sem dificuldade, entregue apenas ao prazer de ler. Há leituras que requerem um enorme esforço intelectual e, a despeito disso, se deseja ler sem parar; outras em que o esforço é mínimo e, mesmo assim, o desejo é deixa- las para depois.
Uma prática constante de leitura na escola deve admitir várias leituras, pois outra concepção que deve ser superada é a do mito da interpretação única, fruto do pressuposto de que o significado está dado no texto. O significado, no entanto, constrói-se pelo esforço de interpretação do leitor, a partir não só do que está escrito, mas do conhecimento que traz para o texto. É necessário que o professor tente compreender o que há por trás dos diferentes sentidos atribuídos pelos alunos aos textos: às vezes é porque o autor “jogou com as palavras” para provocar interpretações múltiplas; às vezes é porque o texto é difícil ou confuso; às vezes é porque o leitor tem pouco conhecimento sobre o assunto tratado e, a despeito do seu esforço, compreende mal. Há textos nos quais as diferentes interpretações fazem sentido e são mesmo necessárias: é o caso de bons textos literários.
Há outros que não: textos instrucionais, enunciados de atividades e problemas matemáticos, por exemplo, só cumprem suas finalidades se houver compreensão do que deve ser feito.
Para tornar os alunos bons leitores — para desenvolver, muito mais do que a capacidade de ler, o gosto e o compromisso com a leitura —, a escola terá de mobilizá-los internamente, pois aprender a ler (e também ler para aprender) requer esforço. Precisará fazê-los achar que a leitura é algo interessante e desafiador, algo que, conquistado plenamente, dará autonomia e independência. Precisará torná-los confiantes, condição para poderem se desafiar a “aprender fazendo”. Uma prática de leitura que não desperte e cultive o desejo de ler não é uma prática pedagógica eficiente.
Formar leitores é algo que requer, portanto, condições favoráveis para a prática de leitura — que não se restringem apenas aos recursos materiais disponíveis, pois, na verdade, o uso que se faz dos livros e demais materiais impressos é o aspecto mais determinante para o desenvolvimento da prática e do gosto pela leitura. Algumas dessas condições:
• dispor de uma boa biblioteca na escola;
• dispor, nos ciclos iniciais, de um acervo de classe com livros e outros materiais de leitura;
• organizar momentos de leitura livre em que o professor também leia. Para os alunos não acostumados com a participação em atos de leitura, que não conhecem o valor que possui, é fundamental ver seu professor envolvido com a leitura e com o que conquista por meio dela. Ver alguém seduzido pelo que faz pode despertar o desejo de fazer também;
• planejar as atividades diárias garantindo que as de leitura tenham a mesma importância que as demais;
• possibilitar aos alunos a escolha de suas leituras. Fora da escola, o autor, a obra ou o gênero são decisões do leitor. Tanto quanto for possível, é necessário que isso se preserve na escola;
• garantir que os alunos não sejam importunados durante os momentos de leitura com perguntas sobre o que estão achando, se estão entendendo e outras questões;
• possibilitar aos alunos o empréstimo de livros na escola. Bons textos podem ter o poder de provocar momentos de leitura junto com outras pessoas da casa — principalmente quando se trata de histórias tradicionais já conhecidas;
• quando houver oportunidade de sugerir títulos para serem adquiridos pelos alunos, optar sempre pela variedade: é infinitamente mais interessante que haja na classe, por exemplo, 35 diferentes livros — o que já compõe uma biblioteca de classe — do que 35 livros iguais. No primeiro caso, o aluno tem oportunidade de ler 35 títulos, no segundo apenas um;
• construir na escola uma política de formação de leitores na qual todos possam contribuir com sugestões para desenvolver uma prática constante de leitura que envolva o conjunto da unidade escolar.
Além das condições descritas, são necessárias propostas didáticas orientadas especificamente no sentido de formar leitores. A seguir são apresentadas algumas sugestões para o trabalho com os alunos, que podem servir de referência para a geração de outras propostas.

Leitura diária
O trabalho com leitura deve ser diário. Há inúmeras possibilidades para isso, pois a leitura pode ser realizada:
• de forma silenciosa, individualmente;
• em voz alta (individualmente ou em grupo) quando fizer sentido dentro da atividade; e
• pela escuta de alguém que lê.
No entanto, alguns cuidados são necessários:
• toda proposta de leitura em voz alta precisa fazer sentido dentro da atividade na qual se insere e o aluno deve sempre poder ler o texto silenciosamente, com antecedência — uma ou várias vezes;
• nos casos em que há diferentes interpretações para um mesmo texto e faz-se necessário negociar o significado (validar interpretações), essa negociação precisa ser fruto da compreensão do grupo e produzir-se pela argumentação dos alunos. Ao professor cabe orientar a discussão, posicionando-se apenas quando necessário;
• ao propor atividades de leitura convém sempre explicitar os objetivos e preparar os alunos. É interessante, por exemplo, dar conhecimento do assunto previamente, fazer com que os alunos levantem hipóteses sobre o tema a partir do título, oferecer informações que situem a leitura, criar um certo suspense quando for o caso, etc.;
• é necessário refletir com os alunos sobre as diferentes modalidades de leitura e os procedimentos que elas requerem do leitor. São coisas muito diferentes ler para se divertir, ler para escrever, ler para estudar, ler para descobrir o que deve ser feito, ler buscando identificar a intenção do escritor, ler para revisar. É completamente diferente ler em busca de significado — a leitura, de um modo geral — e ler em busca de inadequações e erros — a leitura para revisar. Esse é um procedimento especializado que precisa ser ensinado em todas as séries, variando apenas o grau de aprofundamento em função da capacidade dos alunos.

Leitura colaborativa
A leitura colaborativa é uma atividade em que o professor lê um texto com a classe e, durante a leitura, questiona os alunos sobre as pistas lingüísticas que possibilitam a atribuição de determinados sentidos. Trata-se, portanto, de uma excelente estratégia didática para o trabalho de formação de leitores. É particularmente importante que os alunos envolvidos na atividade possam explicitar para os seus parceiros os procedimentos que utilizam para atribuir sentido ao texto: como e por quais pistas lingüísticas lhes foi possível realizar tais ou quais inferências, antecipar determinados acontecimentos, validar antecipações feitas, etc. A possibilidade de interrogar o texto, a diferenciação entre realidade e ficção, a identificação de elementos discriminatórios e recursos persuasivos, a interpretação de sentido figurado, a inferência sobre a intencionalidade do autor, são alguns dos aspectos dos conteúdos relacionados à compreensão de textos, para os quais a leitura colaborativa tem muito a contribuir. A compreensão crítica depende em grande medida desses procedimentos.

Projetos de leitura
A característica básica de um projeto é que ele tem um objetivo compartilhado por todos os envolvidos, que se expressa num produto final em função do qual todos trabalham. Além disso, os projetos permitem dispor do tempo de uma forma flexível, pois o tempo tem o tamanho necessário para conquistar o objetivo: pode ser de alguns dias ou de alguns meses. Quando são de longa duração têm ainda a vantagem adicional de permitir o planejamento de suas etapas com os alunos.
São ocasiões em que eles podem tomar decisões sobre muitas questões: controlar o tempo, dividir e redimensionar as tarefas, avaliar os resultados em função do plano inicial, etc.
Os projetos são situações em que linguagem oral, linguagem escrita, leitura e produção de textos se inter-relacionam de forma contextualizada, pois quase sempre envolvem tarefas que articulam esses diferentes conteúdos. São situações lingüisticamente significativas, em que faz sentido, por exemplo, ler para escrever, escrever para ler, ler para decorar, escrever para não esquecer, ler em voz alta em tom adequado. Nos projetos em que é preciso expor ou ler oralmente para uma gravação que se destina a pessoas ausentes, por exemplo, uma circunstância interessante se apresenta: o fato de os interlocutores não estarem fisicamente presentes obriga a adequar a fala ou a leitura a fim de favorecer sua compreensão, analisando o tom de voz e a dicção, planejando as pausas, a entonação, etc. Os projetos de leitura são excelentes situações para contextualizar a necessidade de ler e, em determinados casos, a própria leitura oral e suas convenções.
Alguns exemplos de projetos de leitura: produção de fita cassete de contos ou poemas lidos para a biblioteca escolar ou para enviar a outras instituições; produção de vídeos (ou fitas cassete) de curiosidades gerais sobre assuntos estudados ou de interesse; promoção de eventos de leitura numa feira cultural ou exposição de trabalhos.

Atividades seqüenciadas de leitura
São situações didáticas adequadas para promover o gosto de ler e privilegiadas para desenvolver o comportamento do leitor, ou seja, atitudes e procedimentos que os leitores assíduos desenvolvem a partir da prática de leitura: formação de critérios para selecionar o material a ser lido, constituição de padrões de gosto pessoal, rastreamento da obra de escritores preferidos, etc.
Funcionam de forma parecida com os projetos — e podem integrá-los, inclusive —, mas não têm um produto final predeterminado: neste caso o objetivo explícito é a leitura em si. Nas atividades seqüenciadas de leitura pode-se, temporariamente, eleger um gênero específico, um determinado autor ou um tema de interesse.

Atividades permanentes de leitura
São situações didáticas propostas com regularidade e voltadas para a formação de atitude favorável à leitura. Um exemplo desse tipo de atividade é a “Hora de...” (histórias, curiosidades científicas, notícias, etc.). Os alunos escolhem o que desejam ler, levam o material para casa por um tempo e se revezam para fazer a leitura em voz alta, na classe. Dependendo da extensão dos textos e do que demandam em termos de preparo, a atividade pode se realizar semanalmente ou quinzenalmente, por um ou mais alunos a cada vez. Quando for pertinente, pode incluir também uma breve caracterização da obra do autor ou curiosidades sobre sua vida. Outro exemplo é o que se pode chamar “Roda de Leitores”: periodicamente os alunos tomam emprestado um livro (do acervo de classe ou da biblioteca da escola) para ler em casa. No dia combinado, uma parte deles relata suas impressões, comenta o que gostou ou não, o que pensou, sugere outros títulos do mesmo autor ou conta uma pequena parte da história para “vender” o livro que o entusiasmou aos colegas.

Leitura feita pelo professor
Além das atividades de leitura realizadas pelos alunos e coordenadas pelo professor há as que podem ser realizadas basicamente pelo professor. É o caso da leitura compartilhada de livros em capítulos, que possibilita aos alunos o acesso a textos bastante longos (e às vezes difíceis) que, por sua qualidade e beleza, podem vir a encantá-los, ainda que nem sempre sejam capazes de lê- los sozinhos.
A leitura em voz alta feita pelo professor não é uma prática muito comum na escola. Enquanto mais avançam as séries, mais incomum se torna, o que não deveria acontecer, pois, muitas vezes, são os alunos maiores que mais precisam de bons modelos de leitores. Na escola, uma prática de leitura intensa é necessária por muitas razões. Ela pode:
• ampliar a visão de mundo e inserir o leitor na cultura letrada;
• estimular o desejo de outras leituras;
• possibilitar a vivência de emoções, o exercício da fantasia e da imaginação;
• permitir a compreensão do funcionamento comunicativo da escrita: escreve- se para ser lido;
• expandir o conhecimento a respeito da própria leitura;
• aproximar o leitor dos textos e os tornar familiares — condição para a leitura fluente e para a produção de textos;
• possibilitar produções orais, escritas e em outras linguagens;
• informar como escrever e sugerir sobre o que escrever;
• ensinar a estudar;
• possibilitar ao leitor compreender a relação que existe entre a fala e a escrita;
• favorecer a aquisição de velocidade na leitura;
• favorecer a estabilização de formas ortográficas.
Uma prática intensa de leitura na escola é, sobretudo, necessária, porque ler ensina a ler e a escrever.

Prática de produção de textos
O trabalho com produção de textos tem como finalidade formar escritores competentes capazes de produzir textos coerentes, coesos e eficazes.
Um escritor competente é alguém que, ao produzir um discurso, conhecendo possibilidades que estão postas culturalmente, sabe selecionar o gênero no qual seu discurso se realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e à circunstância enunciativa em questão. Por exemplo: se o que deseja é convencer o leitor, o escritor competente selecionará um gênero que lhe possibilite a produção de um texto predominantemente argumentativo; se é fazer uma solicitação a determinada
autoridade, provavelmente redigirá um ofício; se é enviar notícias a familiares, escreverá uma carta.
Um escritor competente é alguém que planeja o discurso e conseqüentemente o texto em função do seu objetivo e do leitor a que se destina, sem desconsiderar as características específicas do gênero.
É alguém que sabe elaborar um resumo ou tomar notas durante uma exposição oral; que sabe esquematizar suas anotações para estudar um assunto; que sabe expressar por escrito seus sentimentos, experiências ou opiniões.
Um escritor competente é, também, capaz de olhar para o próprio texto como um objeto e verificar se está confuso, ambíguo, redundante, obscuro ou incompleto. Ou seja: é capaz de revisá-lo e reescrevê-lo até considerá-lo satisfatório para o momento. É, ainda, um leitor competente, capaz de recorrer, com sucesso, a outros textos quando precisa utilizar fontes escritas para a sua própria produção.
As pesquisas na área da aprendizagem da escrita, nos últimos vinte anos, têm provocado uma revolução na forma de compreender como esse conhecimento é construído. Hoje já se sabe que aprender a escrever envolve dois processos paralelos: compreender a natureza do sistema de escrita da língua — os aspectos notacionais — e o funcionamento da linguagem que se usa para escrever — os aspectos discursivos; que é possível saber produzir textos sem saber grafá-los e é possível grafar sem saber produzir; que o domínio da linguagem escrita se adquire muito mais pela leitura do que pela própria escrita; que não se aprende a ortografia antes de se compreender o sistema alfabético de escrita; e a escrita não é o espelho da fala.
O conhecimento a respeito de questões dessa natureza tem implicações radicais na didática da alfabetização. A principal delas é que não se deve ensinar a escrever por meio de práticas centradas apenas na codificação de sons em letras. Ao contrário, é preciso oferecer aos alunos inúmeras oportunidades de aprenderem a escrever em condições semelhantes às que caracterizam a escrita fora da escola. É preciso que se coloquem as questões centrais da produção desde o início: como escrever, considerando, ao mesmo tempo, o que pretendem dizer e a quem o texto se destina — afinal, a eficácia da escrita se caracteriza pela aproximação máxima entre a intenção de dizer, o que efetivamente se escreve e a interpretação de quem lê. É preciso que aprendam os aspectos notacionais da escrita (o princípio alfabético e as restrições ortográficas) no interior de um processo de aprendizagem dos usos da linguagem escrita. É disso que se está falando quando se diz que é preciso “aprender a escrever, escrevendo”.
Para aprender a escrever, é necessário ter acesso à diversidade de textos escritos, testemunhar a utilização que se faz da escrita em diferentes circunstâncias, defrontar-se com as reais questões que a escrita coloca a quem se propõe produzi-la, arriscar-se a fazer como consegue e receber ajuda de quem já sabe escrever. Sendo assim, o tratamento que se dá à escrita na escola não pode inibir os alunos ou afastá-los do que se pretende; ao contrário, é preciso aproximá-los, principalmente quando são iniciados “oficialmente” no mundo da escrita por meio da alfabetização. Afinal, esse é o início de um caminho que deverão trilhar para se transformarem em cidadãos da cultura escrita.
Se o objetivo é formar cidadãos capazes de utilizar a escrita com eficácia, que tenham condições de assumir a palavra — também por escrito — para produzir textos adequados é preciso organizar o trabalho educativo para que experimentem e aprendam isso na escola. É necessário, portanto, ensinar os alunos a lidar tanto com a escrita da linguagem — os aspectos notacionais relacionados ao sistema alfabético e às restrições ortográficas — como com a linguagem escrita — os aspectos discursivos relacionados à linguagem que se usa para escrever. Para tanto é preciso que, tão logo o aluno chegue à escola, seja solicitado a produzir seus próprios textos, mesmo que não saiba grafá-los, a escrever como lhe for possível, mesmo que não o faça convencionalmente.
Quando se analisam as principais dificuldades de redação nos diferentes níveis de escolaridade, freqüentemente se encontram narrações que “não contam histórias”, cartas que não parecem cartas, textos expositivos que não expõem idéias, textos argumentativos que não defendem nenhum ponto de vista. Além disso, e apesar de todas as correções feitas pelo professor, encontram-se também enormes dificuldades no que diz respeito à segmentação do texto em frases, ao agrupamento dessas em parágrafos e à correção ortográfica. Uma das prováveis razões dessas dificuldades para redigir pode ser o fato de a escola colocar a avaliação como objetivo da escrita. Compreendida como um complexo processo comunicativo e cognitivo, como atividade discursiva, a prática de produção de textos precisa realizar-se num espaço em que sejam consideradas as funções e o funcionamento da escrita, bem como as condições nas quais é produzida: para que, para quem, onde e como se escreve.
Formar escritores competentes supõe, portanto, uma prática continuada de produção de textos na sala de aula, situações de produção de uma grande variedade de textos de fato e uma aproximação das condições de produção às circunstâncias nas quais se produzem esses textos.
Diferentes objetivos exigem diferentes gêneros e estes, por sua vez, têm suas formas características que precisam ser aprendidas.

TRATAMENTO DIDÁTICO
Alguns procedimentos didáticos para implementar uma prática continuada de produção de textos na escola:
• oferecer textos escritos impressos de boa qualidade, por meio da leitura (quando os alunos ainda não lêem com independência, isso se torna possível mediante leituras de textos realizadas pelo professor, o que precisa, também, ser uma prática continuada e freqüente). São esses textos que podem se converter em referências de escrita para os alunos;
• solicitar aos alunos que produzam textos muito antes de saberem grafá- los. Ditar para o professor, para um colega que já saiba escrever ou para ser gravado em fita cassete é uma forma de viabilizar isso. Quando ainda não se sabe escrever, ouvir alguém lendo o texto que produziu é uma experiência importante;
• propor situações de produção de textos, em pequenos grupos, nas quais os alunos compartilhem as atividades, embora realizando diferentes tarefas: produzir propriamente, grafar e revisar. Essa é uma estratégia didática bastante produtiva porque permite que as dificuldades inerentes à exigência de coordenar muitos aspectos ao mesmo tempo sejam divididas entre os alunos. Eles podem, momentaneamente, dedicar-se a uma tarefa mais específica enquanto os outros cuidam das demais.
São situações em que um aluno produz e dita a outro, que escreve, enquanto um terceiro revisa, por exemplo. Experimentando esses diferentes papéis enunciativos, envolvendo-se com cada um, a cada vez, numa atividade colaborativa, podem ir construindo sua competência para posteriormente realizarem sozinhos todos os procedimentos envolvidos numa produção de textos. Nessas situações, o professor tem um papel decisivo tanto para definir os agrupamentos como para explicitar claramente qual a tarefa de cada aluno, além de oferecer a ajuda que se fizer necessária durante a atividade;
• a conversa entre professor e alunos é, também, uma importante estratégia didática em se tratando da prática de produção de textos: ela permite, por exemplo, a explicitação das dificuldades e a discussão de certas fantasias criadas pelas aparências. Uma delas é a da facilidade que os bons escritores (de livros) teriam para redigir. Quando está acabado, o texto praticamente não deixa traços de sua produção. Este, muito mais que mostra, esconde o processo pelo qual foi produzido. Sendo assim, é fundamental que os alunos saibam que escrever, ainda que gratificante para muitos, não é fácil para ninguém.

ALGUMAS SITUAÇÕES DIDÁTICAS FUNDAMENTAIS PARA A PRÁTICA DE PRODUÇÃO DE TEXTOS

Projetos
Os projetos são excelentes situações para que os alunos produzam textos de forma contextualizada — além do que, dependendo de como se organizam, exigem leitura, escuta de leituras, produção de textos orais, estudo, pesquisa ou outras atividades. Podem ser de curta ou média duração, envolver ou não outras áreas do conhecimento e resultar em diferentes produtos: uma coletânea de textos de um mesmo gênero (poemas, contos de assombração ou de fadas, lendas, etc.), um livro sobre um tema pesquisado, uma revista sobre vários temas estudados, um mural, uma cartilha sobre cuidados com a saúde, um jornal mensal, um folheto informativo, um panfleto, os cartazes de divulgação de uma festa na escola ou um único cartaz.
Os projetos, além de oferecerem reais condições de produção de textos escritos, carregam exigências de grande valor pedagógico:
• podem apontar a necessidade de ler e analisar uma grande variedade de textos e portadores do tipo que se vai produzir: como se organizam, que características possuem ou quais têm mais qualidade. Trata-se, nesse caso, de uma atividade de reflexão sobre aspectos próprios do gênero que será produzido. A tarefa de fazer um cartaz, por exemplo, poderá pôr em evidência o fato de que praticamente todos os cartazes são escritos com letras grandes — para permitir a leitura a distância — e com mensagens curtas — para que o leitor, mesmo caminhando, possa ler. Isso poderá alertar tanto alunos como professores sobre o fato de que cartazes produzidos com textos longos e letra manuscrita pequena (como algumas vezes se pode observar nos corredores das escolas) não são eficazes;
• o exercício de o escritor ajustar o texto à imagem que faz do leitor fisicamente ausente permite que o aluno aprenda a produzir textos escritos mais completos, com características de textos escritos mesmo. Por exemplo, deve aprender que não poderá usar dêiticos (ele, ela, aqui, lá, etc.) sem que o referente já tenha aparecido anteriormente no texto (quem é ele, ela; onde é aqui, lá, etc.); que não se pode ser tão redundante a ponto de correr o risco de o leitor desistir de ler o texto; que a correta ortografia pode ajudar na compreensão de quem lê; que, dificilmente, as pessoas suportam ler textos cuja letra é incompreensível;
• quando há leitores de fato para a escrita dos alunos, a necessidade de revisão e de cuidado com o trabalho se impõe, pois a legibilidade passa a ser um objetivo deles também e não só do professor;
• por intermédio dos projetos é possível uma intersecção entre conteúdos de diferentes áreas: por um lado, há os projetos da área de Língua Portuguesa que, em função do objetivo de trabalhar com textos informativos, privilegiam assuntos de outras áreas, dos temas transversais, por exemplo.
Por outro lado, no ensino das outras áreas, é imprescindível que se faça uso do registro escrito como recurso de documentação e de estudo. Esse registro pode resultar na elaboração de portadores de textos específicos, ao final ou durante o trabalho. Por exemplo: fazer um diário de viagem (pelos lugares que estão sendo estudados); elaborar uma cartilha sobre o que é a coleta seletiva do lixo, sua importância e instruções para realização; escrever um livro sobre as grandes navegações; ou um panfleto com estatísticas a respeito de um assunto discutido;
• os projetos favorecem o necessário compromisso do aluno com sua própria aprendizagem. O fato de o objetivo ser compartilhado, desde o início, e de haver um produto final em torno do qual o trabalho de todos se organiza, contribui muito mais para o engajamento do aluno nas tarefas como um todo, do que quando essas são definidas pelo professor; determinadas práticas habituais que não fazem qualquer sentido quando trabalhadas de forma descontextualizada podem ganhar significado no interior dos projetos: a cópia, o ditado, a produção coletiva de textos, a correção exaustiva do produto final, a exigência de uma ortografia impecável, etc.

Textos provisórios
A materialidade da escrita, que faz do seu produto um objeto ao qual se pode voltar, permite separar não só o escritor do destinatário da mensagem (comunicação a distância), como também permite romper a situação de produção do texto, separando produtor e produto. Essa possibilidade cria um efeito de distanciamento que permite trabalhar sobre o texto depois de uma primeira escrita.
A maioria dos escritores iniciantes costuma contentar-se com uma única versão de seu texto e, muitas vezes, a própria escola sugere esse procedimento. Isso em nada contribui para o texto ser entendido como processo ou para desenvolver a habilidade de revisar. O trabalho com rascunhos é imprescindível. É uma excelente estratégia didática para que o aluno perceba a provisoriedade dos textos e analise seu próprio processo.
Nesse sentido, a revisão do texto assume um papel fundamental na prática de produção. É preciso ser sistematicamente ensinada, de modo que, cada vez mais, assuma sua real função: monitorar todo o processo de produção textual desde o planejamento, de tal maneira que o escritor possa coordenar eficientemente os papéis de produtor, leitor e avaliador do seu próprio texto. Isso significa deslocar a ênfase da intervenção, no produto final, para o processo de produção, ou seja, revisar, desde o planejamento, ao longo de todo o processo: antes, durante e depois. A melhor qualidade do produto, nesse caso, depende de o escritor, progressivamente, tomar nas mãos o seu próprio processo de planejamento, escrita e revisão dos textos. Quando isso ocorre, pode assumir um papel mais intencional e ativo no desenvolvimento de seus procedimentos de produção.

Produção com apoio
A constatação das dificuldades inerentes ao ato de escrever textos — dificuldades decorrentes da exigência de coordenar muitos aspectos ao mesmo tempo — requer a apresentação de propostas para os alunos iniciantes que, de certa forma, possam “eliminar” algumas delas, para que se concentrem em outras. É importante que essas situações sejam planejadas de tal forma que os alunos apenas se preocupem com as variáveis que o professor priorizou por se relacionarem com o desenvolvimento do conteúdo em questão. Por exemplo:
• reescrever ou parafrasear bons textos já repertoriados mediante a leitura;
• transformar um gênero em outro: escrever um conto de mistério a partir de uma notícia policial e vice-versa; transformar uma entrevista em reportagem e vice-versa, etc.;
• produzir textos a partir de outros conhecidos: um bilhete ou carta que o personagem de um conto teria escrito a outro, um trecho do diário de um personagem, uma mensagem de alerta sobre os perigos de uma dada situação, uma notícia informando a respeito do desfecho de uma trama, uma crônica sobre acontecimentos curiosos, etc.;
• dar o começo de um texto para os alunos continuarem (ou o fim, para que escrevam o início e o meio);
• planejar coletivamente o texto (o enredo da história, por exemplo) para que depois cada aluno escreva a sua versão (ou que o façam em pares ou trios).
Situações de criação
Quando se pretende formar escritores competentes, é preciso também oferecer condições de os alunos criarem seus próprios textos e de avaliarem o percurso criador. Evidentemente, isso só se torna possível se tiverem constituído um amplo repertório de modelos, que lhes permita recriar, criar, recriar as próprias criações. É importante que nunca se perca de vista que não há como criar do nada: é preciso ter boas referências. Por isso, formar bons escritores depende não só de uma prática continuada de produção de textos, mas de uma prática constante de leitura.
Uma forma de trabalhar a criação de textos são as oficinas ou ateliês de produção. Uma oficina é uma situação didática onde a proposta é que os alunos produzam textos tendo à disposição diferentes materiais de consulta, em função do que vão produzir: outros textos do mesmo gênero, dicionários, enciclopédias, atlas, jornais, revistas e todo tipo de fonte impressa eventualmente necessária (até mesmo um banco de personagens criados e caracterizados pelos próprios alunos para serem utilizados nas oficinas).
A possibilidade de avaliar o percurso criador é importante para a tomada de consciência das questões envolvidas no processo de produção de textos. Isso é algo que depende de o professor chamar a atenção para certos aspectos, fazer com que os alunos exponham suas preferências, dificuldades ou as alternativas escolhidas e abandonadas — o percurso propriamente. Esse trabalho de explicitação permite que, com o tempo, os procedimentos de análise propostos pelo professor se incorporem à prática de reflexão do aluno, favorecendo um controle maior sobre seu processo criador. Uma contribuição importante é conhecer o processo criador de outros autores, seja por meio de um contato direto, seja por meio de textos por eles escritos sobre o tema ou de vídeos, entrevistas, etc.
Finalmente, é importante destacar que nem todos os conteúdos são possíveis de serem trabalhados por meio de propostas que contextualizem a escrita de textos: às vezes, é preciso escrever unicamente para aprender. O importante, de qualquer forma, é dar sentido às atividades de escrita. Por outro lado, considerar o texto como unidade básica do ensino de Língua Portuguesa não significa que, eventualmente, não seja necessário analisar unidades como as palavras e até mesmo as sílabas, como se pode ver a seguir.

ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA
As atividades de análise lingüística são aquelas que tomam determinadas características da linguagem como objeto de reflexão. Essas atividades apóiam-se em dois fatores:
• a capacidade humana de refletir, analisar, pensar sobre os fatos e os fenômenos da linguagem;
• a propriedade que a linguagem tem de poder referir-se a si mesma, de falar sobre a própria linguagem. Isso torna possível organizar um trabalho didático de análise lingüística, aqui denominado “Análise e reflexão sobre a língua”, cujo objetivo principal é melhorar a capacidade de compreensão e expressão dos alunos, em situações de comunicação tanto escrita como oral.
As atividades de análise lingüística não são uma invenção escolar. Por exemplo, quando alguém, no meio de uma conversa, pergunta “O que você quis dizer com isso?”, está realizando uma atividade epilingüística. Quando planejadas didaticamente, situações desse tipo podem constituir uma importante fonte de questionamento, análise e organização de informações sobre a língua e, no processo de ensino, devem anteceder as práticas de reflexão metalingüística, para que essas possam ter algum significado para os alunos.
Em relação à escrita de textos, a prática de análise e reflexão sobre a língua permite que se explicitem saberes implícitos dos alunos, abrindo espaço para sua reelaboração. Ela implica uma atividade permanente de formulação e verificação de hipóteses sobre o funcionamento da linguagem que se realiza por meio da comparação de expressões, da experimentação de novos modos de escrever, da atribuição de novos sentidos a formas lingüísticas já utilizadas, da observação de regularidades (no que se refere tanto ao sistema de escrita quanto aos aspectos ortográficos ou gramaticais) e da exploração de diferentes possibilidades de transformação dos textos (supressões, ampliações, substituições, alterações de ordem, etc.). No caso da produção oral, essa prática é prioritariamente de explicitação do que os alunos sabem utilizar — mas não têm consciência de que o fazem e por que —, ou seja, um trabalho focado sobre aspectos da linguagem que, se compreendidos, podem contribuir para o desenvolvimento da capacidade de produzir textos orais mais eficazes: a comparação, por exemplo, entre formas de falar utilizadas em variadas situações, com o objetivo de que o aluno se aproprie progressivamente dos diferentes registros. Em se tratando da língua oral, valer-se da diversidade lingüística é um recurso fundamental, pois aquilo que não é facilmente observável pode evidenciar-se pelo contraste.
No que se refere às atividades de leitura, o trabalho de reflexão sobre a língua é importante possibilitar a discussão sobre diferentes sentidos atribuídos aos textos e sobre os elementos discursivos que validam ou não essas atribuições de sentido. Propicia ainda a construção de um repertório de recursos lingüísticos a ser utilizado na produção de textos. Uma prática fundamental de análise e reflexão sobre a língua, que tem relação com a produção oral e com a prática de leitura, é a recepção ativa: prática que, cada vez mais, torna-se uma necessidade, especialmente no que diz respeito aos textos veiculados pelos meios de comunicação de massa. Nesse caso, possibilita o reconhecimento do tipo de linguagem característica, a interpretação crítica das mensagens ou a identificação do papel complementar de elementos não-lingüísticos, como a imagem é algo que depende do exercício de recepção ativa: a capacidade de, mais do que ouvir/ler com atenção, trabalhar mentalmente com o que se ouve ou se lê. Trata-se de uma atividade de produção de sentido que pressupõe analisar e relacionar enunciados, fazer deduções e produzir sínteses: uma atividade privilegiada de reflexão sobre a língua. É possível estabelecer, por meio da recepção ativa, a relação de elementos não-lingüísticos com a fala, identificar aspectos possivelmente relevantes aos propósitos e intenções de quem produz o texto ou inferir a intencionalidade implícita.
Um recurso didático particularmente interessante, no caso do texto oral, é a gravação em áudio ou vídeo — de uma exposição oral, ao vivo, como por meio do rádio ou da televisão, de um debate, um pronunciamento, uma entrevista, etc. —, pois permite observar com atenção coisas que não seriam possíveis apenas a partir da escuta direta e voltar sobre elas, seja da fala do outro ou da própria fala.
O trabalho didático de análise lingüística a partir dessas considerações se organiza tendo como ponto de partida a exploração ativa e a observação de regularidades no funcionamento da linguagem. Isso é o contrário de partir da definição para chegar à análise (como tradicionalmente se costuma fazer). Trata-se de situações em que se busca a adequação da fala ou da escrita própria e alheia, a avaliação sobre a eficácia ou adequação de certas expressões no uso oral ou escrito, os comentários sobre formas de falar ou escrever, a análise da pertinência de certas substituições de enunciados, a imitação da linguagem utilizada por outras pessoas, o uso de citações, a identificação de marcas da oralidade na escrita e vice-versa, a comparação entre diferentes sentidos atribuídos a um mesmo texto, a intencionalidade implícita em textos lidos ou ouvidos, etc.

Revisão de texto
Um espaço privilegiado de articulação das práticas de leitura, produção escrita e reflexão sobre a língua (e mesmo de comparação entre linguagem oral e escrita) é o das atividades de revisão de texto. Chama-se revisão de texto o conjunto de procedimentos por meio dos quais um texto é trabalhado até o ponto em que se decide que está, para o momento, suficientemente bem escrito. Pressupõe a existência de rascunhos sobre os quais se trabalha, produzindo alterações que afetam tanto o conteúdo como a forma do texto.
Durante a atividade de revisão, os alunos e o professor debruçam-se sobre o texto buscando melhorá-lo. Para tanto, precisam aprender a detectar os pontos onde o que está dito não é o que se pretendia, isto é, identificar os problemas do texto e aplicar os conhecimentos sobre a língua para resolvê-los: acrescentando, retirando, deslocando ou transformando porções do texto, com o objetivo de torná-lo mais legível para o leitor. O que pode significar tanto torná-lo mais claro e compreensível quanto mais bonito e agradável de ler. Esse procedimento — parte integrante do próprio ato de escrever — é aprendido por meio da participação do aluno em situações coletivas de revisão do texto escrito, bem como em atividades realizadas em parceria e sob a orientação do professor, que permitem e exigem uma reflexão sobre a organização das idéias, os procedimentos de coesão utilizados, a ortografia, a pontuação, etc. Essas situações, nas quais são trabalhadas as questões que surgem na produção, dão origem a um tipo de conhecimento que precisa ir se incorporando progressivamente à atividade de escrita, para melhorar sua qualidade. Dessa perspectiva, a revisão de texto seria uma espécie de controle de qualidade da produção, necessário desde o planejamento e ao longo do processo de redação e não somente após a finalização do produto.
A revisão de texto, como situação didática, exige que o professor selecione em quais aspectos pretende que os alunos se concentrem de cada vez, pois não é possível tratar de todos ao mesmo tempo. Ou bem se foca a atenção na coerência da apresentação do conteúdo, nos aspectos coesivos e pontuação, ou na ortografia. E, quando se toma apenas um desses aspectos para revisar, é possível, ao fim da tarefa, sistematizar os resultados do trabalho coletivo e devolvê-lo organizadamente ao grupo de alunos.
Para os escritores iniciantes, assim mesmo, esta pode ser uma tarefa complexa, pois requer distanciamento do próprio texto, procedimento difícil especialmente para crianças pequenas. Nesse caso, é interessante utilizar textos alheios para serem analisados coletivamente, ocasião em que o professor pode desempenhar um importante papel de modelo de revisor, colocando boas questões para serem analisadas e dirigindo o olhar dos alunos para os problemas a serem resolvidos.
Quer seja com toda a classe, quer seja em pequenos grupos, a discussão sobre os textos alheios e próprios, além do objetivo imediato de buscar a eficácia e a correção da escrita, tem objetivos pedagógicos importantes: o desenvolvimento da atitude crítica em relação à própria produção e a aprendizagem de procedimentos eficientes para imprimir qualidade aos textos.

Aprendendo com textos
Um tipo especial de trabalho de análise lingüística — que quando bem realizado tem um grande impacto sobre a qualidade dos textos produzidos pelos alunos — é o de observar textos impressos de diferentes autores com a intenção de desvelar a forma pela qual eles resolvem questões da textualidade . De preferência, textos especialmente bem escritos, de autores reconhecidos, a fim de que, analisando os recursos que utilizam, possam aprender com eles. São situações em que o grupo de alunos busca encontrar no texto a forma pela qual o autor resolveu o problema da repetição por meio de substituições, ou observa as características da pontuação usada por um determinado autor que marca seu estilo particular, ou mesmo o rastreamento, em um conto, de todas as expressões que o autor usou para indicar mudança de lugar, de tempo ou do personagem em cena: é possível que, assim, se amplie o repertório em uso pelos alunos, que se avance no conhecimento de recursos coesivos e até que, desta última lista de expressões, saia uma de locuções adverbiais (se e quando for o caso).

Alfabetização
Para aprender a ler e a escrever é preciso pensar sobre a escrita, pensar sobre o que a escrita representa e como ela representa graficamente a linguagem.
Algumas situações didáticas favorecem especialmente a análise e a reflexão sobre o sistema alfabético de escrita e a correspondência fonográfica. São atividades que exigem uma atenção à análise — tanto quantitativa como qualitativa — da correspondência entre segmentos falados e escritos. São situações privilegiadas de atividade epilingüística, em que, basicamente, o aluno precisa:
• ler, embora ainda não saiba ler; e
• escrever, apesar de ainda não saber escrever.
Em ambas é necessário que ele ponha em jogo tudo o que sabe sobre a escrita para poder realizá-las.
Nas atividades de “leitura” o aluno precisa analisar todos os indicadores disponíveis para descobrir o significado do escrito e poder realizar a “leitura” de duas formas: — pelo ajuste da “leitura” do texto, que conhece de cor, aos segmentos escritos; e — pela combinação de estratégias de antecipação (a partir de informações obtidas no contexto, por meio de pistas) com índices providos pelo próprio texto, em especial os relacionados à correspondência fonográfica.
Mas não é qualquer texto que, além de permitir este tipo de “leitura”, garante que o esforço de atribuir significado às partes escritas coloque problemas que ajudem o aluno a refletir e a aprender.
No primeiro caso, os textos mais adequados são as quadrinhas, parlendas e canções que, em geral, se sabe de cor; e, no segundo, as embalagens comerciais, os anúncios, os folhetos de propaganda e demais portadores de texto que possibilitem suposições de sentido a partir do conteúdo, da imagem ou foto, do conhecimento da marca ou do logotipo, isto é, de qualquer elemento do texto ou do seu entorno que permita ao aluno imaginar o que poderia estar aí escrito.
Estudos em diferentes línguas têm mostrado que, de uma correspondência inicial pouco diferenciada, o alfabetizando progride em direção a um procedimento de análise em que passa a fazer corresponder recortes do falado a recortes do escrito. Essa correspondência passa por um momento silábico — em que, ainda que nem sempre com consistência, atribui uma letra a uma sílaba — antes de chegar a compreender o que realmente cada letra representa.
Nas atividades de escrita aqui referidas, o aluno que ainda não sabe escrever convencionalmente precisa esforçar-se para construir procedimentos de análise e encontrar formas de representar graficamente aquilo que se propõe escrever. É por isso que esta é uma boa atividade de alfabetização: havendo informação disponível e espaço para reflexão sobre o sistema de escrita, os alunos constroem os procedimentos de análise necessários para que a alfabetização se realize.
As propostas de escrita mais produtivas são as que permitem aos alunos monitorarem sua própria produção, ao menos parcialmente. A escrita de listas36 ou quadrinhas que se sabe de cor permite, por exemplo, que a atividade seja realizada em grupo e que os alunos precisem se pôr de acordo sobre quantas e quais letras irão usar para escrever. Cabe ao professor que dirige a atividade escolher o texto a ser escrito e definir os parceiros em função do que sabe acerca do conhecimento que cada aluno tem sobre a escrita, bem como, orientar a busca de fontes de consulta, colocar questões que apóiem a análise e oferecer informação específica sempre que necessário.

Ortografia
De modo geral, o ensino da ortografia dá-se por meio da apresentação e repetição verbal de regras, com sentido de “fórmulas”, e da correção que o professor faz de redações e ditados, seguida de uma tarefa onde o aluno copia várias vezes as palavras que escreveu errado. E, apesar do grande investimento feito nesse tipo de atividade, os alunos — se bem que capazes de “recitar” as regras quando solicitados — continuam a escrever errado.
Ainda que tenha um forte apelo à memória, a aprendizagem da ortografia não é um processo passivo: trata-se de uma construção individual, para a qual a intervenção pedagógica tem muito a contribuir.
É importante que as estratégias didáticas para o ensino da ortografia se articulem em torno de dois eixos básicos:
• o da distinção entre o que é “produtivo” e o que é “reprodutivo” na notação da ortografia da língua, permitindo no primeiro caso o descobrimento explícito de regras geradoras de notações corretas e, quando não, a consciência de que não há regras que justifiquem as formas corretas fixadas pela norma; e
• a distinção entre palavras de uso freqüente e infreqüente na linguagem escrita impressa.
Em função dessas especificidades, o ensino da ortografia deveria organizar-se de modo a favorecer:
• a inferência dos princípios de geração da escrita convencional, a partir da explicitação das regularidades do sistema ortográfico (isso é possível utilizando como ponto de partida a exploração ativa e a observação dessas regularidades: é preciso fazer com que os alunos explicitem suas suposições de como se escrevem as palavras, reflitam sobre possíveis alternativas de grafia, comparem com a escrita convencional e tomem progressiva-mente consciência do funcionamento da ortografia);
• a tomada de consciência de que existem palavras cuja ortografia não é definida por regras e exigem, portanto, a consulta a fontes autorizadas e o esforço de memorização.
Os casos em que as regras existem podem ser descritos38 como produzidos por princípios geradores “biunívocos”, “contextuais” e “morfológicos”. O princípio gerador biunívoco é o próprio sistema alfabético nas correspondências em que a cada grafema corresponde apenas um fonema e vice-versa. As regras do tipo contextual (ex.: o uso de RR, QU, GU, NH, M/N antes de consoante, etc.) são aquelas em que, apesar de se encontrar no sistema alfabético mais de um grafema para notar o mesmo fonema, a norma restringe os usos daqueles grafemas formulando regras que se aplicam parcial ou universalmente aos contextos em que são usados. E, por fim, as regras do tipo morfológico são as que remetem aos aspectos morfológicos e à categoria gramatical da palavra para poder decidir sua forma ortográfica (ex.: ANDA(R), PENSA(R): verbos no infinitivo; FIZE(SS)E, OUVI(SS)E: imperfeito do subjuntivo; PORTUGUE(S)A, INGLE(S)A: adjetivos gentílicos terminados em /esa/; RIQUE(Z)A, POBRE(Z)A: substantivos terminados em /eza/, etc.). É importante observar que a realização desse tipo de trabalho não requer necessariamente a utilização de nomenclatura gramatical.
A aprendizagem da ortografia das palavras irregulares — cuja escrita não se orienta por regularidades da norma — exige, em primeiro lugar, a tomada de consciência de que, nesses casos, não há regras que justifiquem as formas corretas fixadas pela norma e, em segundo lugar, um posicionamento do professor a respeito de quais dessas formas deverão receber um maior investimento no ensino.
A posição que se defende é a de que, independentemente de serem regulares ou irregulares — definidas por regras ou não —, as formas ortográficas mais freqüentes na escrita devem ser aprendidas o quanto antes. Não se trata de definir rigidamente um conjunto de palavras a ensinar e desconsiderar todas as outras, mas de tratar diferentemente, por exemplo, a escrita inadequada de “quando” e de “questiúncula”, de “hoje” e de “homilia” — dada a enorme diferenciação da freqüência de uso de umas e outras. É preciso que se diferencie o que deve estar automatizado o mais cedo possível para liberar a atenção do aluno para outros aspectos da escrita e o que pode ser objeto de consulta ao dicionário.
A consulta ao dicionário pressupõe conhecimento sobre as convenções da escrita e sobre as do próprio portador: além de saber que as palavras estão organizadas segundo a ordem alfabética (não só das letras iniciais, mas também das seguintes), é preciso saber, por exemplo, que os verbos não aparecem flexionados, que o significado da palavra procurada é um critério para verificar se determinada escrita se refere realmente a ela, etc. Assim, o manejo do dicionário precisa ser orientado, pois requer a aprendizagem de procedimentos bastante complexos.
O trabalho com a normatização ortográfica deve estar contextualizado, basicamente, em situações em que os alunos tenham razões para escrever corretamente, em que a legibilidade seja fundamental porque existem leitores de fato para a escrita que produzem. Deve estar voltado para o desenvolvimento de uma atitude crítica em relação à própria escrita, ou seja, de preocupação com a adequação e correção dos textos. No entanto, diferentemente de outros aspectos da notação escrita — como a pontuação —, as restrições da norma ortográfica estão definidas basicamente no nível da palavra. Isso faz com que o ensino da ortografia possa desenvolver-se por meio tanto de atividades que tenham o texto como fonte de reflexão como de atividades que tenham palavras não necessariamente vinculadas a um texto específico.

Pontuação
O ensino da pontuação tem-se confundido com o ensino dos sinais de pontuação. A uma apresentação do tipo “serve para” ou “é usado para” segue-se uma exemplificação cujo objetivo é servir de referência ao uso. Desse momento em diante costuma-se esperar que os alunos incorporem a pontuação a seus textos.
A partir da compreensão de que o procedimento de pontuar é parte da atividade de textualização, essa abordagem se mostra inadequada e indica a necessidade de rever algumas idéias, nem sempre explícitas, sobre as quais esta didática se apóia. A primeira delas é que a pontuação serviria para indicar as pausas na leitura em voz alta e a segunda é que o que se pontuam são as frases.
A história da pontuação é tributária da história das práticas sociais de leitura. O costume de ler apenas com os olhos, que caracteriza a forma moderna de ler, incorporou ao texto um aparato gráfico cuja função é indicar ao leitor unidades para o processamento da leitura. Na página impressa, a pontuação — aí considerados os brancos da escrita: espaços entre parágrafos e alíneas— organiza o texto para a leitura visual fragmentando-o em unidades separadas de tal forma que a leitura possa reencontrar, na articulação visual da página, as conexões intelectuais ou discursivas do raciocínio. Não se trata, portanto, de indicar pausas para respirar, pois, ainda que um locutor possa usar a pontuação para isso, não é essa sua função no texto escrito.
O texto não é uma soma de frases, é um fluxo contínuo que precisa ser dividido em partes que podem ou não conter partes também — os apostos, por exemplo. Frases que se agrupam tipograficamente em parágrafos. A pontuação aparece sempre em posições que indicam fronteiras sintático-semânticas. Aliás, é principalmente para isso que ela serve: para separar.
Aprender a pontuar é aprender a partir e a reagrupar o fluxo do texto de forma a indicar ao leitor os sentidos propostos pelo autor, obtendo assim efeitos estilísticos. O escritor indica as separações (pontuando) e sua natureza (escolhendo o sinal) e com isso estabelece formas de articulação entre as partes que afetam diretamente as possibilidades de sentido.
A única regra obrigatória da pontuação é a que diz onde não se pode pontuar: entre o sujeito e o verbo e entre o verbo e seu complemento. Tudo o mais são possibilidades. Por isso — ao contrário da ortografia — na pontuação a fronteira entre o certo e o errado nem sempre é bem definida. Há, quase sempre, mais de uma possibilidade de pontuar um texto, a ponto de alguns gramático apresentarem-na como “a arte de dividir, por meio de sinais gráficos, as partes do discurso que não têm entre si ligação íntima, e de mostrar do modo mais claro as relações que existem entre essas partes”.
Aprender a pontuar não é, portanto, aprender um conjunto de regras a seguir e sim aprender um procedimento que incide diretamente sobre a textualidade. Um procedimento que só é possível aprender sob tutoria, isto é, fazendo juntamente com quem sabe:
— conversando sobre as decisões que cada um tomou ao pontuar e por quê;
— analisando alternativas tanto do ponto de vista do sentido desejado quanto dos aspectos estilísticos e escolhendo a que parece melhor entre as possíveis;
— observando os usos característicos da pontuação nos diferentes gêneros e suas razões (a grande quantidade de vírgulas/aposições nas notícias jornalísticas como instrumento para condensar o texto, por exemplo);
— analisando os efeitos estilísticos obtidos por meio da pontuação pelos bons autores.

Aspectos gramaticais
É no interior da situação de produção de texto, enquanto o escritor monitora a própria escrita para assegurar sua adequação, coerência, coesão e correção, que ganham utilidade os conhecimentos sobre os aspectos gramaticais.
Saber o que é substantivo, adjetivo, verbo, artigo, preposição, sujeito, predicado, etc. não significa ser capaz de construir bons textos, empregando bem esses conhecimentos. Quando se enfatiza a importância das atividades de revisão é por esta razão: trata-se de uma oportunidade privilegiada de ensinar o aluno a utilizar os conhecimentos que possui, ao mesmo tempo que é fonte de conteúdos a serem trabalhados. Isso porque os aspectos gramaticais — e outros discursivos como a pontuação — devem ser selecionados a partir dos das produções escritas dos alunos. O critério de relevância dos aspectos identificados como problemáticos — que precisam, portanto, ser ensinados prioritariamente — deve ser composto pela combinação de dois fatores: por um lado, o que pode contribuir para maior adequação e legibilidade dos textos e, por outro, a capacidade dos alunos em cada momento.
A propriedade que a linguagem tem de poder referir-se a si mesma é o que torna possível a análise da língua e o que define um vocabulário próprio, uma metalinguagem. Em relação a essa terminologia característica, é preciso considerar que, embora seja peculiar a situações de análise lingüística (em que inevitavelmente se fala sobre língua), não se deve sobrecarregar os alunos com um palavreado sem função, justificado exclusivamente pela tradição de ensiná-lo. O critério do que deve ser ou não ensinado é muito simples: apenas os termos que tenham utilidade para abordar os conteúdos e facilitar a comunicação nas atividades de reflexão sobre a língua excluindo-se tudo o que for desnecessário e costuma apenas confundir os alunos.
Por exemplo, torna-se necessário saber, nas séries iniciais, o que é “proparoxítona”, no fim de um processo em que os alunos, sob orientação do professor, analisam e estabelecem regularidades na acentuação de palavras e chegam à regra de que são sempre acentuadas as palavras em que a sílaba tônica é a antepenúltima. Também é possível ensinar concordância sem necessariamente falar em sujeito ou em verbo.
Isso não significa que não é para ensinar fonética, morfologia ou sintaxe, mas que elas devem ser oferecidas à medida que se tornarem necessárias para a reflexão sobre a língua.
Finalmente, é preciso voltar a enfatizar o papel que o trabalho em grupo desempenha em atividades de análise e reflexão sobre a língua: é um espaço de discussão de estratégias para a resolução das questões que se colocam como problemas, de busca de alternativas, de verificação de diferentes hipóteses, de comparação de diferentes pontos de vista, de colaboração entre os alunos para a resolução de tarefas de aprendizagem. O princípio didático básico das atividades não apenas deste bloco, mas de todos os outros, é sempre o mesmo: partir do que os alunos já sabem sobre o que se pretende ensinar e focar o trabalho nas questões que representam dificuldades para que adquiram conhecimentos que possam melhorar sua capacidade de uso da linguagem. Nesse sentido, pretende-se que o aluno evolua não só como usuário mas que possa assumir, progressivamente, o monitoramento da própria atividade lingüística.
Se o objetivo é que os alunos utilizem os conhecimentos adquiridos por meio da prática de reflexão sobre a língua para melhorar a capacidade de compreensão e expressão, tanto em situações de comunicação escrita quanto oral, é preciso organizar o trabalho educativo nessa perspectiva.
Sendo assim, ainda que os conteúdos relacionados a esse tipo de prática estejam organizados num bloco separado, eles devem remeter-se diretamente às atividades de uso da linguagem. Mais do que isso, devem estar a seu serviço.

Os recursos didáticos e sua utilização
Ao selecionar recursos didáticos para o trabalho pedagógico na área de Língua Portuguesa, deve-se levar em consideração os seguintes aspectos:
• sua utilização nas diferentes situações de comunicação de fato; e
• as necessidade colocadas pelas situações de ensino e aprendizagem.
Entre os principais recursos que precisam estar disponíveis na escola para viabilizar a proposta didática da área, estão os textos autênticos. A utilização de textos autênticos pressupõe cuidado com a manutenção de suas características gráficas: formatação, paginação, diferentes elementos utilizados para atribuição de sentido — como fotografias, desenhos gráficos, ilustrações, etc. Da mesma forma, é importante que esses textos, sempre que possível, sejam trazidos para a sala de aula nos seus portadores de origem (ainda que em algumas situações possam ser agrupados segundo gênero ou tema, por exemplo, para atender a necessidades específicas dos projetos de estudo).
As bibliotecas — escolar e de classe — são, nessa perspectiva, fundamentais para um trabalho como o proposto por este documento.
Na biblioteca escolar é necessário que sejam colocados à disposição dos alunos textos dos mais variados gêneros, respeitados os seus portadores: livros de contos, romances, poesia, enciclopédias, dicionários, jornais, revistas (infantis, em quadrinhos, de palavras cruzadas e outros jogos), livros de consulta das diversas áreas do conhecimento, almanaques, revistas de literatura de cordel, textos gravados em áudio e em vídeo, entre outros. Além dos materiais impressos que se pode adquirir no mercado, também aqueles que são produzidos pelos alunos — produtos dos mais variados projetos de estudo — podem compor o acervo da biblioteca escolar: coletâneas de contos, trava-línguas, piadas, brincadeiras e jogos infantis, livros de narrativas ficcionais, dossiês sobre assuntos específicos, diários de viagens, revistas, jornais, etc.
A biblioteca de classe não precisa ser excessivamente ampla no que se refere ao número de volumes disponíveis. Ao contrário, é preciso que a variedade de materiais e títulos esteja garantida, o que permite uma diversificação de leitura aos alunos. Também é possível que se tenha, em algumas situações, um volume para cada aluno de um único título: nesse caso, é preciso que se tenha propostas específicas de trabalho que justifiquem essa opção. Do acervo da classe também podem constar produções dos próprios alunos.
O papel da escola (e principalmente do professor) é fundamental, tanto no que se refere à biblioteca escolar quanto à de classe, para a organização de critérios de seleção de material impresso de qualidade e para a orientação dos alunos, de forma a promover a leitura autônoma, a aprendizagem de procedimentos de utilização de bibliotecas (empréstimo, seleção de repertório, utilização de índices, consulta a diferentes fontes de informação, seleção de textos adequados às suas necessidades, etc.), e a constituição de atitudes de cuidado e conservação do material disponível para consulta.
Além disso, a organização do espaço físico — iluminação, estantes e disposição dos livros, agrupamentos dos livros no espaço disponível, mobiliário, etc. — deve garantir que todos os alunos tenham acesso ao material disponível. Mais do que isso: deve possibilitar ao aluno o gosto por freqüentar aquele espaço e, dessa forma, o gosto pela leitura.
O emprego de recursos audiovisuais pode ser de grande utilidade na realização de diversas atividades lingüísticas. Entre as diferentes possibilidades — slides, cartazes, fotografias, transparências de textos para serem utilizadas no retroprojetor, etc. —, o gravador e o vídeo merecem destaque: além de possibilitarem o acesso a textos que combinam sistemas verbais e não-verbais de comunicação (o que é importante do ponto de vista comunicativo), possuem aplicações didáticas interessantes para a organização de situações de aprendizagem da língua.
O gravador é um recurso bastante útil nas atividades de revisão de textos orais produzidos pelos alunos. Ao serem gravadas leituras expressivas de textos, simulações de anúncios e programas de rádio e entrevistas, por exemplo, é possível que os alunos revisem esses textos de maneira a centrar sua atenção sobre alguns aspectos específicos da produção oral: a entonação, o ritmo, a redundância no uso de certos termos e a organização do discurso.
O vídeo também pode ser útil nas atividades de revisão de texto: permite que se volte sobre as produções orais dos alunos para analisar tanto aspectos lingüísticos como não-lingüísticos (gesto, postura corporal, expressão facial, etc.) da produção do discurso.
Na alfabetização inicial, alguns materiais podem ser de grande utilidade ao professor: alfabetos, crachás ou cartazes com os nomes dos alunos, cadernos de textos conhecidos pela classe, pastas de determinados gêneros de textos, dicionários organizados pelos alunos com suas dificuldades ortográficas mais freqüentes, jogos didáticos que proponham exercícios lingüísticos, por exemplo.
Finalmente, é necessário que se faça menção ao computador: alguns programas possibilitam a digitação e edição de textos produzidos pelos alunos para publicações internas da classe ou da escola; outros permitem a comunicação com alunos de outras escolas, estados, países; outros, ainda, possibilitam o trabalho com aprendizagens específicas, sobretudo a leitura.
O mais importante, no entanto, é realizar uma boa seleção dos materiais que se incorporarão à aula, tendo como critério a qualidade tanto do ponto de vista lingüístico quanto gráfico. Além disso, é fundamental que sejam adequados à proposta didática a ser desenvolvida: há ocasiões em que é possível utilizar materiais do entorno próximo; em outras, haverá necessidade de se recorrer a materiais produzidos com finalidades especificamente didáticas.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO
Os objetivos do ensino balizam a avaliação: são eles que permitem a elaboração de critérios para avaliar a aprendizagem dos conteúdos. Neste documento, foram definidos apenas os critérios de avaliação para os dois primeiros ciclos. Têm como referência os objetivos especificados para os respectivos ciclos e representam as aprendizagens imprescindíveis ao final desse período, possíveis à imensa maioria dos alunos submetidos a um ensino como o proposto. Não são, portanto, coincidentes com todas as expectativas de aprendizagem — essas estão expressas nos objetivos, cuja função é orientar o ensino. Os critérios de avaliação não podem, de forma alguma, ser tomados
como objetivos, pois isso significaria um injustificável rebaixamento da oferta de ensino e, conseqüentemente, a não-garantia de conquista das aprendizagens consideradas essenciais.
Outro alerta importante é que não tem sentido utilizar os critérios indicados neste documento para avaliar a aprendizagem de alunos submetidos a práticas educativas orientadas por outros objetivos (que não os aqui especificados). A adoção destes critérios pressupõe a adoção também dos objetivos propostos neste documento e às adaptações dos objetivos que cada equipe escolar julgar necessárias precisam corresponder adaptações também dos critérios.
Para avaliar segundo os critérios estabelecidos é necessário considerar indicadores bastante precisos que sirvam para identificar de fato as aprendizagens realizadas. No entanto, é importante não perder de vista que um progresso relacionado a um critério específico pode manifestar-se de diferentes formas, em diferentes alunos. E uma mesma ação pode, para um aluno, indicar avanço em relação a um critério estabelecido, e, para outro, não. Por isso, além de necessitarem de indicadores precisos, os critérios de avaliação devem ser tomados em seu conjunto, considerados de forma contextual e, muito mais do que isso, analisados à luz dos objetivos que realmente orientaram o ensino oferecido aos alunos. E se o propósito é avaliar também o processo, além do produto, não há nenhum instrumento de avaliação da aprendizagem melhor do que buscar identificar por que o aluno teria dado as respostas que deu às situações que lhe foram propostas. A análise dos exemplos que se seguem pretende contribuir para a reflexão sobre esses aspectos.
Diante de uma proposta de avaliação pautada pelo critério “Escrever textos considerando um leitor real, embora ausente...”, o fato de não estar precisamente definido e caracterizado o perfil do destinatário poderia ter como conseqüência resultados absolutamente diferentes. Para muitos alunos a proposta demandaria esforços de acréscimo de informações não previstas a priori, sofisticação do vocabulário, maior cuidado na escolha das palavras para ser mais preciso, não utilização de redundâncias e repetições de informações já oferecidas, uso de uma maior quantidade e diversidade de recursos de coesão, utilização de frases mais longas e períodos compostos, etc.
O que, provavelmente, coincidiria com a expectativa do professor, visto que, teoricamente, a ausência do interlocutor pressupõe um cuidado maior de adequação do texto para garantir a compreensão do leitor. No entanto, a suposição de que os leitores de seu texto seriam crianças de primeira série poderia levar um aluno com excelente desempenho textual a realizar um enorme esforço de ajuste de sua produção ao destinatário e escrever um “texto” como os de cartilha por considerá-lo adequado a alunos dessa série. Nos dois casos teria havido excelente desempenho em relação ao critério de adequação do texto ao leitor a que se destina, embora, do ponto de vista da qualidade do texto resultante desse esforço, o desempenho fosse muito diferenciado (e, no caso do aluno com o texto de qualidade discursiva inferior, isso nem seria indicativo de sua competência). Tomando-se um outro critério, como, por exemplo, a autonomia progressiva na produção de textos escritos ao longo da escolaridade, um aparente indicador de progresso seria conseguir escrever sem ajuda de terceiros, de maneira independente. Assim, se se considerar um aluno que solicitava constantemente a ajuda do professor para escrever e que deixa de fazê-lo, se concluiria que ele tornou-se mais autônomo. Mas, nesse aspecto, recorrer ou não ao professor constantemente não é um indicador de autonomia, pois a independência para realizar uma tarefa não tem relação direta com a capacidade de realizá-la com autonomia: diferentes razões podem levar um aluno a perguntar ou não enquanto produz. É necessário considerar para que e em quais situações os alunos solicitam ajuda: um mesmo aluno, que anteriormente recorria ao professor ou aos colegas sempre que deparava com um problema de ortografia, pode passar a fazê-lo apenas quando se defrontar com problemas de pontuação, por exemplo. Nesse caso, pode ter ocorrido a aprendizagem de um procedimento autônomo de consulta a materiais escritos para a resolução das dificuldades ortográficas, mas o mesmo pode ainda não ter ocorrido com relação à pontuação. Embora o procedimento geral de solicitação de ajuda não tenha mudado, houve avanço com relação ao critério em um domínio específico.
É nesse contexto, portanto, que os critérios de avaliação devem ser compreendidos: por um lado, como aprendizagens indispensáveis ao final de um período; por outro, como referências que permitem — se comparados aos objetivos do ensino e ao conhecimento prévio com que o aluno iniciou a aprendizagem — a análise dos seus avanços ao longo do processo, considerando que as manifestações desses avanços não são lineares, nem idênticas.


PRIMEIRO CICLO
Ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa no primeiro ciclo
Os conhecimentos lingüísticos construídos por uma criança que inicia o primeiro ciclo serão tanto mais aprofundados e amplos quanto o permitirem as práticas sociais mediadas pela linguagem das quais tenha participado até então. É pela mediação da linguagem que a criança aprende os sentidos atribuídos pela cultura às coisas, ao mundo e às pessoas; é usando a linguagem que constrói sentidos sobre a vida, sobre si mesma, sobre a própria linguagem. Essas são as principais razões para, da perspectiva didática, tomar como ponto de partida os usos que o aluno já faz da língua ao chegar à escola, para ensinar-lhe aqueles que ainda não conhece.
É possível aprender, tanto sobre a linguagem verbal quanto sobre as práticas sociais nas quais ela se realiza, por meio da troca interpessoal. Por isso, as atividades de aprendizagem de Língua Portuguesa ganham muito quando se realizam num contexto de cooperação. No processo de aprendizagem, aquilo que num dado momento um aluno consegue realizar apenas com ajuda posteriormente poderá fazê-lo com autonomia. Daí a importância de uma prática educativa fundamentalmente apoiada na interação grupal, que, apesar de só se materializar no trabalho em grupo, não significa necessariamente a mesma coisa.
O trabalho em grupo possibilita ricos intercâmbios comunicativos que, embora tenham enorme valor social e pedagógico, nem sempre implicam interação produtiva do ponto de vista dos conteúdos escolares. Para que a interação grupal cumpra seu papel didático é preciso que os alunos realmente realizem juntos uma determinada atividade, que o resultado seja, de fato, produto da ação do grupo — não coincidente, portanto, com o que nenhum aluno poderia realizar individualmente.
Se, diante da proposta de recuperar de memória uma história conhecida, uma dupla de alunos tem como resultado basicamente o trabalho de um deles (ainda que com a concordância do outro), por mais interessantes que tenham sido os intercâmbios durante a atividade, não se pode afirmar que o produto final seja resultado da interação dos dois. Nesse sentido, o grande desafio é criar condições didáticas para que a interação verdadeiramente ocorra.
Desde o início do primeiro ciclo é imprescindível que se ofereça aos alunos a possibilidade de perguntar sobre a linguagem (e sobre todas as coisas) e de obter respostas. Respostas que precisam ser adequadas e suficientes para que possam aprender com elas. Da mesma forma, é preciso que o professor investigue quais são as idéias que seus alunos possuem sobre a língua para poder organizar o trabalho pedagógico levando-as em consideração.
Por outro lado, a observação criteriosa do comportamento dos alunos durante o desenvolvimento das atividades oferece informações valiosas para a organização dos agrupamentos na classe: quais alunos têm informações para trocar; quais constituem um grupo realmente produtivo ao trabalharem juntos; quem precisa trabalhar com quem para poder aprender algo. Mas, o critério de agrupamento não pode ter apenas como referência os aspectos cognitivos, pois há muitas outras variáveis importantes a serem consideradas. Assim, se ao propor uma tarefa o professor sabe que determinado aluno tem informações que poderia transmitir a outro, mas é alguém que não age cooperativamente no trabalho em parceria, terá então de decidir se vale a pena colocá-los juntos, se isso será realmente produtivo, ou se é o caso, por exemplo, de identificar um terceiro colega que poderia equilibrar o grupo.
Sem dúvida, durante toda a escolaridade, a aprendizagem dos alunos depende muito da intervenção pedagógica do professor. Entretanto, no primeiro ciclo ela assume uma característica específica, pois, além de todos os conteúdos escolares a serem aprendidos, há ainda um conjunto de aprendizados decorrentes de uma situação nova para a maioria dos alunos: a convivência no espaço público da escola. Ao professor do primeiro ciclo cabe contribuir para que o início desse processo seja a base de um convívio solidário e democrático. Se o trabalho em colaboração é condição para a interação grupal — e essa, por sua vez, é condição para uma prática educativa baseada nesses pressupostos —, é imprescindível que o professor tenha metas para a formação de relações produtivas entre os alunos, construa coletivamente as normas de convívio e funcione como modelo de parceiro experiente e solidário.
É também no primeiro ciclo que se deve iniciar a constituição de algo que se poderia chamar de “papel de estudante”: a disponibilidade para aprender, a responsabilidade com os estudos e com o material escolar, a capacidade de trabalhar em parceria, o respeito a diferentes pontos de vista, o respeito às normas de convivência e aos “combinados” do grupo, à preservação do espaço público, entre outras atitudes.

Objetivos de Língua Portuguesa para o primeiro ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de modo a garantir, progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
• compreender o sentido nas mensagens orais e escritas de que é destinatário direto ou indireto: saber atribuir significado, começando a identificar elementos possivelmente relevantes segundo os propósitos e intenções do autor;
• ler textos dos gêneros previstos para o ciclo, combinando estratégias de decifração com estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação;
• utilizar a linguagem oral com eficácia, sabendo adequá-la a intenções e situações comunicativas que requeiram conversar num grupo, expressar sentimentos e opiniões, defender pontos de vista, relatar acontecimentos, expor sobre temas estudados;
• participar de diferentes situações de comunicação oral, acolhendo e considerando as opiniões alheias e respeitando os diferentes modos de falar;
• produzir textos escritos coesos e coerentes, considerando o leitor e o objeto da mensagem, começando a identificar o gênero e o suporte que melhor atendem à intenção comunicativa;
• escrever textos dos gêneros previstos para o ciclo, utilizando a escrita alfabética e preocupando-se com a forma ortográfica;
• considerar a necessidade das várias versões que a produção do texto escrito requer, empenhando-se em produzi-las com ajuda do professor.

Conteúdos de Língua Portuguesa para o primeiro ciclo
TRATAMENTO DIDÁTICO
No início da escolaridade, é preciso dedicar especial atenção ao trabalho de produção de texto em função da crença, ainda muito comum, de que produzir textos é algo possível apenas após a alfabetização inicial. E, no entanto, é possível produzir linguagem escrita oralmente: por exemplo, ditando uma história tal como aparece por escrito — portanto, em linguagem que se usa para escrever — para que alguém grafe. É por meio de atividades desse tipo que o conhecimento sobre a linguagem escrita pode ir sendo construído antes mesmo que se saiba escrever autonomamente.
Dessa forma — porque é possível que se aprenda a produzir textos antes mesmo de saber escrevê-los —, os alunos do primeiro ciclo devem ser amplamente solicitados a participar de atividades de escuta da leitura de textos impressos (feita pelo professor ou por outros leitores) e de atividades nas quais se realizem tanto a leitura como a produção de textos, seja em colaboração com o professor, com pares mais avançados ou individualmente.
No primeiro ciclo deve-se propor aos alunos que leiam e escrevam, ainda que não o façam convencionalmente. Mas o fato de as escritas não-convencionais serem aceitas não significa ausência de intervenção pedagógica para a construção da escrita convencional, muito pelo contrário. Por ser condição para a constituição da autonomia leitora, escritora e também intelectual, o conhecimento sobre a natureza e o funcionamento do sistema de escrita precisa ser construído pelos alunos o quanto antes. Isto é, quanto mais rapidamente os alunos chegarem à escrita alfabética, mais e
melhor poderão avançar na aprendizagem dos conteúdos propostos nesse ciclo.
É necessário, portanto, organizar situações de aprendizagem que possibilitem a discussão e reflexão sobre a escrita alfabética. Essas situações de aprendizagem devem acontecer de modo a possibilitar que o professor conheça as concepções que os alunos possuem sobre como escrever e assim possa intervir para ajudá-los a pensar sobre elas, a avançar para além delas. Para tanto, a escola precisa oferecer variados materiais impressos de leitura, que sirvam como referência e fonte de informação ao processo de aprendizagem da linguagem escrita.
Se a produção de textos já merece bastante atenção no início da escolaridade, mais ainda a produção de textos por escrito. Isso porque, ao escrevê-los, os alunos se envolvem numa tarefa particularmente difícil para um aprendiz: a de coordenar decisões sobre o que dizer (organização das idéias ao longo do texto) com decisões sobre como dizer (léxico, recursos coesivos, etc.), com a tarefa, quase sempre mais lenta, de grafar. Ou seja, a produção de textos escritos envolve complexos procedimentos necessários tanto à produção de textos como à escrita. É uma tarefa que supõe que o escritor (ainda que iniciante) assuma diferentes papéis: o de quem planeja o texto, o de quem o lê para revisá-lo e o de quem o corrige propriamente.
É importante que as atividades de produção de textos escritos se organizem, portanto, de forma que seja possível para os alunos a apropriação progressiva dos diferentes procedimentos necessários ao ato de escrever e a experimentação dos diferentes papéis envolvidos. Coordenar esses papéis também é uma tarefa especialmente difícil, que supõe um exercício constante e contínuo, e não esporádico. No primeiro ciclo, é imprescindível que os alunos produzam diferentes textos por escrito, ainda que, para tanto, necessitem da ajuda do professor ou dos colegas.
Em se tratando da leitura, ainda que o primeiro ciclo seja o momento da aprendizagem do sistema de notação escrita, as atividades precisam realizar-se num contexto em que o objetivo seja a busca e a construção do significado, e não simplesmente a decodificação. O leitor iniciante tem também uma tarefa não muito simples nas mãos: precisa aprender a coordenar estratégias de decifração com estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação. Inicialmente, essa aprendizagem se dá pela participação do aluno em situações onde se leia para atingir alguma finalidade específica, em colaboração com os colegas, sob a orientação e com a ajuda do professor.
Desde o primeiro ciclo é preciso que os alunos leiam diferentes textos que circulam socialmente. A seleção do material de leitura deve ter como critérios: a variedade de gêneros, a possibilidade de o conteúdo interessar, o atendimento aos projetos de estudo e pesquisa das demais áreas, o subsídio aos projetos da própria área. Por exemplo, para o desenvolvimento de uma proposta de produção de um diário sobre uma viagem imaginária, é importante que se leiam diferentes materiais: textos informativos sobre como se pode chegar ao lugar escolhido, como é a fauna e a flora da região, qual a localização geográfica do continente, qual o clima, quais roupas são adequadas para o trajeto, qual o tempo de duração da viagem e o meio de transporte escolhido, etc. Também é importante que se leiam textos como os encontrados num diário, para aprender como são escritos, caso a classe tenha conhecimento insuficiente do gênero para produzi-lo.
Por outro lado, se ao produzirem textos escritos os alunos utilizarem recursos inadequados para indicar a fala dos diferentes personagens, é desejável que o professor selecione, para leitura, textos nos quais seja possível identificar como diferentes autores resolveram essa questão. Esse trabalho — de análise lingüística — amplia o repertório, permitindo escolhas mais adequadas.
No primeiro ciclo, é fundamental que os alunos comecem a aprender a utilizar a língua para aprender. Isso só será possível (sobretudo quando ainda não sabem escrever com autonomia) se receberem ajuda constante do professor para fazer anotações sobre os assuntos tratados na aula, organizando-as no caderno; utilizar as anotações posteriormente, quando necessário; consultar o dicionário ou outras fontes escritas para resolver problemas ortográficos; pesquisar em enciclopédias; preparar a fala para uma exposição oral; organizar argumentos para um debate; buscar, num texto, elementos que validem determinadas interpretações.
Além disso, precisam de ajuda para desenvolver procedimentos e atitudes que contribuam para o convívio no espaço público: saber escutar ativamente o que o outro diz, respeitando tanto a sua forma de falar quanto a sua opinião; utilizar uma forma de falar que lhe permita discordar do outro sem ofendê-lo; saber selecionar argumentos coerentes para poder discordar; saber compreender o que ouve, podendo perceber a intenção de quem fala; ter flexibilidade para mudar de opinião quando necessário; compartilhar conhecimentos adquiridos em diferentes situações.
O primeiro ciclo deve favorecer o aprofundamento e a ampliação dos conhecimentos que os alunos possuem sobre a linguagem e oferecer condições de desenvolverem cada vez mais sua autonomia. Isso não se consegue em todos os aspectos e ao mesmo tempo. Assim, se ao final desse ciclo é fundamental que o aluno seja autônomo no que se refere ao domínio da escrita alfabética, o mesmo não acontece com relação à ortografia: no primeiro ciclo, é necessário que tenha atenção à forma ortográfica, isto é, que a dúvida ortográfica e a preocupação com as regularidades da norma já estejam instaladas. Ao final desse ciclo espera-se que o aluno tenha introduzido a segmentação em frases nos seus textos, mas isso não significa que se espere que ele utilize com precisão os recursos do sistema de pontuação. No entanto, o fato de não se exigir um “conhecimento acabado” de determinado conteúdo ao final do primeiro ciclo não significa que não pode (ou não deve) ser ensinado. Da mesma forma, não significa que parte da classe não possa dominá-lo.

CONTEÚDOS
Os conteúdos relacionados neste item — tanto em relação ao primeiro quanto ao segundo ciclo — referem-se, por um lado, aos considerados gerais do ciclo, os quais precisarão ser tratados.
Estão relacionados em separado com a finalidade de se evitar repetições, dado que são recorrentes. Constituem-se em conteúdos de “Valores, normas e atitudes” e “Gêneros discursivos”, e sua aprendizagem não é possível a não ser em relação à aprendizagem dos demais. Por outro lado, serão relacionados os conteúdos específicos de cada um dos “Blocos de conteúdos” considerados imprescindíveis para a conquista dos objetivos propostos para o primeiro ciclo. Representam o que precisa ser ensinado e não o que deve ser exigido dos alunos ao término do ciclo.

Conteúdos gerais do ciclo
A seguir estão arrolados primeiramente valores, normas e atitudes que se espera que os alunos adquiram ou desenvolvam. Implicam aprendizagens que dificilmente ocorrerão por instrução direta, mas que, por sua importância, precisam estar claramente configurados como conteúdos de ensino.
Posteriormente, sob o título “Gêneros discursivos”, em coerência com o princípio didático que prevê a organização das situações de aprendizagem a partir da diversidade textual, estão especificados gêneros adequados para o trabalho com a linguagem oral e com a linguagem escrita.
Embora não se tenha, neste documento, estabelecido exatamente quais gêneros seriam adequados para o trabalho específico com a leitura e com a produção de textos, isso não significa que devam ser utilizados indiscriminadamente. Alguns textos — como os de enciclopédia, previstos para o primeiro ciclo, ou os normativos, previstos para o segundo — são mais adequados em situações de leitura feita pelo professor. Outros podem integrar atividades tanto de leitura como de escrita: é o caso de cartas, parlendas, anúncios, contos, fábulas, entre outros. No entanto, o critério de seleção de quais textos podem ser abordados em quais situações didáticas cabe, em última instância, ao professor.

VALORES, NORMAS E ATITUDES
• Interesse por ouvir e manifestar sentimentos, experiências, idéias e opiniões.
• Preocupação com a comunicação nos intercâmbios: fazer-se entender e procurar entender os outros.
• Respeito diante de colocações de outras pessoas, tanto no que se refere às idéias quanto ao modo de falar.
• Valorização da cooperação como forma de dar qualidade aos intercâmbios comunicativos.
• Reconhecimento da necessidade da língua escrita (a partir de organização coletiva e com ajuda) para planejar e realizar tarefas concretas.
Valorização da leitura como fonte de fruição estética e entretenimento.
• Interesse por ler ou ouvir a leitura especialmente de textos literários e informativos e por compartilhar opiniões, idéias e preferências (ainda que com ajuda).
• Interesse em tomar emprestado livros do acervo da classe e da biblioteca escolar.
• Cuidado com os livros e demais materiais escritos.
• Atitude crítica diante de textos persuasivos dos quais é destinatário direto ou indireto (ainda que em atividades coletivas ou com a ajuda do professor).
• Preocupação com a qualidade das produções escritas próprias, tanto no que se refere aos aspectos textuais como à apresentação gráfica.
• Respeito aos diferentes modos de falar.

GÊNEROS DISCURSIVOS
Gêneros adequados para o trabalho com a linguagem oral:
• contos (de fadas, de assombração, etc.), mitos e lendas populares;
• poemas, canções, quadrinhas, parlendas, adivinhas, trava-línguas, piadas;
• saudações, instruções, relatos;
• entrevistas, notícias, anúncios (via rádio e televisão);
• seminários, palestras.
Gêneros adequados para o trabalho com a linguagem escrita:
• receitas, instruções de uso, listas;
• textos impressos em embalagens, rótulos, calendários;
• cartas, bilhetes, postais, cartões (de aniversário, de Natal, etc.), convites, diários (pessoais, da classe, de viagem, etc.);
• quadrinhos, textos de jornais, revistas e suplementos infantis: títulos, slides, notícias, classificados, etc.;
• anúncios, slogans, cartazes, folhetos;
• parlendas, canções, poemas, quadrinhas, adivinhas, trava-línguas, piadas;
• contos (de fadas, de assombração, etc.), mitos e lendas populares, folhetos de cordel, fábulas;
• textos teatrais; relatos históricos, textos de enciclopédia, verbetes de dicionário, textos
expositivos de diferentes fontes (fascículos, revistas, livros de consulta, didáticos, etc.).

Blocos de conteúdos
Encontram-se relacionados neste item os conteúdos referentes a cada um dos blocos de conteúdos. São aqueles considerados imprescindíveis para que a conquista dos objetivos propostos seja possível ao aluno.


LÍNGUA ORAL: USOS E FORMAS
• Participação em situações de intercâmbio oral que requeiram: ouvir com atenção, intervir sem sair do assunto tratado, formular e responder perguntas, explicar e ouvir explicações, manifestar e acolher opiniões, adequar as colocações às intervenções precedentes, propor temas.
• Manifestação de experiências, sentimentos, idéias e opiniões de forma clara e ordenada.
• Narração de fatos considerando a temporalidade e a causalidade.
• Narração de histórias conhecidas, buscando aproximação às características discursivas do texto-fonte.
• Descrição (dentro de uma narração ou de uma exposição) de personagens, cenários e objetos.
• Exposição oral com ajuda do professor, usando suporte escrito, quando for o caso.
• Adequação do discurso ao nível de conhecimento prévio de quem ouve (com ajuda).
• Adequação da linguagem às situações comunicativas mais formais que acontecem na escola (com ajuda).

LÍNGUA ESCRITA: USOS E FORMAS
Prática de leitura
• Escuta de textos lidos pelo professor.
• Atribuição de sentido, coordenando texto e contexto (com ajuda).
Utilização de indicadores para fazer antecipações e inferências em relação ao conteúdo (sucessão de acontecimentos, paginação do texto, organização tipográfica, etc.).
• Emprego dos dados obtidos por meio da leitura para confirmação ou retificação das suposições de sentido feitas anteriormente.
• Utilização de recursos para resolver dúvidas na compreensão: consulta ao professor ou aos colegas, formulação de uma suposição a ser verificada adiante, etc.
• Uso de acervos e bibliotecas:
• busca de informações e consulta a fontes de diferentes tipos (jornais, revistas, enciclopédias, etc.), com ajuda;
• manuseio e leitura de livros na classe, na biblioteca e, quando possível, empréstimo de materiais para leitura em casa (com supervisão do professor);
• socialização das experiências de leitura.
Prática de produção de texto
• Produção de textos:
• considerando o destinatário, a finalidade do texto e as características do gênero;
• introduzindo progressivamente os seguintes aspectos notacionais:
* o conhecimento sobre o sistema de escrita em português (correspondência fonográfica);
* a separação entre palavras;
* a divisão do texto em frases, utilizando recursos do sistema de pontuação: maiúscula inicial, ponto final, exclamação, interrogação e reticências;
* a separação entre discurso direto e indireto e entre os turnos do diálogo, mediante a utilização de dois pontos e travessão ou aspas;
* a indicação, por meio de vírgulas, das listas e enumerações;
* o estabelecimento das regularidades ortográficas (inferência das regras) e a constatação de irregularidades (ausência de regras);
* a utilização, com ajuda, de dicionário e outras fontes escritas impressas para resolver dúvidas ortográficas;
• introduzindo progressivamente os seguintes aspectos discursivos:
* a organização das idéias de acordo com as características textuais de cada gênero;
* a substituição do uso excessivo de “e”, “aí”, “daí”, “então”, etc. pelos recursos coesivos oferecidos pelo sistema de pontuação e pela introdução de conectivos mais adequados à linguagem escrita e expressões que marcam temporalidade, causalidade, etc.;
• utilizando estratégias de escrita: planejar o texto, redigir rascunhos, revisar e cuidar da apresentação, com orientação.

ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA
• Análise da qualidade da produção oral, alheia e própria (com ajuda), considerando:
• presença/ausência de elementos necessários à compreensão de quem ouve;
• adequação da linguagem utilizada à situação comunicativa.
• Escuta ativa de diferentes textos produzidos na comunicação direta ou mediada por telefone, rádio ou televisão, atribuindo significado e identificando (com ajuda) a intencionalidade explícita do produtor.
• Identificação (com ajuda) de razões de mal-entendidos na comunicação oral e suas possíveis soluções.
• Comparação (com ajuda) entre diferentes registros utilizados em diferentes situações comunicativas.
• “Leitura” para os alunos que ainda não lêem de forma independente:
• relação oral/escrito: estabelecimento de correspondência entre partes do oral e partes do escrito em situação onde o texto escrito é conhecido de cor, considerando indicadores como segmentos do texto, índices gráficos, etc.;
• relação texto/contexto: interrogar o texto, buscando no contexto elementos para antecipar ou verificar o sentido atribuído.
• Análise dos sentidos atribuídos a um texto nas diferentes leituras individuais e identificação dos elementos do texto que validem ou não essas diferentes atribuições de sentido (com ajuda).
• Análise — quantitativa e qualitativa — da correspondência entre segmentos falados e escritos, por meio do uso do conhecimento disponível sobre o sistema de escrita.
• Revisão do próprio texto com ajuda:
• durante o processo de redação, relendo cada parte escrita, verificando a articulação com o já escrito e planejando o que falta escrever;
• depois de produzida uma primeira versão, trabalhando sobre o rascunho para aprimorá-lo, considerando as seguintes questões: adequação ao gênero, coerência e coesão textual, pontuação, paginação e ortografia.
• Explicitação de regularidades ortográficas.
• Exploração das possibilidades e recursos da linguagem que se usa para escrever a partir da observação e análise de textos impressos, utilizados como referência ou modelo.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA O PRIMEIRO CICLO
• Narrar histórias conhecidas e relatos de acontecimentos, mantendo o encadeamento dos fatos e sua seqüência cronológica, ainda que com ajuda
Espera-se que o aluno reconte oralmente histórias que já ouviu ou leu, e narre acontecimentos dos quais participou (ou cujo relato ouviu ou leu), procurando manter a ordem cronológica dos fatos e o tipo de relação existente entre eles. Ao recontar, deve tanto procurar manter as características lingüísticas do texto lido ou ouvido como esforçar-se para adequar a linguagem à situação de comunicação na qual está inserido o reconto ou a narração (é diferente recontar para os colegas de classe, numa situação de “Hora da História”, por exemplo, e recontar para gravar uma fita cassete que comporá o acervo da biblioteca, ou ainda numa reunião aberta a toda a comunidade escolar). Essas atividades poderão ser realizadas com ajuda e orientação do professor e de colegas.

• Demonstrar compreensão do sentido global de textos lidos em voz alta
Espera-se que o aluno, por meio de uma conversa, de um debate, de um reconto ou por escrito, demonstre ter compreendido o texto (lido por alguém ou por ele próprio) de maneira global e não fragmentada. Quer dizer: espera-se que ele saiba não apenas localizar informações específicas nos textos (por exemplo: para quem Chapeuzinho Vermelho foi levar os docinhos), como utilizá-las para construir a idéia geral do texto (por exemplo: é a história de uma menina que não obedeceu à mãe, seguiu pelo caminho que não devia e foi enganada pelo lobo. Mas foi salva pelo caçador, que salvou também a vovó e castigou o lobo).

• Ler de forma independente textos cujo conteúdo e forma são familiares
Espera-se que o aluno leia textos cujo conteúdo (assunto) e forma (gênero) já conheça, conseguindo resgatar o seu significado e compreender a idéia global.

• Escrever utilizando a escrita alfabética, demonstrando preocupação com a segmentação do texto em palavras e em frases e com a convenção ortográfica
Espera-se que o aluno escreva textos alfabeticamente, preocupando-se com a ortografia, ainda que não saiba fazer uso adequado das convenções. Espera-se, também, que faça uso de seu conhecimento sobre a segmentação do texto em palavras ainda que possam ocorrer, por exemplo, escritas tanto sem segmentação, como em “derepente”, quanto com segmentação indevida, como em “de pois”. Ao final desse ciclo espera-se que o aluno tenha introduzido a segmentação em frases nos seus textos, mas isso não significa que se espere que ele utilize com precisão os recursos do sistema de pontuação. Escrever textos considerando o leitor, ainda que com ajuda de terceiros (professores, colegas ou outros adultos).
Espera-se, também, que o aluno considere as restrições que se colocam para o escritor pelo fato de o leitor de seu texto não estar presente fisicamente no momento de sua produção, quer seja esse leitor determinado (uma pessoa em específico) ou genérico.

SEGUNDO CICLO
Ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa no segundo ciclo
No segundo ciclo, o trabalho com a linguagem oral e escrita precisa ser planejado de maneira a garantir a continuidade do que foi aprendido no ciclo anterior e a superação de dificuldades que eventualmente se tenham acumulado no período. Para tanto, é necessário que o professor investigue quais conhecimentos o aluno já construiu sobre a linguagem verbal para poder organizar a sua intervenção de maneira adequada. Esse procedimento precisa ser garantido não só no início dos ciclos, mas durante todo o processo de ensino e aprendizagem: não é, portanto, esporádico. Após a realização das atividades, é possível (e desejável) saber o que foi aprendido pelos alunos para poder identificar o que é necessário ser trabalhado a seguir, tendo em vista os objetivos propostos.
No entanto, a análise daquilo que foi ou não aprendido precisa ser realizada num contexto em que se considere também o que foi de fato ensinado e a maneira pela qual isso foi feito. É a partir da relação estabelecida entre ensino e aprendizagem que se torna possível ao professor compreender melhor por que alguns aspectos dos conteúdos abordados foram mais bem aprendidos que outros (ou não). Isso pode fornecer informações mais precisas para modificar a sua intervenção — caso seja necessário —, dotando sua prática de maior qualidade.
A interação grupal é, em toda a escolaridade, um importante recurso pedagógico: trabalhar verdadeiramente em colaboração possibilita maior produtividade na aprendizagem. A análise pelo professor de como os alunos procederam em relação à tarefa, de como se relacionaram durante sua realização, e dos resultados obtidos em relação aos objetivos propostos permite identificar melhores possibilidades de intercâmbio para atividades futuras.
A progressiva autonomia que se espera no desempenho dos alunos depende tanto de suas possibilidades cognitivas como da complexidade dos conteúdos ensinados. Considerando que esses fatores se constituem critérios de sequenciação que, por sua vez, definem o nível de aprofundamento dos conteúdos ensinados, a expectativa no segundo ciclo é de que os alunos tenham um desempenho mais autônomo em relação àqueles conteúdos que já vinham sendo trabalhados sistematicamente no ciclo anterior.

Objetivos de Língua Portuguesa para o segundo ciclo
As práticas educativas devem ser organizadas de maneira a garantir, progressivamente, que os alunos sejam capazes de:
• compreender o sentido nas mensagens orais e escritas de que é destinatário direto ou indireto, desenvolvendo sensibilidade para reconhecer a intencionalidade implícita e conteúdos discriminatórios ou persuasivos, especialmente nas mensagens veiculadas pelos meios de comunicação;
• ler autonomamente diferentes textos dos gêneros previstos para o ciclo, sabendo identificar aqueles que respondem às suas necessidades imediatas e selecionar estratégias adequadas para abordá-los;
• utilizar a linguagem para expressar sentimentos, experiências e idéias, acolhendo, interpretando e considerando os das outras pessoas e respeitando os diferentes modos de falar;
• utilizar a linguagem oral com eficácia, começando a adequá-la a intenções e situações comunicativas que requeiram o domínio de registros formais, o planejamento prévio do discurso, a coerência na defesa de pontos de vista e na apresentação de argumentos e o uso de procedimentos de negociação de acordos necessários ou possíveis;
• produzir textos escritos, coesos e coerentes, dentro dos gêneros previstos para o ciclo, ajustados a objetivos e leitores determinados;
• escrever textos com domínio da separação em palavras, estabilidade de palavras de ortografia regular e de irregulares mais freqüentes na escrita e utilização de recursos do sistema de pontuação para dividir o texto em frases;
• revisar seus próprios textos a partir de uma primeira versão e, com ajuda do professor, redigir as versões necessárias até considerá-lo suficientemente bem escrito para o momento.

Desdobramento dos conteúdos de Língua Portuguesa para o segundo ciclo
TRATAMENTO DIDÁTICO
Nesse ciclo, espera-se que o aluno já tenha aprendido a escrever alfabeticamente e já realize atividades de leitura e de escrita com maior independência. Ter esse conhecimento construído possibilita que sua atenção se concentre mais em outras questões, do ponto de vista tanto notacional como discursivo. Espera-se que os alunos consigam utilizar autonomamente estratégias de leitura — decifrar, antecipar, inferir e verificar — e coordenar, mesmo que com ajuda, os diferentes papéis que precisam assumir ao produzir um texto: planejar, redigir rascunhos, revisar e cuidar da apresentação.
No que se refere aos aspectos discursivos, amplia-se o trabalho realizado anteriormente e, pela inclusão de novos gêneros de textos, aprofunda-se o tratamento de conteúdos referentes à organização dos elementos específicos desses diferentes gêneros, do tipo de relação que se estabelece entre eles, dos recursos coesivos utilizados, léxico adequado, etc.
As propostas de análise e reflexão sobre a língua já podem buscar, a partir desse ciclo, uma maior explicitação de regras de ortografia e acentuação e sistematização de conteúdos de natureza gramatical. É preciso ressaltar, porém, que os conteúdos desse bloco devem continuar sendo selecionados em função das necessidades apresentadas pelos alunos no processo de produção e compreensão de textos.
De maneira geral, o segundo ciclo deve caracterizar-se por possibilitar ao aluno, de um lado, maior autonomia na realização de atividades que envolvam conteúdos desenvolvidos no ciclo anterior, e, de outro, por introduzir o trabalho com novos e diferentes aspectos relacionados aos usos e formas da língua. Nesse caso, o grau de autonomia na realização da atividade pode ainda ser pequeno, requerendo a colaboração de outros ou o monitoramento do professor.

CONTEÚDOS
Conteúdos gerais do ciclo
VALORES, NORMAS E ATITUDES
• Interesse por ouvir e manifestar sentimentos, experiências, idéias e opiniões.
• Preocupação com a comunicação nos intercâmbios: fazer-se entender e procurar entender os outros.
• Segurança na defesa de argumentos próprios e flexibilidade para modificá- los, quando for o caso.
• Respeito diante de colocações de outras pessoas, no que se refere tanto às idéias quanto ao modo de falar.
• Valorização da cooperação como forma de dar qualidade aos intercâmbios comunicativos.
• Reconhecimento do valor da língua escrita como meio de informação e transmissão da cultura.
• Valorização da leitura como fonte de fruição estética e entretenimento.
• Interesse, iniciativa e autonomia para ler, especialmente textos literários e informativos.
• Interesse por compartilhar opiniões, idéias e preferências sobre leituras realizadas.
• Interesse em tomar emprestado livros do acervo da classe e da biblioteca escolar.
• Manuseio cuidadoso de livros e demais materiais escritos.
• Interesse no uso e conhecimento das regras de utilização de bibliotecas, centros de documentação e redes de informação.
• Sensibilidade para reconhecer e capacidade de questionar, com ajuda do professor, conteúdos discriminatórios, veiculados por intermédio da linguagem.
• Atitude crítica diante de textos persuasivos dos quais é destinatário direto ou indireto.
• Exigência de qualidade com relação às produções escritas próprias, no que se refere tanto aos aspectos textuais como à apresentação gráfica.
• Interesse em explorar a dimensão estética da linguagem.
• Respeito aos diferentes modos de falar.



GÊNEROS DISCURSIVOS
Gêneros adequados para o trabalho com a linguagem oral:
• contos (de fadas, de assombração, etc.), mitos e lendas populares;
• poemas, canções, quadrinhas, parlendas, adivinhas, trava-línguas, piadas, provérbios; • saudações, instruções, relatos;
• entrevistas, debates, notícias, anúncios (via rádio e televisão);
• seminários, palestras.
Gêneros adequados para o trabalho com a linguagem escrita:
• cartas (formais e informais), bilhetes, postais, cartões (de aniversário, de Natal, etc.), convites, diários (pessoais, da classe, de viagem, etc.); quadrinhos, textos de jornais, revistas e suplementos infantis: títulos, lides, notícias, resenhas, classificados, etc.;
• anúncios, slogans, cartazes, folhetos;
• parlendas, canções, poemas, quadrinhas, adivinhas, trava-línguas, piadas;
• contos (de fadas, de assombração, etc.), mitos e lendas populares,folhetos de cordel, fábulas;
• textos teatrais;
• relatos históricos, textos de enciclopédia, verbetes de dicionário, textos expositivos de diferentes fontes (fascículos, revistas, livros de consulta, didáticos, etc.), textos expositivos de outras áreas e textos normativos, tais como estatutos, declarações de direitos, etc.

Blocos de conteúdos
Neste item encontram-se relacionados os conteúdos específicos de cada um dos blocos de conteúdos. São aqueles considerados fundamentais para que os alunos possam conquistar os objetivos propostos.

LÍNGUA ORAL: USOS E FORMAS
• Escuta ativa dos diferentes textos ouvidos em situações de comunicação direta ou mediada por telefone, rádio ou televisão: inferência sobre alguns elementos de intencionalidade implícita (sentido figurado, humor, etc.), reconhecimento do significado contextual e do papel complementar de alguns elementos não-lingüísticos para conferir significação aos textos (gesto, postura corporal, expressão facial, tom de voz, entonação).
• Utilização da linguagem oral em situações como as do primeiro ciclo, ampliando-as para outras que requeiram:
• maior nível de formalidade no uso da linguagem;
• preparação prévia;
• manutenção de um ponto de vista ao longo da fala;
• uso de procedimentos de negociação de acordos;
• réplicas e tréplicas.
• Utilização de recursos eletrônicos (gravador e vídeo) para registrar situações de comunicação oral tanto para documentação como para análise.



LÍNGUA ESCRITA: USOS E FORMAS
Prática de leitura
• Atribuição de sentido, coordenando texto e contexto.
• Utilização de indicadores para fazer antecipações e inferências em relação ao conteúdo (tipo de portador, características gráficas, conhecimento do gênero ou do estilo do autor, etc.) e à intencionalidade.
• Emprego dos dados obtidos por intermédio da leitura para confirmação ou retificação das suposições de sentido feitas anteriormente.
• Uso de recursos variados para resolver dúvidas na leitura: seguir lendo em busca de informação esclarecedora, deduzir do contexto, consultar dicionário, etc.
• Utilização de diferentes modalidades de leitura adequadas a diferentes objetivos: ler para revisar, para obter informação rápida, etc.
• Uso de acervos e bibliotecas:
• busca de informações e consulta a fontes de diferentes tipos (jornais, revistas, enciclopédias, etc.), com orientação do professor;
• leitura de livros na classe, na biblioteca e empréstimo de livros para leitura em casa;
• socialização das experiências de leitura;
• rastreamento da obra de escritores preferidos;
• formação de critérios para selecionar leituras e desenvolvimento de padrões de gosto pessoal.

Prática de produção de texto
• Produção de textos considerando o destinatário, a sua finalidade e as características do gênero.
• Aspectos notacionais:
• divisão do texto em frases por meio de recursos do sistema de pontuação: maiúscula inicial e ponto final (exclamação, interrogação e reticências); e reunião das frases em parágrafos;
• separação, no texto, entre discurso direto e indireto e entre os turnos do diálogo, utilizando travessão e dois pontos, ou aspas;
• indicação, por meio de vírgulas, das listas e enumerações no texto;
• estabelecimento das regularidades ortográficas (inferência das regras, inclusive as da acentuação) e constatação de irregularidades (ausência de regras);
• acentuação das palavras: regras gerais relacionadas à tonicidade.
• Utilização de dicionário e outras fontes escritas para resolver dúvidas ortográficas.
• Produção de textos utilizando estratégias de escrita: planejar o texto, redigir rascunhos, revisar e cuidar da apresentação.
• Controle da legibilidade do escrito.
• Aspectos discursivos:
• organização das idéias de acordo com as características textuais de cada gênero;
• utilização de recursos coesivos oferecidos pelo sistema de pontuação e pela introdução de conectivos mais adequados à linguagem escrita, expressões que marcam temporalidade e causalidade, substituições lexicais, manutenção do tempo verbal, etc.;
• emprego de regência verbal e concordância verbal e nominal.
• Utilização da escrita como recurso de estudo:
• tomar notas a partir de exposição oral;
• compor textos coerentes a partir de trechos oriundos de diferentes fontes;
• fazer resumos.

ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA
• Análise da qualidade da produção oral alheia e própria, reconhecendo progressivamente a relação entre as condições de produção e o texto decorrente (no que diz respeito tanto à linguagem como à organização do conteúdo).
• Comparação entre diferentes registros utilizados em diferentes situações comunicativas.
• Análise dos sentidos atribuídos a um texto nas diferentes leituras individuais e discussão dos elementos do texto que validem ou não essas diferentes atribuições de sentido.
• Revisão do próprio texto:
• durante o processo de redação, relendo cada parte escrita, verificando a articulação com o já escrito e planejando o que falta escrever;
• depois de produzida uma primeira versão, trabalhando sobre o rascunho para aprimorá-lo, considerando as seguintes questões: adequação ao gênero, coerência e coesão textual, pontuação, paginação e ortografia.
• Exploração das possibilidades e recursos da linguagem que
se usa para escrever, a partir da observação e análise de textos especialmente bem escritos.
• Análise de regularidades da escrita:
• derivação de regras ortográficas;
• concordância verbal e nominal (e outros aspectos que se mostrem necessários a partir das dificuldades de redação);
• relações entre acentuação e tonicidade: regras de acentuação.


CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA O SEGUNDO CICLO
• Narrar histórias conhecidas e relatos de acontecimentos, mantendo o encadeamento dos fatos e sua seqüência cronológica, de maneira autônoma
Espera-se que o aluno reconte oralmente histórias que já ouviu ou leu, bem como acontecimentos dos quais participou, ou cujo relato ouviu ou leu, procurando manter a ordem temporal dos fatos e o tipo de relação existente entre eles. Ao recontar, deve demonstrar esforços de adequação do registro utilizado à situação de comunicação na qual está inserido o reconto, bem como realizar essa atividade de maneira autônoma.

• Demonstrar compreensão de textos ouvidos por meio de resumo das idéias
Espera-se que o aluno realize, oralmente ou por escrito, resumos de textos ouvidos, de forma que sejam preservadas as idéias principais.

• Coordenar estratégias de decodificação com as de antecipação, inferência e verificação, utilizando procedimentos simples para resolver dúvidas na compreensão
Espera-se que o aluno, ao realizar uma leitura, não se limite à decodificação: que utilize coordenadamente procedimentos necessários para a compreensão do texto. Assim, se ele antecipou ou inferiu uma informação, é necessário que busque no texto, pela decodificação, por exemplo, pistas que confirmem ou não a antecipação ou a inferência realizada.

• Utilizar a leitura para alcançar diferentes objetivos: ler para estudar, ler para revisar, ler para escrever
Espera-se que o aluno seja capaz de ajustar sua leitura a diferentes objetivos utilizando os procedimentos adequados a cada situação.

• Escrever textos com pontuação e ortografia convencional, ainda que com falhas, utilizando alguns recursos do sistema de pontuação
Espera-se que o aluno já demonstre conhecimento de regularidades ortográficas e saiba utilizar o dicionário e outras fontes impressas para resolver as dúvidas relacionadas às irregularidades. Espera-se também que demonstre conhecimento sobre o sistema de pontuação, segmentando o texto em frases, pontuando diálogos, etc.

• Produzir textos escritos, considerando características do gênero, utilizando recursos coesivos básicos
Espera-se que o aluno produza textos respeitando as características próprias de cada gênero, no que se refere tanto aos aspectos discursivos quanto às características gráfico-espaciais (paginação), utilizando os recursos coesivos básicos (nexos e pontuação) e apropriados.

• Revisar os próprios textos com o objetivo de aprimorá-los
Espera-se que o aluno, tanto enquanto produz textos quanto após terminar a sua escrita, volte a eles, procurando aprimorá-los e dar-lhes uma melhor qualidade.

• Escrever textos considerando o leitor
Espera-se que o aluno desenvolva procedimentos que levem em conta as restrições que se colocam para o escritor pelo fato de o leitor de seu texto não estar presente fisicamente no momento de sua produção, quer seja esse leitor determinado (uma pessoa em específico) ou não.

Disponível: http: www2.redepitagoras.com.br/main.asp?TeamID={26FB5E44-C3D8-41BD-A4A6-9C38ED1977FC}